O número de mortos devido a mais esta epidemia na RDC, a 9ª desde que o vírus surgiu entre humanos em 1976, ronda já as duas dezenas, com o epicentro na localidade de Bikoro, província do Equador, no noroeste do país, junto à fronteira com o Congo-Brazzaville.

Devido às ineptas instalações sanitárias em Bikoro, a OMS reuniu um milhão de dólares para apoiar as equipas no local a delimitar o avanço da epidemia e criar condições técnicas para tratar os doentes, ao mesmo tempo que o seu director-geral deste organismo das Nações Unidas, Tedros Adhanom Ghebreyesus, e o responsável pelo programa de gestão de urgências, Peter Salama, chegaram ao país com uma vasta equipa para vigiar de perto o curso do combate à doença.

O medo destas organizações, que contam ainda com a presença da Cruz Vermelha e da UNICEF, é que o surto se expanda para Mbandaka, a capital da província, localizada nas margens do Rio Congo e onde vivem mais de 700 mil habitantes com escassos serviços como saneamento ou hospitalares, constituindo um cenário ideal para uma rápida progressão da doença, como aconteceu na África Ocidental, com epicentro na Serra Leoa, entre 2013 e 2014.

Esta, na Serra Leoa, foi a mais violenta epidemia de Ébola de sempre, com mais de 11 mil mortos, 30 mil contaminações e um impacto económico devastador ao ter deslaçado o tecido económico de vários países, com a Guiné-Conacri, a Serra Leoa e a Libéria a sofrer mais.

É precisamente evitar a repetição deste cenário que a comunidade internacional pretende a todo o custo, até porque se as condições que permitiram a rápida progressão do vírus em 2013/14, na Serra Leoa, eram favoráveis a isso, no local onde está a acontecer na RDC, em Bikoro, chegam a ser piores.

Essa realidade obriga a um esforço multidisciplinar para evitar que se repita, conjugando a medicina e a questão cultural, onde os mesmos hábitos de contacto com os mortos, como lavar e tocar com os lábios nos cadáveres, existem e são um factor de risco suplementar para o alastramento da doença de Bikoro, área remota e pouco povoada a cerca de 300 kms de KInshasa, para zonas mais densamente povoadas, como é a capital da província, Mbandaka, onde, se o Ébola chegar, terá condições para se expandir.

Sobre essa possibilidade, o responsável da OMS pelo departamento de controlo de emergências, Peter Salama, recordou aos jornalistas que a experiência permite concluir que sempre que um surto deste género atinge áreas densamente povoadas em África, especialmente nas regiões mais pobres, como é o caso, a situação ganha contornos de gravidade e passa a exigir um enorme esforço global para a conter.

Recorde-se que esta diligente resposta da OMS parece contrastar com aquilo que sucedeuem 2013/14, na Serra Leoa, onde a organização foi severamente criticada por ter chegado demasiado tarde ao local e por não ter mostrado capacidade de resposta à altura da gravidade da situação.

A vacinação pode avançar

Entretanto, uma das armas que existem agora e não estava disponível na epidemia da África Ocidental é a vacina experimental que pode ser usada pela primeira vez em Bikoro.

Para que a vacinação, que será gerida pela Gavi, uma aliança global para a vacinação, com investimentos privados e públicos, possa avançar, a OMS precisa da autorização das autoridades da RDC devido aso seu carácter experimental.

No entanto, segundo se sabe até ao momento, os testes laboratoriais para esta vacina são prometedores, mas ainda não há 100% de certeza quanto à sua eficácia e comportamento em situações reais, com populações dispersas e condições de propagação complexas e ramificadas, com questões culturais a facilitarem o caminho do Ébola.

Um dos problemas que a vacinação enfrenta é a questão da contaminação dos trabalhadores de saúde, até porque em Bikoro já foram registadas três vítimas entre as equipas de socorro, e as condições técnicas para a aplicação, que consiste em manter as vacinas a temperaturas negativas extremas, o que, no local, muito quente e húmido todo o ano, se torna um desafio de grande amplitude.

Angola não está no mapa das preocupações da OMS para o alastramento do vírus, embora essa possibilidade não esteja posta de lado devido ao curso do Rio Congo, sendo a República Centro-Africana e o Congo-Brazzaville as principais inquietações.

Porém, em Angola, as autoridades de saúde já tenham em curso uma campanha de sensibilização e prevenção, especialmente nos postos fronteiriços, de forma a prevenir eventuais focos ou casos isolados, garantindo resposta imediata.

A provocar pânico desde 1976

O vírus do ébola foi descoberto na República Democrática do Congo, em 1976, numa floresta equatorial e fronteiriça com o Congo-Brazzaville.

Ao longo dos últimos anos, a RDC tem sido palco de vários focos de ébola, especialmente nas suas províncias do extremo norte, próximas da República Centro-Africana.

Desta feita, o foco está localizado significativamente mais a sul, embora ainda a várias centenas de quilómetros da fronteira com Angola.

Recorde-se que o ébola é endémico na RDC e a transmissão para humanos foi feita através de animais selvagens, nomeadamente primatas e morcegos que, por vezes, são consumidos pelas populações locais, sendo a dispersão entre humanos produzida a partir de fluídos corporais, sendo a taxa de mortalidade de 50 por cento.

O vírus do ébola causa, entre os seus principais sintomas, febres, vómitos, diarreia e hemorragias sem causa aparente.