Relativamente às sociedades anónimas, a Lei das Sociedades Comerciais estabelece que, salvo o estatuto da empresa comercial o proibir, o Conselho de Administração pode delegar num ou mais administradores ou numa Comissão-Executiva a gestão corrente da empresa comercial. Se se optar pela delegação de poderes a uma Comissão-Executiva (CE), o Conselho de Administração deverá (deve) definir a composição e o modo de funcionamento da CE. Saliente-se que a delegação de competências não exclui (nem impede) o Conselho de Administração para deliberar sobre os assuntos delegados e não significa que os administradores-executivos não possam participar do Conselho de Administração.

Cabe notar, ainda, que a Lei das Sociedades Comerciais - contrariamente, por exemplo, ao que determina o Código das Sociedades Comerciais portuguesa - nada diz sobre a figura do presidente da Comissão-Executiva (PCE ou CEO). É omissa. Talvez, por isso, tivemos e ainda temos várias sociedades anónimas cujo presidente do Conselho de Administração (PCA ou Chairman) é, igualmente, o presidente da Comissão-Executiva (PCE ou CEO). Contudo, o artigo 426.º da Lei das Sociedades Comerciais parece obstar a cumulação de funções de PCA e de PCE na mesma pessoa e na mesma empresa. E porquê?

A norma diz - claramente - que havendo delegação de poderes, "os restantes administradores são responsáveis, perante a sociedade [comercial], pelo controlo da actuação dos administradores-delegados e da comissão-executiva, assim como pelos prejuízos causados pelos seus actos ou omissões, quando tenho conhecimento deles, não tomarem a iniciativa de promover a intervenção do Conselho de Administração para este tomar as medidas convenientes".

Os restantes administradores - isto é, os não-executivos - constituirão o Conselho de Administração, os quais serão os responsáveis, perante a sociedade, pelo controlo da actuação dos administradores que integram a Comissão-Executiva. Estarão, portanto, vinculados ao dever legal de controlar os actos de gestão dos administradores-executivos, devendo, sempre que tais actos se revelarem prejudiciais aos interesses da empresa, intervirem para os corrigir ou suspender imediatamente.

Parece resultar da letra e do espírito dessa norma que o membro do Conselho de Administração - administrador não-executivo - não pode ser, simultaneamente, membro da Comissão-Executiva - administrador-executivo. Se assim é, então, por maioria de razão, o presidente do Conselho de Administração - que tem o dever legal de controlar, avaliar e medir o desempenho dos administradores-executivos - não poderá ser, igualmente, o presidente da Comissão-Executiva.

Contudo, há correntes que defendem a cumulação de funções por questão de liderança. Para o efeito, alegam que a separação prejudica a tomada de decisão, cria um ambiente confuso para empresa, na medida em que os trabalhadores ficam sem saber a quem seguir as instruções, o que resultaria num caos. Portanto, enfraquece a liderança.

Não obstante a tese em questão, é inegável que a cumulação eleva o PCA à condição de «árbitro e jogador ao mesmo tempo». E numa realidade com incipiente ou inexistente responsabilização dos administradores, como a nossa, a mesma revelar-se-á prejudicial, visto que, tende a gerar (i) concentração de poderes os quais comprometem a transparência na gestão, (ii) prejudica o efectivo dever legal de controlo e de vigilância do Conselho de Administração sobre a Comissão-Executiva Executiva, (ii) origina conflito de interesses, (iii) custos de ineficiência no exercício de qualquer uma das funções e (iv) lesa, no longo prazo, os interesses da sociedade, dos sócios, credores e dos trabalhadores.

Por outras palavras, a separação de funções de PCA e de PCE gera maior autonomia ao CA para definição de estratégias para a empresa, um melhor monitoramento da gestão, da evolução económico-financeira e dos seus resultados, e permite um melhor distanciamento das decisões dos administradores-executivos. Ora, existindo uma forte inclinação por uma liderança concentrada, a opção pela disrupção da gestão da empresa não é a solução mais indicada. Pelo contrário, defendemos - em conformidade com as boas práticas de corporate governance - que o PCA não pode ser, na mesma empresa, o PCE.