Paredes vandalizadas, jardins degradados e baloiços partidos, alguns com lixo espalhado pelo recinto, são o que resta de dezenas de parques da capital do país fora dos locais mais resguardados, como condomínios ou espaços comerciais nas zonas nobres da capital angolana.

O parque com o nome Augusto Ngangula, assassinado pela tropa colonial portuguesa em 1968, durante a Luta de Libertação Nacional, na província do Moxico, leste de Angola está em estado avançado de degradação.

"O parque foi criado justamente para que as crianças do bairro pudessem ter momentos de lazer", disse ao Novo jornal Online Ermelinda Paulo, moradora do bairro Popular.

Segundo ela, "as crianças, quando brincam livremente no parque infantil, desenvolvem novas habilidades e competências e o seu acompanhante poderá observar a criança, nas suas relações com outros colegas".

"Os parques infantis mereciam uma intervenção por parte das entidades responsáveis. Têm de ser intervencionados rapidamente. Para estarem assim, mais vale estarem encerrados, mas estão abertos, permitindo o acesso às crianças, o que é perigoso", acrescentou.

Mas isso não tem como acontecer em Luanda, onde os pais se revoltam por não poderem levar os seus filhos para brincar nos parques. A funcionária pública, Laura de Carvalho, também moradora no Bairro Popular, espera que o Governo de Luanda construa mais espaços de recreação para crianças.

"As crianças de hoje passam muito tempo em ambientes fechados, sentadas a ver televisão ou a navegar no computador, comprometendo o seu desenvolvimento físico, psicológico e social", sustentou.

Na opinião da educadora social Maura da Costa Suingui, a falta de parques infantis na capital é um "calcanhar de Aquiles" e espera que o Executivo encontre uma solução para fazer face à situação.

"Ao brincar, as crianças não desenvolvem apenas as suas capacidades físicas, mas, principalmente, as suas competências emocionais e sociais", argumentou a educadora social.

Segundo ela, "as estruturas infantis são fundamentais, pois conseguem conciliar a vida familiar e profissional, sobretudo das mães".

"Os parques infantis são fundamentais e imprescindíveis ao desenvolvimento da criança, pois permitem à criança brincar, conviver e socializar", conclui.

O sociólogo Araújo Samba, entende que, num parque infantil, "a criança brinca, explora o mundo, as suas possibilidades, e se insere nele, de maneira espontânea e divertida, descobrindo-se a si própria".

"Uma criança que passa por um centro infantil chega à escola mais bem preparada e mais evoluída em relação às condições do ambiente familiar", concluiu.

Parque infantis só nas zonas nobres

Em várias áreas de Luanda, onde se verificou a requalificação dos bairros ou a intervenções para embelezar as ruas, nunca as autoridades complentes imaginaram projectar a construção de parques infantis.

Na capital do País, segundo apurou Novo Jornal Online, só existem espaços para as crianças brincarem em segurança nas centralidades, condomínios e bairros nobres.

"A maioria parte da população de Luanda vive nos bairros suburbanos. Apelo às autoridades idóneas para criarem parques infantis nestes bairros", rogou o munícipe António Jacinto Kamaty, do Bairro Rocha Pinto.

Os parques infantis Praça da Unidade Africana, Ulengo Center, Xyami Shoppings, Kool Park, Decifer , Calçadão do Benfica, Complexo Girafa e Marginal de Luanda são entre outros que dão alegria a crianças nestas zonas nobres da capital.

Zonas suburbanas

Em pausa escolar, Arminda Costa, 14 anos, não sabe onde passar o seu tempo brincando com amigos. A sua diversão durante o período de férias é distrair-se na rua com as amigas, uma opção que não é do agrado da mãe.

"Os meus filhos preferem ficar em casa. É uma vergonha ver um bairro em plena capital do país sem um parque infantil", queixa-se a mãe da pequena Arminda Costa, que mora no Bairro Calemba II.

O funcionário público Joaquim Cambuembue não pode tirar férias com a filha. Mas, aos fins-de-semana, disponibiliza-se para levar a pequena Judite, no Xyami Shoppings.

"Vivemos no bairro Palanca, onde o Governo não pensou colocar sequer um lugar para divertimento (campo de futebol e parques infantis). Para alegrar a minha filha sou obrigado a levá-la ao Xyami Shoppings", lamenta.

Para manter a pequena Marlene Caculo, de 12 anos, entretida, neste momento de pausa escolar, Gervásio Malesso planificou uma viagem com ela à província do Huambo, onde estão os seus pais.

"Sempre que o período de férias se aproxima, ficamos preocupados com a ocupação de tempos livres da nossa filha, já que aqui no bairro não há espaços para brincar em segurança", contou Gervásio Malesso ao Novo Jornal Online.

Segundo ele, uma "bela viagem para saudar os avós é sempre inesquecível".

"Sempre aproveitei este período para levar a minha filha a ver avós na minha terra natal", destacou.

O também funcionário público Pedro Catenda leva regularmente os seus filhos a algumas áreas de Luanda onde há parques.

"Os meus filhos pedem-me e faço isso quinzenalmente para satisfazer os seus desejos", comentou.

Já o munícipe Santana Cavanza não consegue levar os filhos aos parques, pois alguns parques cobram entre 500 e 3.000 kz.

"Eu não tenho poder económico para o fazer e explico isso aos meus filhos", referiu.

Espaços reservados para parques foram sendo vendidos

Quer os munícipes, quer as autoridades das administrações municipais da capital do País são apontados como sendo responsáveis pela falta de espaços de lazer nos bairros.

O ancião Rodrigues Menga, que vive no Bairro da Sapu, disse ao Novo Jornal Online que, quando a população começou a invadir os terrenos daquele bairro, ninguém imaginava as futuras consequências sobre os espaços de divertimento das crianças e não só.

"As ruas do bairro transformaram-se em campos de futebol. Quando a rapaziada ocupava uma rua a jogar a bola, não respeitam as pessoas nem as viaturas que passavam. É assim que a nossa vida vai andando no bairro", declarou.

Segundo ele, os supostos coordenadores dos bairros foram vendendo os espaços que a população tinha reservado para a construção de escolas, hospitais (...), parques infantis, entre outros.

"Todos nós pagamos hoje as consequências", concluiu.

Tudo sob olhar das autoridades

O conflito armado que assolou o País e que obrigou milhares de pessoas a abandonarem as suas regiões de origem, em busca de segurança em Luanda, é apontado como principal causa para a ocupação de terrenos anarquicamente.

"As autoridades governamentais estavam baralhadas. E, muita gente de má-fé, face à carência habitacional, foi vendendo terrenos anarquicamente, sem obedecer às normas urbanísticas", disse ao Novo Jornal Online o arquitecto Emerso Panzo José.

Segundo ele, nessa altura, ninguém falava das Leis para definirem as infracções criminais correspondentes a essas transgressões.

"Foi nessa altura que os bairros perderam os espaços para a construção de parques infantis e outros espaços de lazer. Neste momento é difícil contornar a situação, face ao crescimento desordenado dos bairros da capital", terminou.

Na província de Luanda, a ocupação ilegal de terrenos regista-se maioritariamente nos municípios de Cacuaco, Viana, Belas, Icolo e Bengo e Quiçama.