Esta epidemia está ainda localizada nas imediações de Mbandaka, perto da zona onde, em 1976, este vírus foi descoberto em humanos pela primeira vez, não muito longe da fronteira com a República do Congo-Brazzaville, os dois países vizinhos de Angola a norte, comos quais também partilha, para além da fronteira, o extenso rio Congo.

O Rio Congo é a principal via da RDC, país com escassas estradas asfaltadas e que tem neste curso de água, o 2º mais extenso do continente, bem como outros, a forma mais fácil de deslocamento de pessoas, por vezes em embarcações pouco seguras - são comuns as tragédias no país por causa de embarcações que adornam -ligando localidades ao longo de mais de mil quilómetros, incluindo Kinshasa e Brazzaville, até à fronteira com Angola, onde desagua.

O ministro da Saúde da RDC, Eteni Longondo, citado pelos media locais, informou que a declaração de epidemia foi antecedida pela confirmação da morte de quatro pessoas na cidade de Mbandaka com esta febre hemorrágica.

A sua declaração surge ainda quando, apesar de controlada, continuam a surgir casos no Leste, nas províncias do Kivu Norte e Ituri, junto às fronteiras com o Uganda e o Ruanda, onde, nos últimos dois anos, teve lugar uma das mais longas epidemias de Ébola, com vários milhares de casos, registando-se até ao momento 2.200 mortos, sendo a 2ª mais grave de sempre.

Face a este novo surto epidémico, o ministro congolês da Saúde disse aos jornalistas que as equipas já estão no terreno para onde serão enviados os equipamentos de protecção, as unidades avançadas de saúde e ainda milhares de vacinas comprovadamente eficazes no tratamento da doença nas anteriores duas epidemias, incluindo a mais devastadora de sempre, que teve lugar na África Ocidental, com epicentro da Serra Leoa e Libéria, onde morreram mais de 11 mil pessoas e centenas de milhares foram afectados.

Também a Organização Mundial de Saúde (OMS) já se pronunciou sobre esta nova epidemia, a 11º na RDC, sublinhando que é uma advertência para o facto de o mudo ter mais com que se preocupar que a Covid-19, sublinhou o seu director-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus.

A OMS, recorde-se, acaba de ser retirada da lista das organizações financiadas pelos Estados Unidos, depois de o seu Presidente, Donald Trump, ter acusado esta agência da ONU de estar a ter uma postura errada e a favor da China no que diz respeito à pandemia da Covid-19, ajudando Pequim a esconder as suas responsabilidades na dispersão do novo coronavírus.

A OMS perdeu, com a saída dos EUA da lista de financiadores cerca de 450 milhões de dólares anuais, o que pode, segundo esta, comprometer seriamente o ataque a outros problemas de saúde pública em todo o globo, incluindo as doenças mais letais no continente africano, como a malária ou a tuberculose.

O Ébola é uma doença hemorrágica que tem nos fluídos corporais a principal via de transmissão, sendo a sua letalidade, dependendo das condições sanitárias das comunidades atingidas, entre os 25% e os 85%, tendo a última, no leste da RDC, chegado aos 60% de mortalidade.

A concentração de pessoas e o deficiente saneamento básico são factores que facilitam a dispersão do vírus, o que em Mbandaka é um risco acrescido porque ambas as situações ocorrem, com muitos milhares de pessoas a viverem em comunidades pobres e degradadas e sem qualquer tipo de saneamento, bem como escassa resposta em unidades de saúde - a fotografia que acompanha esta notícia é de um dos acessos ao Rio Congo na cidade de Mbandaka.

Porém, esta doença já conta com uma vacina considerada eficaz no seu tratamento, embora não a 100%, mantendo-se como um perigo real e grave à saúde pública em África.

A primeira vez que foi detectada, em 1976, na província do Equador, onde esta nova epidemia está a deflagrar agora, os especialistas concluíram que o vírus chegou aos humanos através da carne de animais selvagens consumidos localmente, desde macacos a morcegos, entre outros, tal como se crê ter sido a causa da actual pandemia de Covid-19.

O risco de o Ébola chegar a Angola é real

Com esta nova epidemia localizada em Mbandaka, o risco de Angola, embora não evidente e reduzido, é, no entanto, real, porque esta cidade tem uma ligação directa com a fronteira norte angolana, o Rio Congo, uma espécie de auto-estrada fluvial nesta região de África, onde escasseiam as vias terrestres.

Isso mesmo lembrava em Agosto de 2019 o representante da OMS em Angola, Hernando Agudelo, reconhecendo que o ébola é uma ameaça para o país, depois de ter sido declarada a epidemia no leste da RDC, localizada em torno da cidade de Goma, a capital do Kivu Norte, que fica a cerca de 2.000 quilómetros de Angola e a cerca de mil de Kinshasa, a capital congolesa, que tem o maia directo acesso a Angola.

Neste caso, Mbandaka fica apenas a cerca de 600 quilómetros de Kinshasa e há, segundo informações recolhidas em sites de viagens, dezenas de barcos a fazer o percurso, embora as ligações directas sejam menos frequentes, embora existam várias por semana.

Nessa altura, como o Novo Jornal noticiava, Hernando Agudelo lembrou que, desde que o surto chegou à província do Goma, região com ligação directa com a cidade de Kinshasa, capital da RDC, que partilha a fronteira com Angola, a preocupação deveria ser maior.

O responsável confirmou, em declarações à imprensa, que embora esteja no nível dois em termos de territórios em risco, que partilham fronteira com a República Democrática do Congo, Angola deve ter capacidade de reacção rápida diante de um caso suspeito de ébola, uma vez que as medidas exigem supervisão e simulações, para garantir uma preparação adequada.

Segundo o representante da OMS em Angola, nas províncias que fazem fronteira com a RDC - Zaire, Uíge, Lundas Norte e Sul e Moxico - havia, na altura, há cerca de um ano, várias equipas de efectivos das Forças Armadas e da polícia fronteiriça a receber treino com o apoio da OMS, para aprenderem a lidar com o surto e passar os ensinamentos à população, pois, segundo o responsável, "é fundamental, em caso de diagnóstico, a população saber os procedimentos respeitantes à prevenção e ao manuseamento do risco clínico, nomeadamente no contacto com doentes e cadáveres, porque "a doença é altamente transmissível".