Depois de vários analistas terem afirmado que Israel e o Irão, países que ostentam um ódio mútuo de morte há décadas, só pararam as hostilidades porque precisavam de tempo para repor perdas e reorganizar as forças, até voltarem a apertar o gatilho, a CNN International e The New York Times avançam que o ataque "fabuloso e maravilhoso" dos EUA ao programa nuclear iraniano só obteve, afinal, danos ligeiros e facilmente ultrapassáveis.
Um dos especialistas que defende essa tese é o major-general Agostinho Costa, que, na RTP3 e na CNN Portugal lembrou que nem Teerão nem Telavive baixaram as armas porque querem a paz, fizeram-no temporariamente porque o Irão estava com dificuldades em lançar os seus misseis e Israel estava com as suas defesas anti-aéreas exauridas.
Se esta versão tem fundamento ou não, só o tempo o dirá, e será demonstrada quando Teerão e Telavive voltarem as juras de morte reciprocas, numa ladainha a que o mundo se habituou nas últimas quase cinco décadas.
Já o sucesso do ataque dos EUA ao programa nuclear iraniano, com o emprego da mais vasta frota aérea e naval em muitos anos no Médio Oriente, especialmente os bombardeiros estratégicos B-2 e as bombas de 14 mil kgs destruidoras de búnqueres, as GBU-57, já se sabe que foi um "flop" milionário.
A denúncia do falhanço, apesar de Donald Trump se ter referido a essa "Operação Martelo da Meia-noite" como um "extraordinário sucesso", surgiu nas últimas horas nos ecrãs da CNN International, que teve acesso a um documento secreto do Pentagono, onde fica claro que, de acordo com a avaliação técnica feita ao resultado dos ataques, estes foram "apenas ligeiros".
Em total contraste com as palavras de Trump, que se referiu aos resultados como "fabulosos" porque "obliteraram o programa nuclear iraniano", o relatório da Defesa norte-americana, pelo contrário, avança que as infra-estruturas nucleares de Fordow, a principal, de Natanz e de Isfahan apenas sofreram "danos menores".
Na melhor das hipóteses, como, de resto, já tinha sido avançado em alguns canais das redes sociais, por analistas como Jacques Baud, antigo coronel da intelligentsia suíça com ligações à NATO, ou o professor da Universidade de Chicago e um dos mais respeitados analistas de geoestratégia, John Mearsheimer, o "Martelo da Meia-noite" apenas atrasou o programa nuclear do Irão em alguns meses.
Neste documento "sacado" pela CNN International, e elaborado pela secreta militar do Pentagono, a Defense Intelligence Agency, é dito preto no branco que o "Martelo" pouco fez para atrasar o programa nuclear de Teerão e que se for esse o desígnio, tudo pode voltar ao normal em escassos meses.
Como já tinha avançado igualmente Scot Ritter, um antigo comandante "marine" dos EUA e ex-inspector da ONU para os programas de armas de destruição maciça iraquiano e afegão, as instalações iranianas atacadas apenas sofreram danos nas imediações e nas áreas de entrada e saída para os túneis que conduzem ao seu "coração" que se encontra a dezenas de metros de profundidade em Fordow, o principal, a mais de 90 metros, só o primeiro piso.
Além disso, como se falou sobejamente, mesmo antes do ataque de 21 de Junho, ordenado por Donald Trump, os iranianos tiveram todo o tempo necessário para transferir os equipamentos para locais seguros e, como a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) admite, "mais de 400 quilos de urânio enriquecido estão em parte incerta e impossíveis de localizar".
Furioso, foi como Trump e a sua equipa mais próxima, incluindo o secretário de Estado, Marco Rubio, o seu chefe da diplomacia, e Pete Hegseth, secretário da Defesa, se mostraram ao mundo esta manhã de quarta-feira, 25, em Haia, Países Baixos, onde decorre a Cimeira da NATO, com a notícia da CNN International e também The New York Times.
Não só insistiu em que a notícia é falsa, fazendo críticas severas aos dois media norte-americanos que ousaram revelar este segredo", usando termos irreproduzíveis, como garantiu que o programa nuclear iraniano "foi, efectivamente, destruído" e levará "anos a voltar aos eixos", frisando que se isso acontecer, "os EUA não o vão permitir e novos ataques se seguirão".
Mas nem tudo está a correr mal para o Presidente norte-americano, que está na Europa para a 39ª Cimeira da NATO, na cidade holandesa de Haia, onde o esperava um submisso Marc Rutte, secretário-geral da organização, que foi literalmente exposto por Trump que divulgou uma mensagem privada sua, onde este lhe faz elogios rasgados pela forma como conseguiu vergar os europeus a subir os gastos na Defesa para 5% dos seus Produtos Internos Brutos (PIB's).
"Os europeus vão pagar em grande como devem e isso será a tua grande vitória", escreveu Rutte a Trump, depois de lhe ter dito ainda, na mesma mensagem, que estava a "voar de encontro a um enorme triunfo" porque "nenhum Presidente (dos EUA) tinha conseguido um sucesso desta envergadura antes".
Com esta perspectiva em pano de fundo, Donald Trump sentiu-se mesmo à-vontade para, já a bordo do Air Force 1, dizer aos jornalistas que os aliados europeus "vão pagar o que já deviam estar a pagar há muito tempo" e que os EUA não pagam tanto da percentagem do seu PIB porque "é tempo de equilibrar contas".
O que Trump quer dizer com colocar as contas em dia é que os gastos europeus em Defesa devem ser direccionados para a comprar de armamento Made in USA, que é o que o próprio já deixou como ideia em suspenso, ainda no seu primeiro mandato, de 2017 a 2021, ser a única razão pela qual os EUA ainda estão na NATO.
E é igualmente visível que os Estados-membros europeus da NATO estão conscientes de que sem os EUA a organização tem os dias, poucos, contados, o que os conduz a aceitar todas as imposições e exigências dos norte-americanos.
Alias, Donald Trump poderá mesmo, como notam alguns analistas, ficar para a história não apenas pela forma como, segundo Mark Rutte, vergou os aliados europeus da NATO.
Ficará igualmente nos compêndios da diplomacia global por ter conseguido estar em guerra com dois países, Irão e Rússia, ao mesmo tempo que vestia a pele de mediador, conseguindo assinar acordos de cessar-fogo e, provavelmente, de paz, usando terceiros para assinar os documentos que elaborou, para já com sucesso no caso do Irão, onde os EUA usaram Israel para fazer a sua guerra, e em andamento, com a Rússia, onde o "proxy" foi a Ucrânia.
No caso da guerra no leste europeu, para onde os EUA enviam cada vez menos armas e dinheiro, passando essa responsabilidade para os europeus, Trump, que tem ainda hoje um tête-à-tête com o Presidente Volodymyr Zelensky, está a usar como estratégia visível uma reaproximação dos Estados Unidos à Rússia, secando os apoio a Kiev, o que obrigará os europeus a forçar a paz porque não têm nem armas nem verbas disponíveis para a Ucrânia suficientes para substituir Washington.
O encontro com Zelensky desta quarta-feira, 25, poderá igualmente ser um momento histórico, até porque também a Europa está lentamente a "abandonar" Zelensky, como se viu nesta Cimeira de Haia, onde, ao contrário das últimas, foi elemento central e desta feita apenas lhe foi cedido um lugar no jantar de terça-feira, ficando de fora da restante agenda.