Um exemplo claro desta realidade foi observável durante a pandemia da Covid 19, cujos efeitos foram substancialmente mais complexos e custosos para combater nos países mais empobrecidos, embora a questão da mortalidade não tenha seguido essa mesma "regra".
De acordo com este estudo da ONU, os levados níveis de desigualdade económica tornam o mundo mais vulnerável a pandemias e alimentam um círculo vicioso que faz perigar saúde pública e economias, alertaram hoje economistas prestigiados e especialistas em saúde pública da ONU.
Estas conclusões, citadas pela Lusa, encontram-se num relatório encomendado pela UNAIDS, fruto de dois anos de investigação realizada pelo Conselho Mundial sobre as Desigualdades, a SIDA e as Pandemias e liderada por especialistas como o prémio Nobel da Economia 2001, Joseph Stiglitz, a ex-primeira-dama da Namíbia Mónica Geingos e o epidemiologista Michael Marmot.
"Níveis elevados de desigualdade, tanto dentro como entre países, estão relacionados com a transformação de surtos de doenças em pandemias, e a desigualdade está a minar as respostas nacionais e globais, tornando as pandemias mais perturbadoras para a economia, mais mortíferas e prolongando a sua duração", lê-se no documento citado pela Lusa.
O relatório mostra que, "por sua vez as pandemias aumentam a desigualdade", alimentando um ciclo que pôde ser observado durante crises de saúde pública mundiais como a covid-19, mas também a SIDA, o ébola, a gripe, a varíola e outras doenças.
Por isso, os especialistas alertam que "a incapacidade para abordar as desigualdades fundamentais e as condições sociais desde a covid-19 deixou o mundo extremamente vulnerável e mal preparado para a próxima pandemia", acrescenta ainda a agência de notícias portuguesa.
A pandemia de covid-19, em particular, "empurrou para a pobreza 165 milhões de pessoas, ao passo que as pessoas mais ricas do mundo aumentaram a sua riqueza em mais de um quarto", sublinham.
As desigualdades são "uma escolha política, e uma escolha perigosa que ameaça a saúde de todos", sustentou Monica Geingos, citada pela UNAIDS em comunicado.
Os autores do relatório exortam os líderes mundiais a melhorarem a preparação para as pandemias, investindo em "mecanismos de protecção social" nos seus países e, simultaneamente, tentando minorar os problemas de desigualdade global, em especial através da reestruturação da dívida dos países em desenvolvimento.
"As pandemias não são apenas crises de saúde; são crises económicas que podem agravar as desigualdades, se os líderes fizerem as escolhas políticas erradas", afirmou Stiglitz.
"Quando os esforços para estabilizar economias afectadas por uma pandemia são financiados por elevadas taxas de juro da dívida e medidas de austeridade, privam os sistemas de saúde, educação e protecção social de recursos. As sociedades tornam-se, então, menos resistentes e mais vulneráveis às epidemias", argumentou o Nobel de Ciências Económicas de 2001.
Na opinião deste especialista, "quebrar este ciclo exige garantir que todos os países têm a capacidade orçamental necessária para investir na segurança sanitária".
O relatório defende também um acesso mais equitativo aos tratamentos e tecnologias de saúde, apelando para a "suspensão imediata dos direitos de propriedade intelectual" a nível global assim que seja declarada uma pandemia.
Joseph Stiglitz irá igualmente apresentar nos próximos dias um relatório sobre a desigualdade e a pobreza globais aos líderes do G20, que representam as maiores economias do mundo e que se reunirão numa cimeira em Joanesburgo no final de novembro.

