Ate aqui, para evitar os desmandos e os excessos de má memória do Presidente Mao Tse Tung, ou Mâo Zedong, que Governou a China entre 1949 e 1976, ano da sua morte, a Constituição chinesa, para isso alterada em 1982, permitia apenas dois mandatos presidenciais consecutivos.
No entanto, apesar dos bons resultados demonstrados pela imposição do limite de mandatos e, por isso, do exercício do poder, Xi Jinping foi alicerçando o seu poder e, como lembram alguns analistas citados pelos media globais, limpando toda a oposição interna à sua volta claramente com o objectivo de abrir caminho a esta alteração constitucional que lhe permite exercer o poder de forma ilimitada no tempo, recuperando o legado de Mao e dos antigos imperadores.
Foi com Deng Xiaoping, sucessor de Mao, tendo governado até 1989, que a China encetou as reformas económicas que fizeram deste país a segunda, ou mesmo a primeira, potencial económica global, mas também foi pela sua mão que surgiram algumas das reformas politicas que, apesar de totalitário, deram ao Partido Comunista Chinês um ar de abertura, nomeadamente o limite para um máximo de dois mandatos do líder através de uma alteração constitucional, distinguindo-se assim dos restantes regimes totalitários.
Esse momento histórico foi agora revertido por 2 958 membros da ANP que votaram a favor da alteração à Constituição que permite a XI Jining dirigir o país durante o tempo que achar por bem.
Apesar de a oposição, dois votos contra e duas abstenções, ser irrelevante, a sociedade chinesa, hoje mais informada e com acesso ao que se passa no mundo, reagiu com as ferramentas disponíveis sem correr o risco de ir para a cadeia.
Através do humor nas redes sociais, com a afinação certa de forma a passar na permanente vigilância da censura exercida pelo regime, muitos chineses mostraram o que pensam sobre este momento, sendo um exemplo disso mesmo a analogia criada entre este retrocesso político e os avisos dos carros comerciais na China que, quando em marcha atrás, emitem um aviso automático bem conhecido e distinto.
Quais as implicações desta mexida constitucional no processo de afirmação global da China, seja no campo económico ou mesmo na área militar, é a pergunta que todos querem ver respondida mas que, tendo em conta as especiosidades chinesas, vai levar algum tempo para se vislumbrar a resposta.
Há, no entanto, um primeiro sinal para cada um destas áreas.
No campo militar, a China está claramente a apostar no reforço e modernização dos seus equipamentos, com investimentos avultados nas tecnologias espaciais, na construção de modernos porta-aviões ou ainda na sua clara expansão extracontinental, como e disso prova o avanço para África, com novas bases e presença em exercícios múltiplos com aliados locais, desafiando de forma inequívoca as potenciais ocidentais, nomeadamente os EUA que se viram obrigados a enviar o seu Secretário de Estado, Rex Tillerson, para procurar não ver as portas todas fechadas.
Alias, Tillerson, que esteve num périplo africano na semana passada, lançou mesmo um aviso, recebido com algum espanto pela falta de sensibilidade diplomática, para que os países africanos tenham cuidado com a estratégia chinesa de ganhar espaço e influência através dos avultados empréstimos com o objectivo final de domínio sobre o continente.
Mas também no campo económico, sendo disso um exemplo claro a resposta musculada dada por Pequim à decisão da administração norte-americana de aumentar as taxas alfandegárias do aço e do alumínio que entram nos EUA, o que constitui um rude golpe na indústria chinesa que tem no mercado norte-americano o destino mais lucrativo da sua produção exportada.
Pequim avisou de forma clara que se trata de uma declaração de guerra económica, como alias fez também a União Europeia, engatilhando de imediato um conjunto de respostas em jeito de resposta, abrindo caminho a uma disputa pesada que todos sabem como está a começar mas que ninguém se pode dar ao luxo de antecipar como mais acabar.
Ou seja, a China de Xi,, como admitem alguns analistas, chegou à fase madura em que já não precisa de se debater em busca de um lugar na sala mundial onde o mais importante de decide, porque já conquistou esse lugar e agora pode olhar olhos-nos-olhos as outras grandes potencias sem desviar o olhar.
Para já, facto é que Xi Jinping, com 64 anos, ainda tinha mais um mandato para cumprir ao abrigo do anterior texto constitucional. Teria até aos 70 anos para governar. Essa constatação permite, ainda segundo outros analistas, concluir que não será para si que Xi quer a possível perpetuação do poder nas mãos de um indivíduo.
Para o que é que quer que assim seja, então? A resposta mais razoável é que a China está num outro momento importante de transição e prepara-se para uma época histórica no virar da esquina do futuro que crê poder vir a ser mais turbulenta e exigente ao nível das decisões a tomar, que poderiam ser prejudicadas pelo esboço democrático da anterior versão constitucional.
Um sinal de que assim tende a ser é que esta alteração à Constituição não visa apenas o esboroar dos limites ao exercício do poder presidencial, ela abrange igualmente o núcleo duro dos dirigentes do Partido Comunista Chinês cujos membros ocupam mais de 70 por cento dos quase 3 000 lugares na Assembleia Nacional Popular.