Depois de longas semanas de dúvidas sobre se a ameaça de Trump fornecer estas armas estratégicas, que podem carregar ogivas nucleares ou convencionais, a Kiev, era um bluff ou a sério, esta segunda-feira, 13, tudo ficou claro.

O Presidente dos Estados Unidos da América vai mesmo enviar um carregamento dos BGM-109 Tomahawk para Kiev - alguns analistas admitem que já chegaram à Ucrânia - com os quais o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, ameaçou atacar directamente Moscovo e o Kremlin.

A condição colocada em cima da mesa por Trump para abortar esta entrega a Kiev é que o Kremlin aceite sentar-se à mesa das negociações e ceder nas suas condições de forma a permitir acabar com a guerra, o que, para a Rússia, segundo a generalidade dos analistas, seria capitular e baixar as armas.

Tal não vai acontecer, como já anunciou Dmitri Peskov, o porta-voz de Vladimir Putin no Kremlin, considerando mesmo que, a acontecer, se trata de um passo "muito perigoso" rumo a uma "escalada no conflito" que ninguém quer ver acontecer.

Apesar desta reacção russa, o próprio Vladimir Putin já tinha advertido que este passo de Trump teria um efeito mais devastador nas relações de Moscovo com Washington que na frente de guerra.

Isto, porque os BGM-109 Tomahawk só podem ser disparados por militares norte-americanos e a definição dos alvos só pode ser feita através de dados fornecidos pelos satélites norte-americanos, o que faria com que "os EUA estivessem directamente a atacar a Rússia".

Ora, estas palavras de Putin já foram ouvidas antes, com os mísseis ATACMS e até com os sistemas múltiplos HIMARS, que carecem do mesmo tipo de suporte norte-americano, embora os Tomahawk tenham um diferença: podem carregar ogivas atómicas.

E se uma destas armas estiver no ar em direcção a Moscovo, como Zelensky já disse que faria sem hesitar, os russos não têm como saber se carregam ogivas convencionais ou nucleares para um ataque inicial surpresa de decapitação do poder no Kremlin, que é, tal como na Casa Branca, o histórico receio entre as duas maiores superpotências atómicas planetárias.

Apesar desta subida de patamar na ameaça de Trump sobre Putin, o norte-americano, como aponta The Guardian, deixa em aberto a possibilidade de falar com o Presidente russo antes de permitir a Kiev o uso destas armas estratégicas contra a Federação Russa.

Como é evidente, ao condicionar o envio destes mísseis para a Ucrânia a uma cedência dos russos e a uma possível conversa prévia com Putin, Donald Trump está a usar a velha táctica de ameaçar usar a força mas esperar que essa mesam ameaça seja suficiente para a outra parte ceder...

Se esse é o plano, falhou, porque os russos não vão ceder nas suas condições para acabar com o conflito, que são conhecidas ao pormenor desde Julho de 2024, elencadas pelo próprio chefe do Kremlin, podendo escalar a fricção entre russos e norte-americanos para um nível "extremamente perigoso" como notou Dmitri Peskov.

Trump, em conversa com jornalistas no Domingo, disse que está a ser pressionado pelos ucranianos para lhes enviar estas armas, mas admitiu que pode antes falar com Putin e dizer-lhe que "se a guerra não for conduzida para as negociações, enviarei os Tomahawk para Kiev", ao mesmo tempo que admitia estar consciente de que se trataria de uma escalada grave.

Recorde-se (ver links em baixo) que Donald Trump tem vindo a alimentar este "filme" dos Tomahawk há semanas, tendo mesmo afirmado que antes de dar o passo decisivo para os fazer chegar a Kiev, poderia exigir algumas respostas dos ucranianos sobre os seus planos para os usarem contra os russos.

Enquanto isso, como relembra a russa RT, e o britânico Guardian, Putin já tinha desvalorizado o potencial de alteração da realidade da guerra na frente de combate mas enfatizado o seu potencial para terraplanar as conversações de retoma e normalização das relações entre russos e norte-americanos.

E tinha admitido que a Rússia, no caso de se confirmar, terá de dar "uma resposta à altura", nomeadamente a adequação dos seus sistemas de defesa anti-aérea, o que, segundo vários analistas, e até elementos da nomenclatura russa (ver aqui), começa a ser visto como uma demonstração de fraqueza de Moscovo face à escalada norte-americana na ameaça ao Kremlin.

Isto tudo, quando, provavelmente, como sublinhou já o analista militar major general Agostinho Costa, os EUA nem sequer ainda têm concluídos os testes para as plataformas terrestres de disparo dos Tomahawk, mísseis comummente de uso exclusivo da Marinha, em navios de superfície e submarinos.

Além disso, também a Reuters noticiou que o envio destas armas para a Ucrânia é "muito improvável" porque os Estados Unidos não possuem um stock alargado" e os que têm estão "comprometidos com as operações da Marinha" e enquadrados já em planos internos para outros cenários.

Mais confiante parece estar Volodymyr Zelensky, que acredita que Trump lhe vai oferecer os Tomahawk com os quais pretende, como o disse, "apagar Moscovo", como retaliação pelo "blackout" provocado pelos russos em Kiev, sublinhando estar empenhado em conseguir convencer o norte-americano a tomar a decisão final.

"Estou a trabalhar nisso e estou à espera do sim do Presidente Trump e, claro, contamos com esse desfecho, mas teremos de ver...", avançou Zelensky, citado pelos media ocidentais, aos quais acrescentou que, além dos mísseis de cruzeiro Tomahawk, aguarda ainda pela entrega de mais mísseis balísticos tácticos ATACMS.

Recorde-se que os Tomahawk são armas criadas nos idos de 1970, em plena guerra fria, e o uso adaptável entre arma convencional e nuclear é uma característica dessa época, como sucede igualmente com o míssil russo Iskander, com origem na década de 1980, podendo igualmente carregar uma ogiva atómica.

Sendo um míssil de cruzeiro, é substancialmente mais lento que a classe balística, mas tem maior manobrabilidade e assertividade para atingir os alvos, podendo, de acordo com os especialistas militares, ser mais facilmente abatido pelas anti-aéreas russas que os ATACMS, sendo que também estes já perderam eficácia no campo de batalha por essa razão.

O problema que se mantém e prolonga com os Tomahawk é resultado do seu uso múltiplo e ao entrar no espaço aéreo russo, sem que em Moscovo se conheça que ogiva carrega, se nuclear, se convencional, o que vão fazer os decisores em Moscovo?

Mesmo que seja altamente improvável que os EUA forneçam este tipo de misseis com cargas nucleares, como nota o norte-americano coronel Douglas McGregor, antigo conselheiro do Departamento da Defesa dos EUA, "as grandes potências não podem tomar decisões com base em percentagens de probabilidades", estão "obrigadas a agir de acordo com as suas doutrinas militares".

E tanto a doutrina russa como a norte-americana permitem respostas avassaladoras em casos de ataque iminente, como, de resto, ficou claro nas palavras do próprio Putin quando a Federação Russa, há pouco mais de dois anos, alterou a sua doutrina nuclear, conferindo-lhe maior flexibilidade...