Há mais de uma década que as vagas de migrantes ilegais atravessam o Mar Mediterrâneo a partir das costas da Líbia ou de Marrocos, principalmente, mas também da Mauritânia ou da Tunísia, em pirogas de grandes dimensões com motor fora de bordo ou em velhos pesqueiros que fazem as suas últimas viagens, acabando muitos por naufragar expondo milhares de pessoas à morte por afogamento.

Tendo em conta este cenário, todos os anos milhares de pessoas têm sido salvas - apesar de morrerem centenas todos os anos - por embarcações de Organizações Não-Governamentais (ONG) que patrulham o Mediterrâneo em busca de barcos em risco ou já naufragados, como é ainda o caso de navios das guardas-costeiras de Itália. Grécia ou Espanha, ou ainda de países como Portugal envolvidos na operação da União Europeia Frontex, criada na década passada para lidar com o fluxo crescente de ilegais entre África e a Europa.

Recorde-se que a crise dos migrantes africanos, na sua larga maioria, oriundos de países como o Mali, o Senegal, Níger ou as Guinés, mas também do Paquistão ou Afeganistão, que fazem o circuito do norte de África para entrar no "el dorado" europeu, foi o motivo da primeira deslocação do novo Papa, Francisco, para fora do Vaticano após a sua nomeação, a Lampedusa, em 2013, que disse na ocasião ser este um dos episódios da história mais humilhantes e apelou a uma forte reacção do mundo contra esta violência.

Isto, porque os milhares de pessoas que todos os anos procuram deixar o continente africano, ofuscados pelo mito de que a Europa é um "el dorado, fogem de conflitos armados, de regimes ditatoriais, de crises resultantes das alterações climáticas, sejam prolongadas secas ou cheias torrenciais, da fome e das doenças, e da pobreza gerada pela corrupção e nepotismo em dezenas de países africanos, como a própria União Africana reconhece e tem programas criados para combater estes problemas.

Este ano, o risco é maior para todos aqueles que se vão fazer ao mar porque a Líbia, país que vive num caos governativo desde que os Estados Unidos e alguns países europeus resolverem destronar Muammar Kadaffi, fazendo de um dos países com melhor nível de vida em África para aquilo que hoje parece ser uma tragédia sem fim à vista, voltou a ser palco de uma forte ofensiva militar contra o regime de Tripoli reconhecido pela ONU.

A acrescentar a esta nova instabilidade militar na Líbia, que dificulta as operações de salvamento pelos poucos meios disponíveis ainda, as ONG viram países como a Itália e Malta, com governos de direita extremista anti-migrantes, perseguiram legalmente as organizações que se dedicavam a salvar pessoas das águas do Mediterrâneo, impedindo-as de er embarcações nas suas águas territoriais.

Face a este cenário, o Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) lançou um veemente apelo a uma intervenção rápida dos países europeus de forma garantir que é prestado auxílio aos milhares de pessoas que se preparam para a travessia nas próximas semanas.

Carlotta Sami, a porta do ACNUR em Itália, citada pelas agências, disse mesmo que milhares de africanos podem perecer se nada for feito, recorrendo a uma imagem dramática do que pode ser o quadro em perspectiva: "O Mediterrâneo pode ser um mar vermelho de sangue se não houver uma intervenção rápida.

Para já, sabe-se que cerca de 700 pessoas deixaram nas últimas horas a costa da Líbia em frágeis embarcações mas só apenas metade chegou a Itália ou a Malta, não havendo informações sobre o que aconteceu aos restantes, avançaram organizações humanitárias em Itália.

Segundo os dados existentes, até este momento cerca de 15% das pessoas que se fazem ao mar acabam por morrer, incluindo milhares de crianças.

Um largo número, porém, nunca chega a ser contabilizado porque o seu rasto deixa de existir nas longas e trágicas travessias do deserto a partir de países como o Níger, o Mali ou a Argélia, morrendo de sede e fome ou vítimas da luta entre os grupos criminosos que ganham dinheiro com o tráfico de seres humanos.