E foi neste contexto que "várias famílias" me desafiaram a registar, quase só com recurso às memórias, os momentos simbolicamente mais marcantes do nosso basquete. Aceitei o desafio. Não como testemunha, muito menos como protagonista, mas como um culto da história de íntima conexão deste jogo "bola laranja", com o nosso País a tornar-se um dos seus símbolos de afirmação, orgulho e identidade mais marcantes.
No ano de 1976, transcorridos somente quatro depois da proclamação da Independência, Angola estreava-se no basquetebol internacional: os masculinos defrontaram a Nigéria e as senhoras o Congo Brazzaville.
Dois anos depois, em Nairóbi, a primeira medalha - o bronze nos Jogos Africanos Universitários - com o agora médico Paulo Múrias a representar um país que ainda aprendeu a andar.
O ritmo acelerou. Em 1979, o Ferroviário de Angola tornou-se o primeiro campeão nacional de Angola independente, e a selecção fez o seu primeiro oficial diante da Zâmbia. Um ano depois, em 1980, a glória: os juniores conquistaram o primeiro título africano da história de Angola - a primeira medalha de ouro numa modalidade colectiva.
Daquele ponto em diante, o basquetebol angolano começou a construir uma epopeia. Em 1981, as senhoras, lideradas por Adriana Sebastião, "Didi", subiram ao pódio em Dakar. Em 1983, os seniores masculinos conquistaram a primeira medalha continental, e Luanda recebeu, pela primeira vez, um Afrobasket. Foi um tempo de entusiasmo e de fé.
Em 1985, a prata no Afrobasket da Costa do Marfim abriu as portas do mundo. No ano seguinte, Angola estreou-se no Campeonato Mundial, enfrentando a União Soviética e vencendo a Austrália - um feito que nos apresentou ao planeta. E, em 1989, o País inteiro vibrou com a primeira conquista do Afrobasket sénior masculino, em Luanda. Foi uma vitória desportiva, mas também política e espiritual: um grito de afirmação de uma Angola jovem, confiante e capaz.
O bicampeonato de 1991, no Cairo, levou-nos pela primeira vez aos Jogos Olímpicos de Barcelona. E ali, diante do mundo, Angola viveu o seu momento de eternidade: uma vitória sobre a Espanha por vinte pontos de diferença e o encontro histórico com o mítico "Dream Team" dos Estados Unidos. Poucos países têm um instante assim - um instante em que o impossível se curva perante a fé.
Vieram depois novos capítulos de glória. Em 1993, o tricampeonato em Nairóbi. Em 1999, o ouro das juniores femininas em Dakar. Em 2002, já em tempo de paz, o 1.º de Agosto conquistou pela primeira vez a Taça dos Clubes Campeões Africanos, deixando uma década de retirada.
Em 2006, a selecção nacional brilhou no Mundial do Japão, atingiu o nono lugar - a melhor classificação de sempre - enquanto o 1.º de Agosto feminino venceu a sua primeira Taça Africana.
Em 2011, em Bamako, as nossas guerreiras conquistaram o primeiro Afrobasket sénior feminino, e Jean Jacques da Conceição, o campeão eterno, foi consagrado pela FIBA África como o melhor jogador africano de todos os tempos. Dois anos depois, seria o primeiro angolano a entrar no Hall da Fama da FIBA, num ano em que Angola conquistou cinco dos seis torneios continentais.
Em 2014, as senhoras estrearam-se no Campeonato do Mundo sénior, e, em 2019, Bruno Fernando liderou o nome de Angola à NBA.
Chegamos, assim, a 2025 - o ano da comemoração dos cinquenta anos de Independência. O ano em que Angola voltou a erguer o troféu continental do Afrobasket sénior masculino, em casa, doze anos depois. Foi mais do que uma vitória: foi uma declaração de continuidade, um reencontro entre o presente e a memória.
Hoje, olhando para trás, percebi que cada vitória foi mais do que um resultado. Cada cesto foi um acto de fé. O basquetebol ensinou-nos que o talento é importante, mas a disciplina e a crença são decisivas. Ensina-nos que a grandeza não é apenas nas medalhas, mas na persistência de um povo que nunca se rende.
O nosso basquetebol é a imagem de Angola: resiliente, apaixonado, imperfeito e teimosamente vivo. Em cada geração que veste a camisola nacional, há o mesmo brilho nos olhos de quem acredita que é possível vencer o mundo - e há, também, a mesma responsabilidade de honrar os que vieram antes.
Cinquenta anos depois de Dipanda, continuamos a saltar. Continuamos a lutar. Continuamos a acreditar. Porque, no fundo, o basquetebol é Angola em movimento - uma metáfora da nossa própria história: a bola que sobe, cai, e volta a subir, sempre com o mesmo sonho de tocar o céu.
Viva Angola. Viva a liberdade. Viva o nosso basquetebol.

*Jurista e Presidente do Clube Escola Desportiva Formigas do Cazenga