A 15ª Cimeira desta organização multicontinental que integra o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul, tem estado permanentemente nas páginas dos sites internacionais devido à obrigação de Pretória de deter o Presidente russo se este se deslocar ao país por causa do mandato internacional de captura emitido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).

Enquanto membro do Tratado de Roma, que criou o TPI em 1999, a África do Sul, teoricamente, deveria ser obrigada a deter Putin, mas desde que o mandato de detenção foi emitido por este tribunal, em Março, quando já estava agendada a Cimeira dos BICS em Agosto para Durban, que as autoridades sul-africanas deixaram claro que não o iriam fazer.

Faltando clarificar a ferramenta legal que iria ser utilizada, ou através de legislação específica ou pela via mais simples de uma excepção presidencial abrangendo todos os Chefes de Estado e de Governo dos BRICS que os mantenha protegidos do braço legal do TPI, uma instância judicial que não está inserida no sistema das Nações Unidas e sobre a qual correm abrasivas suspeitas de acção dirigida e parcial por incidir quase em exclusivo sobre africanos e da antiga Jugoslávia.

Essa dúvida está agora desfeita com o anúncio por parte do ministro-adjunto da Presidência, Obed Bapela, de que o Parlamento sul-africano vai aprovar legislação que isenta os lideres dos BRICS de qualquer acção judicial interna ou externa.

A aprovação desta legislação está garantida devido à maioria do ANC, no poder, e do EFF, o terceiro partido com mais deputados, de Julius Malema, que já se disponibilizou para sair à rua com os seus "freedom fighters" para proteger Putin se for necessário, desde que este aterre na África do Sul até que embarque de regresso a Moscovo.

Em declarações à BBC, Bapela disse que a referida legislação vai ser aprovada em Junho e o seu conteúdo vai permitir que seja a África do Sul a "decidir soberanamente quem deve deter e quem não deve deter".

Este passo legislativo de Pretória deve diluir todas as dúvidas existentes no Kremlin sobre a presença de Putin em Durban, mas, para já, nas escassas informações avançadas pelo porta-voz, Dmitri Peskov, a única certeza é que a Rússia vai estar presente, só não sendo ainda definitivo quem vai chefiar a sua delegação.

A Rússia é um dos países mais empenhados no sucesso dos BRICS porque é nem mais nem menos que a principal plataforma onde Moscovo desafia a hegemonia global dos Estados Unidos, contando com o sólido apoio da China nesse desafio, que passa, como parecem estar de acordo sem titubear todos os seus membros, pela alteração da actual ordem mundial baseada nas regras ocidentais desenhadas pelos EUA no pós II Guerra Mundial, por uma nova ordem mundial multipolar e baseada na cooperação entre iguais.

Para já, as coisas estão a correr bem, porque não só os BRICS já ultrapassaram no seu PIB o G7, que agrega os sete países ocidentais mais ricos, como a lista de espera para aderir ao futuro BRICS+ é cada vez mais extensa, com, à cabeça, a Arábia Saudita, Argentina, Argélia, Indonésia, estes com entrada quase certa já a partir da Cimeira de Durban, estando, entre outros, cerca de 30, perfilados a seguir, como o Senegal, a Venezuela, o Egipto, os Emirados Árabes Unidos...

Esta histórica Cimeira já está a ser desenhada entre Pretória e as restantes capitais, estando a decorrer, na Cidade do Cabo - Cape Town uma reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos cinco, com o objectivo de dar os retoques finais à agenda, esperando-se, como noticiam os media russos e chineses, que deste encontro ao mais alto nível saía um roteiro claro de desafio e diluição da hegemonia ocidental.

Angola v BRICS

Embora há muito não se fale nisso, Angola, ainda em 2018, era um dos países que tinha como objectivo integrar este bloco de países.

Isso mesmo ficou expresso nas declarações do Presidente João Lourenço, um dos convidados da Cimeira que nesse ano decorreu em Joanesburgo, onde afirmou que Angola pretendia uma integração na organização.

Nessa 10ª Cimeira dos BRICS, o Presidente angolano afirmou mesmo querer acrescentar "outra letra" à sigla que define o bloco porque o seu exemplo "inspira(va)" Angola.

E explicou assim esse desiderato: "Alavancar a estratégia para a parceria económica de África com os BRICS na perspectiva do crescimento inclusivo e da prosperidade compartilhada com o avanço da 4ª revolução industrial, pode efectivamente potenciar o desenvolvimento sustentável, a inclusão económica, a reforma do Estado, a boa governação, a modernização e desburocratização dos serviços públicos assim como o surgimento da economia digital e do governo electrónico".

No entanto, com o correr do tempo, este objectivo foi sendo esquecido e hoje, como se pode verificar aqui, Luanda mudou a agulha dos BRICS para o ocidente, estando actualmente a apostar no reforço das relações e cooperação com os Estados Unidos da América, de forma "consciente", como o admitiu João Lourenço aquando da Cimeira EUA-África que teve lugar em Washington, em Dezembro do ano passado.