A 06 de Janeiro, há pouco mais de uma semana, o barril de crude valia 69 dólares, impulsionado pela crise no Médio Oriente despoletada pela morte do general herói iraniano, Qassem Soleimani, por um míssil norte-americano, em Bagdade, a capital iraquiana, a 02 de Janeiro.

Mas, à medida que a crise vai esmorecendo, e o risco de um conflito armado vai sendo diluído pelos acontecimentos, como o abate por engano de um avião comercial ucraniano após levantar voo de Teerão, pela defesa antiaérea da Guarda da Revolução do Irão, que fez baixar, e muito, o tom ameaçador da retórica do regime dos aiatolas, também o valor do barril de petróleo vai emagrecendo a olhos vistos.

E com pesada factura pela recente subida. Neste momento o barril já está a valer menos 2 dólares que nas horas que antecederam a morte de Qassem Soleimani, uma péssima notícia para as economias petrodependentes, como é a angolana. Cerca das 10:15, o barril de Brent estava a valer 64,01 USD.

Embora o Orçamento Geral do Estado para 2020 tenha sido elaborado com base num preço médio para o barril de 55 USD, o certo é que o excedente é a bóia de salvação do Governo de João Lourenço porque, entre outras urgências, permite amortecer os efeitos nefastos de uma dívida que se aproxima rapidamente dos 100% do PIB.

Mas este não é o único problema com que a matéria-prima se debate para evitar uma descida aos infernos onde esteve pela última vez no 1º trimestre de 2016, quando chegou mesmo a descer da casa dos 30 USD, para pouco mais de 29 USD por barril em Fevereiro/Março desse ano, em consequência da crise que nasceu da queda abrupta do barril de mais de 100 USD em meados de 2014.

As organizações internacionais começam timidamente a admitir que uma nova crise económica pode estar a rebentar, muito por causa dos efeitos devastadores na confiança dos mercados da prolongada guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, sem que se veja que os anúncios de tréguas possam começar a surtir efeitos.

Na verdade, o que está hoje a "assustar" muitos analistas que expressam as suas opiniões nos media internacionais é que, apesar de a volatilidade dos mercados petrolíferos não ser propriamente uma novidade causadora, por si, de pânico, o efeito da concentração de factores a empurrar em sentido descendente, como as já citadas crise no Médio Oriente, a guerra comercial EUA/China, os prognósticos negativos para o crescimento da economia global, uma diminuição clara da criação de emprego nas principais economias mundiais, ao que escapa, para já, a norte-americana... pode levar a uma nova situação de crise planetária como a de 2014, quando o barril desceu abruptamente dos 120 USD para menos de metade, chegando aos 29 no início de 2016.

É nos detalhes que o diabo se esconde

Alex Kimani, um analista veterano e investidor no sector, escreve no site oilprice que está a emergir aquilo que na terminologia da área se denomina "crack spread", ou seja, a diferença entre o que custa um barril de petróleo e o valor dos produtos refinados, como a gasolina, produzidos a partir desse mesmo barril.

Explica este analista que nem sempre estes valores - o custo do barril e o preço de venda dos refinados - estão alinhados na perfeição, acontecendo, por vezes, mudanças importantes que impactam pesadamente nas margens de lucro da refinação, ao mesmo tempo que servem como uma espécie de oráculo para "adivinhar" o que está para vir.

Ou seja, se o "crack spread" sobe, isso significa que se está perante um crescimento da procura dos subprodutos do petróleo e uma diminuição do valor do barril, crescendo as margens de lucro dessa mesma refinação, enquanto uma baixa deste "spread", tende a significar descida na procura por refinados e um aumento substancial do valor do crude em bruto, esmagando essa circunstância as margens de ganhos da indústria da refinação.

E os actuais gráficos que marcam a evolução deste "crack spread", sublinha Kimani, especialmente o da gasolina, que tende a ser o mais simbólico, apontam para um enfraquecimento da procura de produtos resultantes da refinação de crude.

E uma das provas, o fumo a sair do cano do revolver, é que os stocks de crude nos EUA tem, na verdade, segundo o Instituto Americano do Petróleo (API; sigla em inglês), diminuído há várias semanas consecutivas, o que normalmente aponta para um bom desempenho da indústria consumidora de crude, mas isso não sucede neste momento, porque os stocks de gasolina, pelo contrário, estão a observar um crescimento significativo.

Conclusão: a descida dos stocks de crude nos EUA não está directamente ligada, pelo menos totalmente, a um maior consumo da indústria, sendo esse dado enganador e pode estar por detrás de falsas perspectivas positivas para as economias mais importantes e, logo, a gerar falsas esperanças entre os exportadores de crude. Isto, porque o petróleo em bruto está a sair de um lado para ser armazenado noutro mas na forma de gasolina.

E este "pormenor" pode mesmo ser uma das razões pelas quais, ao contrário do que sucede normalmente, os mercados não estão a comportar-se como costumam face a eventos perigosos no Médio Oriente, como foram a morte de Qassem Soleimani a 02 deste mês ou mesmo os ataques de 14 de Setembro do ano passado às infra-estruturas petrolíferas da Arábia Saudita.

Após um breve período de resposta em alta, o barril, tanto de Brent como no WTI de Nova Iorque, tem observado descidas abruptas e para valores abaixo dos que registavam antes dessas ocorrências inusitadas e perigosas.

Se os gráficos do sobe e desce do barril podem ser um bom indicador do "calor" ou arrefecimento produzido pelas economias mais importantes, China, EUA, Europa..., a verdade é que podem ser enganadores, porque, como se pode verificar pela análise aos "crack spreads", nem sempre o que parece é e é nos detalhes que está o diabo.