2- Introdução
O tema inicial abordava Angola, enquanto possível potência Regional e a qualificação da diplomacia presidencialista angolana assenta nas sendas político-diplomáticas de 3 (três) dos 4 (quatro) Presidentes que, desde 1975, têm governado os destinos políticos e diplomáticos de Angola: António Agostinho Neto (mandato entre 1975 e 1979), José Eduardo dos Santos (1979-2017) e João Manuel Gonçalves Lourenço (2017-) optaram pelo tempo e por uma diplomacia externa próprios.
Entre o passamento físico de Neto (10 de Setembro de 1979) e a tomada de posse de Eduardo dos Santos (21 de Setembro de 1979) o país esteve sob uma presidência colegial liderado por Lúcio Lara, segundo uns, ou por Ambrósio Lukoki, segundo outros; na realidade a presidência era, de início, uma Tetrarquia (composta por Lúcio Lara apoiado por Pedro Maria Tonha «Pedalé», Ambrósio Lukoki e Pascoal Luvualo), a que se seguiu uma Pentarquia com entrada do, então, Major José Eduardo dos Santos - e que se manteve entre 11.Set.1979 e 20.Set.1979). A História e os historiadores ainda não conseguiram - ou não se entenderam conseguir - chegar a uma conclusão viável.
É este tipo de diplomacia externa, ainda que, como adiante se verá com algum impacto interno, que se procura descodificar e que, enquanto autor, houve a preocupação de dar uma identificação inédita, tão mais próxima possível da realidade, porque cada um dos Presidentes Angolanos teve uma visão político-diplomática própria que se foi qualificando ao longo dos 45 anos de poder maioritário do partido no poder, o Partido MPLA(1), de que, cada um deles, é igualmente, presidente.
Após a independência, Angola viu-se entre dois actores que dominavam a cena política global, os EUA e a União Soviética (URSS) e, com estes, a necessidade de, também, se ver perante menores potenciais players protagonistas que apoiavam cada uma das duas superpotências e, através destas, os contendores político-militares que se contendiam em Angola, m particular as que tinham como opositores os antigos movimentos emancipalistas..
Angola tornou-se, à época, no "perfeito palco africano do complexo jogo e xadrez das duas superpotências em África" (Almeida, 2011, 43-44) e, como afirmou Margareth Anstee, antiga representante especial do secretário-geral das Nações Unidas, em Angola, na perfeita "vítima da guerra-fria" (Almeida, 2011, 82 & Moreira, 1992).
Na realidade, estas contendas, entre os 3 movimentos emancipalistas angolanos - FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola), MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola) e UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) -, não começaram após a independência, mas bem antes da mesma e nela tanto se digladiavam entre si, como entre o MPLA e a coligação FNLA/UNITA (Almeida, 2010, Almeida, 2011, 42, Gourgel, 2000, 16 & Cardoso, 2001)
Com o domínio político e o acolhimento e o reconhecimento político de muitos países, alguns até da chamada área ocidental - aqui de registar que o Brasil foi o primeiro país a reconhecer a República Popular de Angola (RPA) declarada em 11 de Novembro de 1975, em Luanda, imediatamente antes de Cuba e da República Popular do Congo (Congo-Brazza) -, mas com particular incidência junto dos países da chamada "via socialista" e dos Não-Alinhados ou países dos 3 A (África, América Latina e Ásia), o Governo imposto pelo MPLA e a "sua República" tiveram de procurar cimentar esta em África assente na célebre frase de António Agostinho Neto "Angola é e sempre será por vontade própria, a trincheira firme da revolução em África" (Neto, 1985).
A RPA era apoiada por menos de metade dos Estados Africanos, dado que uma parte, cerca de uma dezena, apoiou a declaração unilateral de independência proferida pela UNITA e FNLA (Almeida, 2010), enquanto a restante, talvez a maioria dos Estado africanos, agregados na então OUA, tal como a maioria dos países Ocidentais, incluindo Portugal, a antiga potência colonial, optaram por, somente, reconhecer a independência de Angola, sem apoiarem qualquer uma das facções em presença nos teatros políticos e operacionais angolanos.
3. Angola e a diplomacia de proximidade
Como já foi referido anteriormente Angola só teve, e tem até ao presente, ao longo dos 45 anos de independência, 3 presidentes, Agostinho Neto, Eduardo dos Santos e João Lourenço e, cada um, ainda que sempre sob as linhas mestras determinadas pelos diferentes Congresso do partido que, igualmente, lideram, têm mostrado independência suficiente, para cada um e de per si, determinar a linha político-diplomática por que enveredaram aos longo dos seus mandatos.
Face a isso qualificou-se as respectivas linhas político-diplomáticas como segue:
? A diplomacia "revolucionária" de António Agostinho Neto
? A diplomacia "collation" de José Eduardo dos Santos
? A diplomacia "give-and-take" de João Lourenço
Define-se, previamente, como caracterizei cada uma das últimas definições: Collation ou cotejo (confrontação) e capacidade de colectar apoios fornecidos; já Give-and-take é, ou pode ser definido como, a capacidade de fazer compromissos, de conseguir fazer e obter concessões mútuas, através da acção ou processo de consultas e, ou, discussão formal com seus pares,
3.1. A diplomacia "revolucionária" de Agostinho Neto
Sem luta armada não existe vigor na luta de libertação.
E, do nosso ponto de vista, é preciso intensificar imediatamente o apoio à luta de libertação do povo da África do Sul, porque o povo deste país irmão é daqueles que mais tem sofrido a humilhação provocada pela segregação social, política, de classe e racial.
(Neto, 1985)
Ao longo do seu mandato, tornou-se evidente que a vontade político-diplomática de Agostinho Neto visava em afirmar a RPA no contexto das Nações, assente no princípio de que Angola seria um pilar da solidariedade revolucionária em África, no desmembramento da "união UNITA-FNLA" e da proximidade da UNITA às forças sul-africanas (políticas e militares) do apartheid, o que, na sua percepção, permitiram que a recém-diplomacia de Luanda, se fortalecesse e se tornasse num dos principais factores para alavancar Angola no contexto internacional.
Se "Angola é e sempre será por vontade própria, a trincheira firme da revolução em África" foi o principal mote para a diplomacia de Neto - esta frase tanto serviu de divisa para as futuras relações externas de Angola, assentes no princípio do revolucionarismo global -, também procurava afirmar, internamente, que Angola seria sempre um país onde a solidariedade africana seria o princípio geral da governabilidade e das políticas do consulado de Agostinho Neto.
As principais linhas de força da diplomacia de Neto assentaram, ao longo do seu relativo curto consulado (1975-1979, na consolidação da RPA no concerto das Nações, principalmente com as repúblicas de cariz socialista - estas, em grande parte, cimentadas quer devido ao relativo ostracismo que o Ocidente se perfilou perante a declaração "unilateral" das duas Repúblicas (Almeida, 55-59) e que se afirmaram com a crise interna do denominada "Processo 270577" (Michel, 2007) -, com os não-alinhados, e, principalmente, junto dos Estados Africanos mais "revolucionários" ou cuja governação assentava na matiz político-governativa soviética.
Com a morte de Agostinho Neto e a ascensão de Eduardo dos Santos à frente da direcção do partido e do Governo de Angola desde 1979 e até ao fim da guerra fratricida em Angola, em 2002, a diplomacia angolana teve um maior e mais forte estímulo.
Continua...
*Investigador Integrado do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL (CEI-IUL) e Investigador-Associado do CINAMIL e Pós-Doutorado da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**
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