"Essa carta é duvidosa, não devia ser acolhida pelo tribunal por não constituir uma prova válida para este tribunal. Uma carta redigida propositadamente por um declarante ou testemunha, para ser lida em audiência de julgamento, não é e não pode servir como meio de prova, porque o ordenamento jurídico angolano diz que os depoimentos, sejam eles testemunhos ou de declarantes, são pessoais e presencias", refere Pascoal Joaquim, que também é procurador-geral adjunto da República.

As declarações de testemunhas e declarantes, prossegue o procurador, "podem ser prestadas fora do tribunal, sempre que for conveniente para a descoberta da verdade material, mas devem ser sempre obtidas pelo juiz, por via de carta rogatória, o que não foi o caso".

Segundo o representante do Ministério Público, o facto de José Eduardo dos Santos ser ex-Presidente da República "não lhe dá o privilégio de prestar declarações, na eventual carta, fora do circuito que a lei estabelece, mas sim por via de instituições judicial ou judiciária, para além de não haver obediência notarial na carta".

"O valor da carta escrita pelo ex-Presidente da República não é original, é uma cópia recebida, eventualmente, por email para uma instituição do seu Pelouro, que a fez chegar a este tribunal. Por isso suscita dúvidas", disse o procurador, afirmando que não deveria ser acolhida pelo TS.

Em reação, o advogado Sérgio Raimundo, que defende o ex-governador do Banco Nacional de Angola, Valter Filipe, disse, durante as alegações finais, não serem verdadeiros os fundamentos do MP.

Sérgio Raimundo questionou, nas suas alegações, a resistência do MP em ouvir o ex-Presidente José Eduardo dos Santos quer na fase de instrução quer em julgamento, pedindo agora para não valorar a sua resposta.

"Isso é assustador", afirmou.

Para Sérgio Raimundo, ficou provado durante as sessões de discussão e julgamento que os 500 milhões de dólares não saíram da esfera do Estado, uma vez que o contrato assinado para a estruturação do fundo estratégico previa o retorno dos valores.

"Se a nossa intenção aqui é realmente fazer justiça e descobrir a verdade material, é assustador ouvir do Ministério Público, na qualidade de fiscalizador da legalidade, a intenção de não quer aceitar as declarações do então Presidente da República. Quem neste País podia ou dizia sem uma orientação dada pelo Presidente", questionou o advogado.

Segundo Sérgio Raimundo, a intenção do MP em não aceitar as declarações do então Presidente da República "mostra claramente que há um propósito bem delineado" de obrigar o tribunal a condenar os réus, Valter Filipe, António Bule, Jorge Gaudens e José Filomeno dos Santos, antigo presidente do Fundo Soberano de Angola.

Os réus são acusados e pronunciados pelo MP pelos crimes de tráfico de influência, branqueamento de capitais e burla por defraudação.

A próxima sessão está marcada para o dia 09 de Julho, altura em que será anunciada a data da sentença, mas antes o tribunal fará a leitura dos quesitos.