O recado não é novo mas a insistência de Marco Rubio, o secretário de Estado norte-americano, que é quem comanda a diplomacia em Washington, na ideia de que os EUA não vão tolerar longas conversas sem resultados concretos, é um indicador claro de que Donald Trump mantém em cima da mesa a ameaça de abandonar a mediação entre Kiev e Moscovo.
Para o Presidente russo, Vladimir Putin, uma saída de cena de Trump como mediador só é um problema se os EUA voltarem à condição de principais financiadores e fornecedores de armas a Kiev como o foram durante a anterior Administração democrata de Joe Biden.
E essa possibilidade parece ser efectivamente a que melhor encaixa na forma como Washington está lentamente a enviar ma mensagem ao Kremlin ao fazer fluir armamento para Kiev, mesmo que na forma de venda e não de oferta, o que para Moscovo representa, como Putin já advertiu, "apenas uma maneira de prolongar o conflito".
Mas não parece que isso esteja a exercer a influência pretendida pelos norte-americanos sobre Putin, porque este aproveitou este período onde ainda se ouve o eco da retoma das negociações em Istambul, Turquia, para sublinhar que o conflito termina quando a Federação Russa tiver garantida a sua segurança e as condições claras para uma paz duradoura e sustentável.
E essas são sobejamente conhecidas: a neutralidade da Ucrânia fora da NATO, a sua desmilitarização e o reconhecimento da soberania russa sobre as cinco regiões anexadas em 2014 (Crimeia) e em 2022 (Kherson, Zaporizhia, Donetsk e Lugansk), além das questões da cultura, língua e religião russas na Ucrânia que restar após a guerra.
Embora o Presidente Volodymyr Zelensky tenha respondido positivamente, às exigências de resultados dos EUA com o mesmo receio de Vladimir Putin, que é a saída de cena dos norte-americanos e que isso se traduza na travagem total da ajuda militar a Kiev, mostrando-se "disponível para chegar a resultados concretos", as suas posições de princípio pouco ou nada mudaram.
Mantém a exigência de reaver os territórios ocupados pelos russos, quer uma presença militar ocidental na Ucrânia como parte das garantias de segurança e acordos claros de protecção pelos EUA e os seus aliados europeus contra novas agressões russas, que diz serem uma questão de quando e não se...
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Face a esta rigidez de posições, as conversas reiniciadas em Istambul, depois de estas terem sido interrompidas em 2022 pela pressão do então primeiro-ministro Boros Johnson (ver links em baixo), apenas deram como resultado uma troca alargada de prisioneiros, cerca de mil para cada lado, mas nada de concreto como é exigido pelo Presidente Donald Trump.
Estas posições de um e do outro lado são as traves-mestras das propostas de russos e ucranianos para desenhar um mapa que permita seguir por caminhos seguros até a um cessar-fogo e à paz, o que, para já, de pouco ou nada servem, porque são inflexíveis e garantia de que os combates continuam a ponto de, se nada acontecer, um desfecho só ser possível pela voz das armas.
E aí, claramente, é a Rússia que leva vantagem, não apenas pelos avanços, que, sendo curtos, têm sido persistentes sobre as posições ucranianas, além de que na sua versão de guerra de atrito, Moscovo procura fragilizar a capacidade de combate ucraniana destruindo equipamento e a sua força humana.
Uma questão de peso é até que ponto Moscovo e Kiev aguentam as perdas humanas, que são, sem dúvida, mesmo que sem certezas quanto aos números, elevadas de um e do outro lado, e também nesta capítulo a Rússia tem vantagem no seu mais vasto universo de recrutamento.
É neste contexto que o secretário de Estado norte-americano Marco Rubio veio relembrar que Donald Trump quer ver resultados concretos para não tomar uma decisão radical, que seria sair de cena e deixar a responsabilidade aos europeus para financiar e apoiar em armas o esforço de guerra ucraniano.
Isto, quando Trump voltou a dizer publicamente que tem aprazada uma nova conversa com Putin para breve - ao que tudo indica já nesta segunda-feira, 19, ao final da tarde - e que esta pode mesmo ser presencial, notando que é seu entendimento que essa é a única forma de "acabar com a mortandade" em curso no leste europeu.
Rubio avisou ainda que, apesar de os EUA estarem cientes de que se trata de um tema complexo e, por isso, exigente, o que aconselha a que se tenha a "paciência como ferramenta essencial" mas também apontou para a falta de espaço para encaixar "perdas de tempo inúteis" porque a Casa Branca "tem muitas outras prioridades para lidar no resto do mundo".
E avisou que vão analisar as propostas eitas por ambos os lados nas conversas de Istambul e trabalhar em função da sua exequibilidade de forma "realista e racional", mas caso tal não suceda, uma das possibilidades é os EUA se juntarem aos seus aliados europeus na aplicação de novas sanções a Moscovo.
Segundo a russa RT, isso mesmo foi dito por Rubio ao seu homologo russo Sergei Lavrov, no Sábado, 17, onde apelou a que Moscovo seja "racional" nas suas posições de forma a facilitar avanços no processo de construção da paz, embora o chefe da diplomacia russa tenha, segundo a mesma fonte, apontado ao norte-americano como fundamental para qualquer processo de paz "que as conversas abordem as raízes deste conflito", que tem na intenção de integrar a Ucrânia na NATO a sua mais profunda dessas mesmas raízes.
Putin e Zelensky querem paz mas não a qualquer preço...
Isso mesmo parece ser a plataforma inamovível criada pelo Kremlin para assentar as negociações com os ucranianos, tendo Vladimir Putin voltado a referir, num vídeo divulgado na rede social Telegram, que a Rússia quer uma "paz sustentável e duradoura" e que sem essas condições preenchidas, "tem os meios militares e recursos" para concluir a tarefa iniciada em 2022, quando começou a invasão da Ucrânia.
Ou seja, "eliminar as causas da crise, criar condições de longo termo para uma paz sustentável e garantir a segurança da Federação Russa e os interesses do seu povo nos territórios de que sempre falamos, que são os anexados desde 2014.
E sobre a posição norte-americana, Putin sublinhou que "a Rússia respeita os interesses do povo americano e do seu Presidente", acrescentando que espera que "também os interesses russos sejam respeitados" por Washington "da mesma maneira".
Entretanto, o Presidente ucraniano esteve reunido no Sábado com o vice-Presidente dos EUA, JD Vance, e com Marco Rubio, como, segundo The Guardian, parte da preparação da iminente conversa entre Putin e Trump.
E foi depois dessa conversa, em Roma, Itália, que Zelensky disse que falou com Vance e Rubio sobre as conversas de Istambul, acusando Moscovo de ter enviado uma delegação de segunda linha, o que "mostra a pouca vontade dos russos para negociar a paz", o que levou o Presidente ucraniano a defender que "é urgente avançar com novas sanções à Rússia e mais apoio militar a Kiev".
Uma das apostas de Zelensky é que os seus aliados ocidentais, incluindo os EUA, avancem determinados para sanções contra os países e empresas que continuam a fazer negócios com os russos, nomeadamente comprando a sua energia através da denominada "frota fantasma" de petroleiros, que permite a Moscovo continuar a receber milhões de dólares todos os dias, contornando as actuais sanções em vigor.