A história começou em 1925 com a criação da primeira organização nacional dedicada à cooperação humanitária e internacional, a VOKS (Sociedade de Relações Culturais com o Estrangeiro) e converteu-se numa ponte entre a então URSS e o mundo. O que significa hoje a diplomacia pública? Continua a ter forças para unir os povos para além da política? Foi esta diplomacia pública que aproximou a Rússia dos povos africanos por via do diálogo, da cooperação e do apoio às lutas pela autodeterminação e pela independência. Educação, cultura, formação e cooperação militar foram fundamentais para que a Rússia conseguisse solidificar laços com os seus parceiros tradicionais.
A base da diplomacia pública está na aproximação que se faz entre as pessoas, no diálogo aberto entre os países e na construção de relações entre os povos. Nisso, os russos souberam fazer leituras dos tempos e dos cenários, perceberam a reflexão da necessidade de diálogo cultural e educacional. Apoiaram muitos dos países africanos na luta pela conquista das suas independências e na formação dos seus quadros. Isto faz com que tenham activos e aliados muito importantes em África e cria-lhes vantagens no presente e no futuro. Angola é um exemplo claro, onde grande parte da estrutura castrense tem formação na antiga URSS, o actual Presidente, João Lourenço fez formação militar lá, o antigo Presidente José Eduardo dos Santos fez engenharia em Baku (Azerbaijão) e o primeiro PR, Agostinho Neto morreu lá.
Quando aqui cheguei, um elemento do nosso grupo era proveniente da Etiópia e tinha estudado em Moscovo no início da década de 2000, falava fluentemente russo e foi uma grande ajuda, mas houve outros casos provenientes da Venezuela, Cuba, Vietname e de outros países. É claro que na altura em que se vivia num mundo bipolar, EUA e, então, URSS disputavam zonas de influência e África sempre foi uma das mais disputadas. Hoje, a União Europeia e a China já marcam uma importante posição na cooperação com os povos africanos. A China tem feito grandes investimentos ao nível da economia, da educação, da ciência, da cultura e da formação jornalística em Angola, a União Europeia não se deixa ficar atrás e a cimeira da União Europeia - África em Novembro aqui em Luanda, será para se perceber o que estratégia tem a Europa para uma África com mais de 50 países, com várias divisões internas, com as suas zonas de influência, estratégias e expectativas. Obviamente que a Rússia estará atenta.
 Viajar para a Rússia naquele tempo era estar perto do centro de referência e das ideologias daquele tempo. Moscovo era a capital cujas histórias ouvíamos dos nossos kotas, da mãe que passeava com o filho fardado e formado numa academia militar soviética. Ir a Moscovo naquele tempo era um dever patriótico, era cumprir uma missão da Pátria que aos seus filhos não implora e simplesmente ordena. Diferente de José Eduardo dos Santos, que era mais conservador e avesso à mudança dos seus parceiros tradicionais, João Lourenço tem outra visão, outra estratégia. O actual PR entende que, hoje, Angola tem de ter uma estratégia mais abrangente e lidar com os diferentes actores e decisores internacionais. Certamente, também deve ser por isso que o centenário da Diplomacia Pública da Rússia não tenha "forçado" a ida de delegação de Luanda como nos outros tempos. Actualmente, ir a Moscovo já não faz parte da agenda central de Luanda. Os tempos mudaram e surgiram novos interesses e novas prioridades.
 Foi bom aceitar o convite pessoal feito há uns meses pelo então embaixador da Rússia em Angola, Vladimir Tararov, para ver de perto esta cidade que consegue ser suave e frenética ao mesmo tempo. Um povo marcado pelas actuais dinâmicas de sobrevivência, uma cidade limpa e de gente acolhedora. Ir a Moscovo está na pessoa do jovem de 26 anos de seu nome Sebastião Mateus, que com 20 anos deixou o Bairro Rocha Pinto e foi para Moscovo. É, actualmente, o presidente da associação dos estudantes angolanos em Moscovo. Foi a sua história, contada em entrevista, que me levou a dar este título ao editorial desta semana. Está a fazer o doutoramento na Universidade Patrice Lumumba e quer fazer diplomacia. Com ele e com alguns estudantes angolanos aqui percebi uma coisa: ir a Moscovo nem sempre significa voltar à Luanda.

