Na ponte são visíveis várias fissuras. Há um buraco entre os tabuleiros e uma grande fissura com largos centímetros que atravessa horizontalmente a ponte e preocupa os homens do volante. Porque além do perigo que representa, tem gerado constantes prejuízos aos veículos que ali passam, sobretudo os motoristas que estão pouco familiarizados com o trajecto.

No momento em que a equipa do NJ esteve no local, duas viaturas refrearam a marcha para percorrer a ponte. Lino António Mascarenhas, motorista de um autocarro interprovincial da Ango Real, usou a expressão lamentável para descrever o estado da ponte que, segundo Mascarenhas, é um perigo, sobretudo à noite, quando a visibilidade é reduzida. Você vem à noite com uma certa velocidade, chega aqui e encontra esse buraco.

Não dá para te esquivares e bates directamente. Há consequências nas viaturas. Temos constatado isso quando aqui passamos. Mesmo de dia, quem não conhece os solavancos, quando chega à ponte, está sujeito a desviar-se e ir rio abaixo, lamentou. Domingos Lunganjo, camionista há mais de 27 anos, vive no município de Quilengue, na província da Huíla e classifica como péssimo o estado que apresenta a ponte e solicitou às autoridades de direito - o Ministério das Obras Públicas e o Instituto Nacional de Estradas de Angola - uma intervenção urgente de reabilitação.

O motorista vai mais longe e defende a construção de uma nova ponte, sendo que se trata de uma estrutura situada numa estrada nacional, com um elevado tráfego rodoviário. Esse é um trabalho que deve ser feito de forma sincronizada entre as Obras Públicas e o INEA, já que é de âmbito central, ou então que disponibilizem verba ao governo do Kwanza-Sul para se encontrarem meios que visem a reabilitação da ponte.

Por mim, seria melhor até a construção de uma nova ponte, porque os governantes também passam por aqui e sabem o estado em que esta se encontra. Temos tido problemas nas viaturas e nós pagamos taxa de circulação, queixou-se.

ANGOLA NÃO É SÓ LUANDA

A 600 metros da ponte, Mouzinho João Gomes, taxista, no troço Gabela-Porto-Amboim, mostrou-se visivelmente agastado. Parou o táxi e rapidamente se dirigiu à equipa de reportagem para dizer: Kota, não liga esse mambo dos buracos na ponte, está bom. Digo isso, porque é com esses buracos que nós cobramos ao cliente um pouco mais.

Mouzinho, que falava com ironia, aferiu que não se deve, pura e simplesmente, olhar para as grandes realizações, como inaugurações de infraestruturas de vulto e para Luanda, como de Angola inteira se tratasse. É preciso que os governantes saibam que o desenvolvimento do país depende de todos e as províncias jogam um papel muito importante, considerou, salientando que os estragos que se verificam na ponte datam de há muitos anos. O INEA local tinha feito um trabalho, mas paliativo apenas. É necessário que se olhe bem para essa ponte, porque nós estamos a gastar muito dinheiro na compra de pneus e molas, reclamou.

Mais adiante, depois de atingir a cratera no sentido do Sumbe, duas viaturas estavam estacionadas. Curiosos, abeirámo-nos e deparámo-nos com chaves e equipamento para mudar pneus junto a uma das viaturas. Os seus proprietários trocavam dois pneus que furaram, depois de passar pelos ferros pontiagudos que saem da fissura.

Seguiam no veículo dois jovens - Tony da Estrada e Mauro Fontes - vindos de Luanda, onde comercializaram os seus produtos, encontrando- se de regresso à Ombadja, na província do Cunene, onde residem.

Para Tony, a situação da ponte é constrangedora. O jovem considera que o governo central se deve preocupar com a situação porque, segundo ele, passam por aquela via estrangeiros e turistas e, a continuar como está, o país está a transmitir uma má imagem para o exterior. É uma estrada construída às pressas porque a situação assim o exigia, mas há quanto tempo ela foi feita?, questionou o jovem Fontes, considerando logo a seguir que já houve tempo suficiente para a melhorar. Já lá vão quase dez anos e ninguém diz se haverá outra estrada ou não. Só falam de acidentes, mas se esquecem que, muitas vezes, os acidentes são originados pelos buracos que se encontram na estrada, advertiu. O acto de lançamento da reconstrução da EN100, que abrange o corredor Luanda/Sumbe/Lobito, foi efectuado em Janeiro de 2006.

Dados oficiais, já tornados públicos, dão conta que a obra durou 12 meses e abrangeu uma extensão de 497,5 quilómetros de comprimento e sete de largura. De acordo com os mesmos dados, a reconstrução da EN100 ficou orçada em cerca de 20 milhões de dólares e decorreu no âmbito do programa de linha de crédito chinês.

NINGUÉM LIGA

A ponte da Gonga foi construída entre os anos de 1976 e 1977 e veio substituir uma anterior que foi destruída em 1975, na sequência do conflito armado. De lá para cá, a circulação automóvel no troço é cada vez mais intensa, mas apesar deste quadro o que tem sido feito no local, são apenas obras de restauro.

A construção de uma nova ponte foi equacionada há muito, mas sem qualquer sinal de que o projecto vai avançar. Para as populações, trata-se de uma ponte muito importante, dado o seu carácter socioeconómico, tendo em atenção que é uma via de dimensão internacional, por onde passa grande parte dos produtos de e para Luanda. Velhinho Bernardo, de 77 anos, residente em Porto-Amboim, já perdeu a conta ao número de vezes que passou pela ponte.

Tio Velhinho, como carinhosamente o chamam, lembrou com nostalgia os anos 50, quando existia a Junta Autónoma de Estradas de Angola que tinha ao longo da via asfáltica cantoneiras, onde os guardas identificavam zonas críticas nas estradas e comunicavam esse facto para que se procedesse à reparação. Esse serviço já não existe e o resultado está à vista. No entanto, o ancião apelou ao Governo para não deixar que as vias de comunicação se deteriorem, como é o caso da ponte, lembrando que participou na sua construção.

Sinto muito pelo que está a acontecer. No meu tempo, havia cantoneiras junto às estradas e essas cantoneiras serviam para identificar os buracos nas estradas e depois de identificados, partíamos com os engenheiros para os reparar. Mas agora, mesmo com buracos visíveis, ninguém liga e o mais grave ainda é a ponte da Gonga. Esta ponte está cada vez pior e acho que o Governo só vai despertar quando morrer muita gente, que vai cair no rio. Peço ao Governo que sinta o perigo que pode advir do mau estado da ponte, apelou.

Os receios agora aumentam numa altura em que as chuvas se aproximam, o que provoca a subida do caudal do rio. Junto à ponte, existem populares que praticam a agricultura de subsistência. Dedicam-se ao cultivo de rama de batata, os seus derivados e do milho. Dão, igualmente, particular importância à pesca pluvial, onde o mussolo, o cacusso e o bagre figuram entre as espécies mais apanhadas.

Conceição António cultiva uma parcela junto à ponte da Gonga e diz que tem assistido a cenas de arrepiar, sendo que, segundo conta, há automobilistas que se fazem à estrada pela primeira vez e a velocidade que trazem, por vezes, não permite travar atempadamente. Às vezes, vou a correr em direcção ao rio com medo que algo vá explodir, mas é o barulho que alguns carros fazem ao pisar os buracos, porque muitos não conhecem a ponte, elucidou Conceição, que, segundo nos contou, traz o coração nas mãos sempre que passa por ali.