É óbvio que para que uma sociedade funcione os seus cidadãos têm de seguir regras, códigos éticos e morais. Constitucionalmente os cidadãos têm direitos, mas também têm deveres, obrigações. Cada um tem de fazer a sua parte, incluindo meter um pouco de dinheiro no bolso, e aqui deve-se entender que são os rendimentos do suor de cada um, fruto do seu trabalho. O bolso será o cofre que serve para guardar as suas poupanças, quando dá.
A frase "se não fizerem o que peço, meto o dinheiro no bolso", mesmo enquanto gracejo, é muito parecida com a atitude daquele menino, dono da bola, mas que, não tendo jeito para o futebol, anuncia arrogantemente: "se eu não jogar, ninguém joga porque a bola é minha". Neste contexto, possuir a bola é como possuir a soberania. É um poder de veto absoluto. Mesmo que o dono da bola seja um desastre a correr atrás dela, ele domina o jogo por posse, não por mérito.

Esta atitude revela uma confusão entre a propriedade e a legitimidade. Ter algo não significa saber usá-lo bem. E ainda assim, o domínio material é muitas vezes usado para impor vontades, bloquear colectivos ou, pior, punir divergências. Depois, num contexto onde é necessária tradução do português castiço para os dialectos locais. Entre o verbo "meter", o substantivo "dinheiro" e o pronome possessivo "meu", podem-se criar várias interpretações.
O dinheiro público tem morada: chama-se orçamento, tribunal de contas, plano de desenvolvimento. Não cabe numa metáfora de bolso largo, e muito menos numa retórica que sugere chantagem com base na obediência popular. Já temos o desafio entre o que está orçamentado, o que está cabimentado e o que depois é realmente disponibilizado. Ou ainda a diferença entre o saldo contabilístico e saldo disponível. Não é preciso mais uma nova barreira. O bolso de uns é o cafocolo de outros. Ou cabe muita coisa, ou quase nada cabe.