Com a erradicação do vírus selvagem da poliomielite, uma das doenças mais graves na infância, que, para além da morte de milhares de crianças, causou, nas últimas centenas de anos, sérios problemas físicos, e, por isso é igualmente conhecida como "paralisia infantil", a ciência dá um passo de gigante no combate a esta infecção que, todavia, ainda permanece como ameaça na forma de pólio vacinal, porque a vacina recorre a vírus fragilizados artificialmente e estes podem, embora seja muito raro, sofrer alterações que os tornam mais agressivos.

Actualmente, se se confirmar que o vírus selvagem está, efectivamente, erradicado na Nigéria, o Paquistão e o Afeganistão serão os últimos redutos desta doença infecciosa no mundo.

A notícia da expectativa de que o agente causador da doença na forma selvagem está em vias de ser considerado erradicado no continente africano está a ser avançada hoje pelo The Guardian, e resulta do facto de as autoridades de saúde nigerianas, em colaboração com uma alargada coligação de entidades internacionais, estarem a analisar a possibilidade de, por fim, declarar África "livre" do vírus da pólio selvagem.

Na sua forma selvagem, o vírus que provoca a poliomielite em humanos mantém-se tendo como portadores alguns primatas, incluindo macacos das espécies mais comuns no continente, mas também outros animais.

Após quatro anos sem registo de quaisquer casos no Norte da Nigéria, onde, até então, estavam localizados os derradeiros casos no país e no continente, a Comissão Regional Africana de Certificação (ARCC, na sigla em inglês), pela Organização Mundial da Saúde (OMS), prepara-se para declarar formalmente o continente como geografia livre do vírus selvagem da poliomielite.

Este resultado histórico foi conseguido ao fim décadas de persistente esforço de vacinação generalizada de crianças com menos de cinco anos, o que levou a que este vírus fosse vendo a sua área de sobrevivência cada vez mais estreita a ponto de se ter confinado a uma pequena região do Norte da Nigéria, estado de Borno, e, agora, quase oficialmente extinto no continente.

Porém, a forma vacinal da pólio, menos maligna, resultante das campanhas de vacinação, e que surge da evolução do vírus desactivado utilizado para a produção das vacinas, ainda é relativamente comum em algumas regiões de África, sendo Angola, como o Novo Jornal noticiou, um dos países onde periodicamente surgem surtos desta doença infecciosa.

Apesar disso, as autoridades de saúde, tanto nacionais como a OMS, aconselham a colaboração das comunidades para vacinarem as suas crianças porque é isso que protege tanto as crianças imunizadas como aquelas que o não são, bem como a restante comunidade.

Matshidiso Moeti, directora-regional da OMS-África, perante o aproximar deste momento histórico, disse que tamanho resultado é fruto de "uma tremenda persistências e perseverança" face a alguns momentos menos bons nesta caminhada, quando, no passado recente, "se pensava estar mesmo quase e depois surgia um qualquer revés".

Este resultado é ainda, como afirmou a directora da OMS-África, uma consequência da colaboração eficaz entre a OMS e a Iniciativa Global para a Erradicação da Pólio, criada pela ONU em 1988 e que agrega países, organizações locais, o UNICEF e a Fundação Bill e Melinda Gates, que tem tido um papel decisivo ao manter viva esta chama erradicadora da doença ao financiar de forma substancial os programas globais de vacinação, e ainda o norte-americano CDC, bem como milhões de voluntários.

Recorde-se que ainda em 1996, há pouco mais de 24 anos, cerca de 75 mil crianças viram as suas vidas destroçadas pelo vírus da pólio, ficando paralisadas para o resto das suas vidas, sendo que esta doença atinge com maior intensidade os membros inferiores.

A certeza de que o continente está livre da forma selvagem do vírus é, todavia, conseguida através de um sistema apertado de vigilância em 44 países africanos, o que impõe, mesmo que a declaração da erradicação esteja para breve, a continuação da atenção para debelar qualquer eventual surto, sendo de sublinhar que desde 1988, quando a Iniciativa Global foi criada, e 2018, o número de casos em todo o mundo passou de 350 mil para apenas 33.

Esta conquesita da humanidade esteve, no entanto, em risco depois de as campanhas de vacinação em vários países africanos terem sido suspensas por causa da pandemia da Covid-19, como o Novo Jornal noticiou.

Este vírus transmite-se essencialmente através do contacto com fezes infectadas mas ocorrem igualmente infecções de pessoa a pessoa por via oral.