E o Presidente dos Estados Unidos resolveu chamar "louco" a Vladimir Putin depois de a Rússia, com vagas de misseis e drones por três noites consecutivas sobre toda a Ucrânia, ter ripostado aos mais de 1200, cálculos do Kremlin, drones disparados pelos ucranianos contra Moscovo.
O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, apressou-se a avisar que os ataques russos, os mais robustos desde o início da invasão russa, serviram como resposta aos ataques de Kiev, com destaque para o que ocorreu contra o helicóptero de Vladimir Putin - que se mantém em silêncio sobre estes últimos desenvolvimentos - na quarta-feira, 20.
Todavia, como se depreende das declarações de Donald Trump, quando este diz que "Putin está completamente louco", referindo-se aos ataques "sem justificação" da Rússia sobre a Ucrânia, ou não foi informado pelos seus assessores das explicações do Kremlin ou a ocasião foi aproveitada para fazer estalar de vez o processo de reaproximação entre Moscovo e Washington que desagrada tanto aos europeus como aos sectores mais radicais (neocons) da Administração e do Congresso norte-americano.
Logo depois de Trump ter dito que Putin está "completamente louco", essa afirmação foi aproveitada pelos media ocidentais aliados de Kiev como um maná para a nova estratégia comunicacional neste conflito, destacando, quase em uníssono, que o Presidente norte-americano, finalmente, percebeu que o Kremlin não está a sério no processo de negociações com Kiev.
E para incendiar ainda mais o momento, que é de clara escalada entre o ocidente e os russos, o Presidente norte-americano avisou Putin que este "está a brincar com o fogo", ameaçou Moscovo com novos pacotes de sanções e disse ao seu homólogo que "muitas coisas más, mesmo muito más" já teriam acontecido à Rússia se não fosse a sua intervenção.
Isto tudo emerge de um caldo em que o novo chanceler alemão, Friedrich Merz, veio anunciar publicamente que foram entregues mais de uma centena de misseis de cruzeiro Taurus, de longo alcance, a Kiev e que podem ser usados pelos ucranianos sem limitações sobre alvos na profundidade to território da Federação Russa.
A Merz respondeu Dmitri Peskov, o porta-voz do Kremlin, avisando que se trata de uma "decisão arriscada" que pode fazer desmoronar todos os esforços para negociar o fim do conflito com Kiev.
E a Donald Trump, depois de acusar Putin de estar "LOUCO", usando maiúsculas na sua comunicação da rede social de que é proprietário, Truth Social, foi o ex-Presidente russo, Dmitri Medvedev, que respondeu, avisando que há um limite que quando for ultrapassado se estará já "na III Guerra Mundial".
Como sublinha The Guardian, o jornal britânico que é um dos mais alinhados com Kiev no ocidente, Trump não especificou que "coisas muito más" já teriam acontecido aos russos se não fosse a sua protecção, mas recorda que os norte-americanos CNN e The Wall Street Journal divulgaram que a Casa Branca está a considerar novas sanções contra a Rússia.
Todavia, em Moscovo parece que já se sabe exactamente o que é que "as coisas más" significam, como explicou Dmitri Medvedev, quando disse, ainda na resposta a Trump, que "a coisa pior que pode acontecer é a III Guerra Mundial".
Medvedev foi à rede social X escrever que "ao ler o que Trump disse sobre Putin estar a brincar com o fogo, e que coisas más podem acontecer à Rússia, lembro-lhe que a única coisa má com que ele tem de se preocupar é com a III Guerra Mundial".
Com o processo de reaproximação entre russos e americanos iniciado após o regresso de Trump ao poder claramente a estalar, no âmbito de uma pressão sem precedentes dos europeus para afastar o Presidente norte-americano de Putin, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, disse à France Presse que todos as opções voltam a estar sobre a mesa.
A fazer lembrar os primeiros dois anos de guerra, quando os media ocidentais tinham apenas notícias sobre a perspectiva ucraniana, jornais como The Guardian retomam agora essa postura noticiando que os ataques russos continuaram mesmo depois da conversa telefónica entre Trump e Putin.
Quando, como se pode ler nos media menos alinhados com Kiev, que o Kremlin tem feito diariamente declarações sobre o contexto dos ataques russos, como resposta às vagas de drones ucranianos, com acusações ao Presidente Volodymyr Zelensky de que este está "apostado em fazer descarrilar as negociações" porque sabe que assim que o conflito terminar, a sua vida politica acabará igualmente.
Isto, porque, segundo várias sondagens feitas por institutos e organizações ocidentais, nomeadamente a mundialmente famosa norte-americana Gallup, Zelensky sofrerá uma pesada derrota quando tiverem lugar as eleições que estão a ser proteladas desde Maio de 2024 devido à Lei Marcial em vigor na Ucrânia desde 2022.
Para já, o aviso feito por Medvedev sobre o risco de uma III Guerra Mundial, ao contrário do que aconteceu no passado perante situações semelhantes, obteve uma reacção de Washington, com Keith Kelogg, o enviado especial de Trump para a Ucrânia, a dizer que se trata de "declarações irresponsáveis".
"Acrescentar medos sobre uma III Guerra Mundial é uma opção infeliz, um comentário irresponsável e não condiz com a condição de potência mundial da Rússia", disse Kelogg, lembrando que "o Presidente Trump está a tentar parar esta guerra e a mortandade" que dela resulta.
Neste especialmente perigoso momento do conflito, em que a Rússia está claramente a levar a melhor na frente de batalha e os ucranianos pedem insistentemente mais armas aos aliados ocidentais e novas sanções a Moscovo para travar a sua imparável força militar, a questão que alguns analistas colocam é o que seria se o ataque ao helicóptero de Putin tivesse tido sucesso?
Até ao momento ainda não se sabe se o helicóptero em que o Presidente russo se deslocou a Kursk, a região que esteve parcialmente ocupada pelos ucranianos até há cerca de um mês, foi apanhado acidentalmente pela vaga de drones ucranianos e os seus operadores procuraram aproveitar a oportunidade, ou se Kiev foi informado pelos aliados ocidentais da viagem do chefe do Kremlin.
Mas, como é evidente, a resposta a esta dúvida pode ser de grande relevo para o que vai ser o futuro das relações entre Moscovo e as capitais ocidentais que apoiam Kiev na linha da frente, até porque por menos o Kremlin avisou a Alemanha para o perigo da autorização dada aos ucranianos para o uso sem limitações dos seus misseis Taurus (ver links em baixo).