Nesta edição, o Novo Jornal dedica 12 páginas à ONU, descrevendo vários momentos da história da organização. É uma daquelas edições com história e para a História, onde, além da sua constituição, outras estórias são partilhadas. A admissão de Angola na ONU, a 01 de Dezembro de 1976 (um ano após a sua independência), é um dos momentos mais interessantes da história da nossa diplomacia. Uma intensa batalha política e diplomática que contou com o apoio de vários países africanos e do Leste europeu fez que o Conselho de Segurança, através da resolução 397/76, recomendasse à Assembleia-Geral a admissão de Angola na ONU (com votos favoráveis da França, Grã- Bretanha e Rússia, sendo que a China se absteve e os EUA apresentaram o seu veto).

Para além daquilo que estudamos e aprendemos na escola, que lemos nos livros, ouvimos na rádio ou lemos nos jornais, cada um de nós tem um pouco de história e memória com a ONU. A minha começa com a histórica visita de Javier Pérez de Cuéllar ao nosso País em 1988 (tinha na altura 12 anos), provocada pela grande divulgação mediática, pela máquina de propaganda que na altura nos "provocava" o interesse nesta figura peruana com grandes poderes de representação. Pela informação divulgada "através " da visita de tão importante figura, nós, os pioneiros, fomos sabendo mais sobre a instituição. Fui crescendo e a ONU foi entrando na minha vida de outras formas.

No início da minha juventude, ela acaba por entrar de uma forma mais lúdica e interessante. Vivendo eu no bairro da Samba (mesmo na via principal, entre o Comissariado Municipal e o Antigo Controlo), as grandas farras, aniversários e casamentos realizavam-se nos bares da Praia Amélia, Quinta Rosa Linda, Hotel Costa do Sol e no famoso Clube das Nações Unidas. Hoje, o espaço está ligeiramente abandonado, mas, no passado, foi palco de grandes momentos que até hoje ficam nas memórias.

Avançando um pouco mais no tempo, as Nações Unidas voltam a surgir na minha vida, mas já na vertente profissional. No início da década de 2000, trabalhei para uma empresa japonesa como assistente administrativo, sendo que uma das minhas tarefas era a de ir uma vez por semana ao Prédio das Bolas para levantar o relatório de segurança que a ONU disponibiliza a vários organismos estrangeiros. O Prédio das Bolas fica na antiga Rua Direita de Luanda (hoje Major Kanhangulo) e era o edifício-sede da ONU em Angola (está desactivado desde 2019). O seu nome deve-se à sua configuração arquitectónica com janelas redondas que faziam lembrar círculos ou bolas.

Foi assim que, durante cinco anos, ia uma vez por semana ao oitavo andar do edifício (era lá que ficava o sector de segurança) para levantar o relatório. Neste processo, fiz amizades naquele sector com malta que já perdi o rasto, como o Tony, o Gonçalves (que depois foi trabalhar para o ACNUR) e um kota que julgo que era irmão mais novo do falecido general Cirilo de Sá "Ita". Cada ida ao oitavo andar era um momento para amena cavaqueira e aprendizado sobre o funcionamento da instituição. Já como jornalista, os ossos do ofício acabaram por fazer que conhecesse o amigo e colega Nkrumah Paim, voltando algumas vezes ao Prédio das Bolas para entrevistas ou cobertura de actividades jornalísticas.

De memórias e revelações, trazemos uma interessante conversa com Francisco de Almeida "Chico", um filho da terra com uma trajectória marcante nas agências da ONU em Angola. E porque são estas estórias que fazem história, trouxemos também os testemunhos de Celso Malavoloneke e de José Luís Mendonça, dois amigos cujos percursos de vida cruzam com a história da ONU em Angola. Mais do que revelar estórias é também um jornalismo com um compromisso com a História, de uma história de uma organização global, mas com interessantes momentos e testemunhos locais.