As reacções à apresentação do livro “História de Angola” são indicadoras do quanto as pessoas se encontram sedentas de conhecer as memórias nacionais, defende o autor.

“Se, ao fim destas quatro décadas – conforme pude verificar com os meus alunos universitários angolanos -, não conhecemos a nossa História, é porque há algo de grave, algo que foi deliberadamente silenciado”, nota Alberto Oliveira Pinto.

Em entrevista publicada na edição n.º423 do Novo Jornal, e aqui reeditada, o escritor e investigador insiste na urgência de o país investir em pesquisadores e não apenas em técnicos.

“Ao longo da última década, as universidades cresceram “como cogumelos”, passe a expressão, mas não vejo desenvolverem-se as Ciências Sociais e Humanas. Só vejo licenciaturas em Economia, Direito, Engenharias… As universidades estão transformadas em fábricas de técnicos. E não é essa a sua função, e sim a de laboratórios do conhecimento”.

Segundo o historiador, este défice de informação decorre da “prevalência de interesses exógenos”, consubstanciada na falta de vontade política.

“É o neocolonialismo, que anda sempre de mãos dadas com o obscurantismo e teme o conhecimento”, aponta Oliveira Pinto, destacando a necessidade de “desmontarmos os imaginários coloniais em vez de ignorá-los ou silenciá-los”.

O problema, considera o investigador, é que este caminho “tem interessado aos poderes políticos e económicos”.

Os poderes africanos não são culturalmente despóticos

Como resultado, assiste-se à perpetuação de percepções erradas de nós mesmos.

“Por exemplo, a ideia de que os poderes africanos são culturalmente despóticos não passa de uma invenção do colonialismo, que infelizmente está colada à nossa epiderme que nem uma matacanha”, lamenta o especialista, debruçando-se ainda sobre a denominada ‘poligamia cultural africana’.

“Ninguém em Luanda, presentemente, é polígamo. Poligamia significa ter mais do que uma esposa – ou do que um marido – legalmente, sem necessidade de esconder o que quer que seja, sem necessidade de criar as chamadas “Luandas-2”. Mas lá vem o imaginário colonial! E o angolano comum acha que, pelo facto de ter uma amante, é polígamo! Nada mais falso!”.

Apesar dos “desencontros” de identidade, Oliveira Pinto partilha a convicção de que “nunca há “tempo perdido”. Apenas “há que recuperar a memória. Isso sim”.