Na Rússia começam as eleições Presidenciais (terminam no Domingo) que Vladimir Putin queria vencer com tranquilidade mas os ucranianos resolveram desestabilizar com a invasão de territórios no oeste por batalhões alegadamente de voluntários russos dissidentes.

E em Berlim, depois das declarações perigosas, incluindo ameaças de envio de militares para a Ucrânia, o Presidente francês tem à sua espera em Berlin o chanceler alemão e o primeiro-ministro polaco para afinarem a bussola europeia que vai encontrar o "Norte" na questão da guerra no leste europeu.

Olaf Scholz convocou Emmanuel Macron e Donald Tusk por uma razão simples... são os três países mais empenhados nesta guerra, não pela impetuosidade, que nisso os "tigres" bálticos impõem-se ao resto, mas pela responsabilidade política e militar e financeira.

Como tal, com a saída cada vez mais evidente dos Estados Unidos do ponto de vista material desta guerra, por razões de política interna onde o Presidente Joe Biden enfrenta o desafio da sua vida, que são as eleições de Novembro contra o arqui-rival Donald Trump, caberá a estes três gigantes europeus decidir o que vai a Europa fazer com Kiev.

Uma das três posições para este encontro já é conhecida, a de Emmanuel Macron, que desafiou os seus pares europeus a "não serem cobardes" no que toca à discussão do envio de forças militares ocidentais para o campo de batalha, mesmo que para missões de retaguarda.

Com efeito, Macron é, de há algumas semanas a esta parte, o mais férreo falcão de guerra europeu e anti-russo, embora as razões possam não estar todas na urgência do apoio a Kiev, sendo, por isso, de prever que procure convencer os seus contrapartes neste encontro de Berlin a assumirem igualmente mais risco no confronto com Moscovo.

Tendo como quadro de fundo a possibilidade de uma guerra nuclear, como é sublinhado por muitos analistas e foi avisado pelos Presidente Putin e Biden há largos meses, ninguém parece perceber muito bem esta posição insensata de Macron... É isso que vai ouvir de Scholz e Tusk.

Ate porque também já se sabe que o chanceler alemão tem como um dos objectivos maiores garantir que, ao mesmo tempo que mantém o mais volumoso apoio militar e financeiro a Kiev, não emerge na Ucrânia o palco de uma III Guerra Mundial.

Coisa que ficou claro quando afirmou a sua total indisponibilidade para enviar os já famosos misseis de longo alcance Tauros para os ucranianos, alegando que isso permitiria ataques em profundidade em território russo com armas alemãs, um acto de guerra como considera Moscovo.

E o polaco Donald Tusk foi dos primeiros a vir a público travar a impetuosidade do Presidente francês ao negar qualquer disponibilidade do seu país para enviar forças militares para a Ucrânia.

Mas é um facto que a Ucrânia está a perder a guerra, apesar de ter conseguido irritar Putin com a recente entrada de alguns batalhões de voluntários russo anti-Putin nas fronteiras de Kursk e Belgorod, e isso é resultado directo de falhas clamorosas no fluxo de armas e munições ocidentais.

A par da falta de armas e munições, os ucranianos começam a ser sangrados também no universo de recrutamento porque são cada vez mais aqueles que procuram sair do país para evitar ir parar à frente de guerra.

Isso mesmo é demonstrado nos, cada vez mais, vídeos a circular nas redes sociais, incluindo brigadas locais para impedir o acesso das unidades de recrutamento do Exército às aldeias e vilas do país onde tentam levar à força os homens para combater.

Os três líderes europeus que estarão juntos em Berlim nesta sexta-feira, 15, poderão até desenhar um novo plano para sair airosamente do lamaçal sangrento do leste ucraniano, mas não vão poder escapar ao esforço para fazer chegar armas e munições às forças ucranianas.

Tudo, porque estas estão a ser, como já se admite em Kiev, massacradas pelas unidades de combate russas, que contam com uma forte superioridade aérea, artilharia ilimitada, além dos aparentemente ilimitados stocks de misseis e drones e voluntários para combater que excedem as necessidades.

A responsabilidade a três

Há, contudo, uma responsabilidade à qual estes três líderes da linha da frente no apoio a Kiev, que é lidar com o buraco que os EUA estão a abrir na muralha pró-ucraniana com a dramática redução do apoio militar a Kiev e a preparação do terreno para uma saída alargada.

E se, como as sondagens indicam, o antigo Presidente Donald Trump vencer as eleições de 05 de Novembro próximo, o risco de a Europa ficar totalmente sozinha no financiamento da dispendiosa guerra com a Rússia passa a uma certeza.

E, nesse caso, a única forma de evitar o colapso total do Estado ucraniano nas trincheiras do leste do país seria enviar tropas ocidentais para o campo de batalha... o que poderia ser o início de uma catástrofe nuclear sem paralelo.

Mesmo que seja um papel insubstituível aquele que Washington tem no fluxo de armas e dinheiro para os ucranianos manterem a resistência à Rússia, os europeus estão obrigados a redobrar os esforços, porque a isso os obrigou as posições assumidas no início do conflito além da proximidade geográfica.

Foi a presidente da Comissão Europeia, Ursula Leyen, que, em nome da União Europeia, de que Alemanha, França e Polónia são os maiores países e as maiores potências militares, apoiou ruidosamente o papel do então primeiro-ministro britânico Boris Johnson na destruição do acordo de paz que estava a ser elaborado por Moscovo e Kiev logo nos primeiros dias de guerra.

Nessa tempestuosa ida a Kiev, Boris Johnson, em nome dos europeus e dos norte-americanos, obrigou o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, a rasgar o documento que estava a ser trabalhado em Istambul, na Turquia, garantindo em troca o apoio ilimitado em armas e dinheiro a Kiev.

E foi assim durante o primeiro ano e meio do conflito, que ganhou dimensão internacional a 24 de Fevereiro de 2022, porque, na realidade vem de longe, pelo menos desde 2014, com o golpe de Estado em Kiev, onde foi afastado do poder o Presidente Viktor Yanukovich.

Só que, após a famosa contra-ofensiva ucraniana do Verão de 2023, os EUA começaram a recuar no apoio, tendo para isso sido relevante a perda da maioria democrata na Câmara dos Representantes, no Congresso e na Europa Ocidental foi crescendo um cansaço popular com a guerra e com as devastadoras consequências nas economias ocidentais.

E agora, é a vez de o Presidente Zelensky exigir que os seus aliados cumpram com as promessas que lhe foram feitas pelo antigo primeiro-ministro britânico, embora o Reino Unido seja um dos países que estão a tirar o pé do acelerador no apoio à Ucrânia, seguindo, como sempre sucede, as decisões de Washington.

Este é o quadro lato que levou a que seja agora a União Europeia, especialmente França, Alemanha e Polónia, a ficar com o "bebé" nas mãos, sem saberem muito bem o que fazer com ele.

Porque, se por um lado, não podem baixar o nível do ruído retórico pró-Kiev, por outro lado, as consequências nefastas do conflito nas suas economias reduzem a área de manobra dos mais afoitos, como o novo falcão de guerra europeu que é o Presidente francês.

E não é por acaso que o chanceler alemão, que tem entre mãos uma crise económica séria, com a recessão a aprofundar-se, recebe primeiro a sós Emmanuel Macron, com a obrigatoriedade de diluir a tensão evidente entre ambos.

Tensão que cresceu agora com os respectivos posicionamentos sobre o conflito, além da natural e histórica disputa pela liderança da frente europeia entre Paris e Berlim que se tem traduzido por crises quando este eixo se desentende e soluções quando afina agulhas.

Não menos importante são as eleições de três dias na Rússia que começam esta sexta-feira, 15, e terminam no Domingo, 17, nas quais Putin vai conseguir facilmente mais um mandato de seis anos, até 2030, o que fará dele o líder russo mais tempo em funções de sempre, ultrapassando mesmo Joseph Estaline.

E não vão ser Nikolai Karitonov, do Partido Comunista, Leonid Slutsky, do Partido Liberal Democrata, e Vladislav Davankov, do Partido Popular, que vão constituir quaisquer dificuldades à eleição folgada de Putin, que concorre como independente mas tem por detrás o seu Rússia Unida.

São pouco mais de 122 milhões de eleitores que vão às urnas escolher entre quatro candidatos, depois da Justiça russa ter obliterado do boletim de voto dois importantes candidatos por razões legais e burocráticas, facilitando a vida ao actual chefe do Kremlin, que não teria a vitória em causa, mas apenas algumas suculentas, para os media ocidentais, adstringências suplementares.

Estes eleitores certificados para votar abrangem já os residentes nas cinco regiões anexadas na Ucrânia, desde logo a Crimeia, em 2014, e as restantes quatro, Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhia, em 2022, após referendos muito participados mas não reconhecidos internacionalmente.

A inclusão destes territórios no mapa eleitoral russo está a ser fortemente criticada pelos Governos e organizações ocidentais, como a União Europeia, que consideram ilegal a votação que ali vai decorrer, embora, do ponto de vista de Moscovo, se tratem de regiões como quaisquer outras da Federação Russa.