A vida é uma sucessão de instantes desiguais. Uns longos. Longuíssimos até. Que podem ser de desespero ou exaltação. De tristeza ou felicidade. Por isso, nem todas as vidas são feitas do mesmo tempo, ainda que ocupem igual espaço no calendário de papel. Há vidas, e vidas. As que escorrem por entre os dedos de quem não as vive, muito mais rápido do que a areia seca do deserto. E as que que se prolongam em cada acto cheio de significado. Em cada observação profunda. Em cada ideia transformadora. A vida é tão mais longa quanto maior for o preenchimento de cada instante por parte de quem o vive. Com a rebeldia dos inconformados. Com o génio dos iluminados. Com a humildade dos observadores. Com a transcendência dos apaixonados. Com a devoção dos trabalhadores. A vida é uma sucessão de instantes desiguais.
A história é um exercício de memória sobre o tempo que passou. As vidas que o marcaram. O diferencial de mudança que daí resultou. Olhando com muita atenção, às vezes, é possível descortinar um caminho coerente. Outras vezes, não. Abrimos a sua porta, e surge um amontoado de quadros, um conjunto de destroços espalhados, qual galeria desarrumada. Os tamanhos diferentes podem ser explicados pela proeminência dos acontecimentos. Mas quase nunca explicam a razão de o ter sido. O quanto se deveu à vontade dos participantes. O quanto se deveu ao acaso. O quanto se deveu aos líderes afamados. O quanto foi determinado pelos liderados. Os buracos no tecto deixam entrar raios de luz, à vez, que iluminam este ou aquele elemento. A esmo. Ou então, alguém pega na candeia e realça o que lhe interessa. Deixando o resto na sombra. Esquecido. Isso quando não propositadamente obliterado. Cada elemento tem uma dimensão diferente para quem o observa. A história é um exercício de memória sobre o tempo que passou. Nem sempre honesto.
O tempo faz sentido para quem constrói com a sua vida um pedaço de história. Todos podemos fazê-lo. Escolhendo o nosso público. Determinando as nossas causas. Correndo os nossos riscos. Transformando a vida à nossa volta, de acordo com as nossas forças. Chorando as nossas lágrimas. Dançando os carnavais das nossas alegrias. E desilusões. Deixando, depois de nós, os escombros da casa que procuramos construir. Com maior ou menor sucesso. Os resquícios de uns riscos na memória de quem, à volta de nós, vogou. O tempo faz sentido para quem constrói com a sua vida um pedaço de história.
O homem mais triste é o que não sabe o que fazer com o tempo. E desperdiça a vida.