É sem dúvida um assombro tecnológico. Tentei imaginar esta cena em Luanda onde os semáforos são poucos, com muitos avariados e na maior parte dos casos desrespeitados. Numa sociedade onde a sinalização é ignorada e, por vezes, os agentes reguladores de trânsito também, esta inovação não é para tão cedo. O condutor regular irá preferir ignorar solenemente a luz branca (quando houver luz), preferindo seguir os comandos de uma inteligência mais natural e muito mais robusta: a do taxista ao volante, cujo GPS interno é calibrado por buracos, mbaias e a necessidade premente de chegar primeiro.
A verdadeira revolução da inteligência artificial angolana não está nos chips de silício, mas na massa cinzenta dos condutores. É uma inteligência orgânica, forjada no instinto de sobrevivência, na teimosia do chico-espertismo, na leitura de sinais não verbais dos transeuntes e na física quântica aplicada às manobras de ultrapassagem pela direita. Enquanto o mundo fala de veículos autónomos, nós dominamos a arte da condução autónoma de espírito. A luz que estiver a brilhar mais forte hoje tem prioridade.
A pergunta não é se Angola está pronta para a luz branca. A pergunta é se a luz branca está pronta para Angola. Estará preparada para ser ofuscada pelo génio de um vendedor ambulante que, no tempo de um sinal vermelho, consegue mostrar-lhe 15 capas de telemóvel, vários pacotes de paracuca, caju e ginguba, e um conjunto completo de malas de viagem? Conseguirá brilho imaculado dos semáforos competir com o engenho de um cidadão a atravessar a estrada com várias bacias de cores similares às dos semáforos?
No fim, a grande revolução não será a luz branca. Será o dia em que um carro autónomo, depois de uma actualização de software feita à moda angolana, aprender a desviar-se de um buraco com a precisão de um condutor do azul e branco, a reconhecer o sinal universal da quitandeira a atravessar a rua com uma bacia de frutas na cabeça, e a entender que, por vezes, o vermelho não é uma ordem, mas uma sugestão a ser analisada com espírito crítico e um pé no acelerador.
Até lá, a nossa quarta luz será sempre o olho humano, a experiência de vida e a coragem de quem sabe que, no trânsito como na vida, o mais importante não é o sinal que é dado, mas a arte sublime de saber conduzir no caos. O futuro pode ser branco, mas o presente é gloriosamente colorido, barulhento e vivo.

