Face ao número de alterações introduzidas, o legislador aproveitou o ensejo para, entre outras coisas, marcar passos em direcção ao tão propalado modelo de tributação única que, de resto, já encontra respaldo nas Linhas Gerais do Executivo para a Reforma Tributária de 2014.

Qualquer alteração ao CIRT se afigura sempre como matéria complexa e de elevada sensibilidade, porquanto não há outro imposto no nosso sistema fiscal que incide de forma directa e imediata sobre os rendimentos do cidadão como o IRT, sendo que, mediante o pagamento deste imposto (e não só) pelos contribuintes, se materializa o dever fundamental de contribuição, previsto na Constituição da República de Angola.

A reformulação das normas nesta revisão indicia-nos o intuito reformador do legislador, razão pela qual elencaremos quatro medidas que acabam por lançar sementes para a tributação mais adequada das pessoas singulares no nosso sistema tributário, nomeadamente:

1. O alargamento de remunerações tributáveis: o legislador procedeu à introdução de uma alínea ao n.º 2 do artigo 1.º (incidência), com o objectivo de consagrar, no CIRT, uma base de incidência mais ampla, tendo em vista a tributação de todas as manifestações de força económica do contribuinte, deste modo, as remunerações, qualquer que seja a sua designação ou natureza (ordenados, salários, vencimentos, gratificações, abonos), bem como os benefícios ou regalias auferidas pelo trabalhador em razão da prestação de trabalho dependente ou da prestação de serviços. Ainda neste domínio, destaca-se a adopção do conceito de rendimento acréscimo, assente na teoria do acréscimo patrimonial, passando a ter uma norma de incidência mais abrangente, que não faz escapar do fisco nenhum tipo de rendimento que tenha conexão com a actividade laboral ou de prestação de serviços;

2. Eliminação do regime de isenções específicas: o artigo 23.º da Constituição consagra o princípio geral da igualdade, no qual o princípio da igualdade fiscal encontra a sua teleologia, transmitindo a ideia de generalidade ou universalidade aos destinatários da obrigação fiscal. Assim, em sede do IRT, todos os rendimentos resultantes do trabalho prestado por força de função, serviços ou cargos públicos, abrangendo os agentes e os funcionários da administração pública (central ou local), tantos os civis, militares e paramilitares, bem como os titulares de cargos políticos, devem estar sujeitos a este imposto. Na verdade, a opção da eliminação da isenção em sede dos rendimentos das pessoas singulares que prestem serviço militar obrigatório já havia sido sinalizada na alteração anterior ao IRT, operada pela Lei n.º 9/19, de 24 de Abril, conquanto a versão original do código isentasse, indiscriminadamente, o pessoal afecto aos órgãos de Defesa e Ordem Interna, designadamente os militares, os paramilitares, entre outros. Com efeito, a partir da entrada em vigor das novas regras, deixa de existir a isenção que sobreviveu à alteração anterior, estando agora sujeitos a imposto os rendimentos das pessoas singulares que prestem serviço militar obrigatório, conferindo-se um tratamento igual para efeitos fiscais à generalidade dos contribuintes. A eliminação total desse regime de isenção vai permitir maior e melhor gestão e controlo orçamental da despesa salarial associada, sem descurar também os objectivos de aumento na arrecadação deste imposto neste segmento bastante representativo;

3. Aumento do limiar de isenção: o legislador aproveitou o ensejo para subir o limiar de isenção em sede de IRT de AKZ. 34.450 para AKZ. 70.000.00, limite a partir do qual passam estar sujeitos a tributação os contribuintes dependentes, enquadrados no Grupo A. Este ajuste cria condições para abrir portas ao debate sobre a consolidação de um mínimo de existência na tributação dos rendimentos das pessoas singulares em Angola, pelo que entendemos ser o momento oportuno para a nossa sucessiva reflexão em torno da determinação de forma efectiva do «valor óptimo» que se revele realista para atender à subsistência básica de qualquer cidadão e do seu agregado familiar. O Estado de Direito social consagrado no nosso texto constitucional atribui particular relevância às necessidades do agregado familiar em sede da tributação do rendimento das pessoas singulares. Nesta ordem de ideias, incumbe-se ao legislador que, na regulação do sistema fiscal, deve posicionar-se, nos próximos tempos, acerca do enquadramento jurídico-fiscal da composição dos agregados familiares, no que às deduções de alguns tipos de despesas com a saúde, educação, habitação entre outras, diz respeito, perspectivando chegar à implementação de um imposto verdadeiramente «pessoal»;

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*Técnico do Centro de Estudos Tributários da AGT