Sendo as unanimidades geralmente estúpidas, o que aconteceu, naturalmente, foram opiniões díspares em relação ao "caso". Curiosamente, houve mais gente a verberar que a aprovar a inclusão de Eduardo Mingas na convocatória do seleccionador nacional, o espanhol Josep "Pep" Clarós. A lista dos "comentadores do contra" é longa, vencendo quase por KO a dos defensores da chamada do atleta.

Os fundamentos para a reprovação são maioritariamente coincidentes. Estribam-se essencialmente num elemento: a idade do jogador, que caminha para os 43 anos. Sequer levam em consideração que o homem está há quase duas décadas na Selecção Nacional e é dos mais galardoados do País, contando quatro títulos do "Afrobasket" e dois da Taça dos Clubes Campeões Africanos, o que quer dizer muita experiência. Para a maioria, deveria ser o fim da linha para Eduardo Mingas e... ponto final.

Para contestar a convocatória de Eduardo Mingas, uns alegam que está na hora da renovação. Outros dizem que, não tendo Angola possibilidades de se apurar para o torneio Olímpico de Tóquio neste próximo Verão, o ideal seria meter jovens na Selecção, de modo a moldá-los já para futuros compromissos. Há ainda quem argumente que, tendo perdido algumas qualidades em função da idade, o jogador só vai conjugar o verbo encher.

Todos os argumentos e mais alguns foram esgrimidos para justificar a exclusão de Eduardo Mingas da Selecção Nacional. Outro desses argumentos é o facto de supostamente constar da lista de dispensas do 1.º de Agosto, agora treinado por José Carlos Guimarães. Oficialmente, entretanto, o clube "rubro-negro" ainda não se desfez do jogador.

Os poucos que partilham da opinião do técnico espanhol dizem que rejuvenescimento é nos clubes e que a Selecção tem de ser integrada pelos melhores do momento. Para sustentar a tese, deram o exemplo de Jean-Jacques da Conceição, Miguel Lutonda e Palmira Barbosa, que passaram da casa dos 40 anos e continuaram a competir ao mais alto nível. Defendem, igualmente, que a convocatória de Eduardo Mingas deve levar os jovens jogadores a reflectirem profundamente sobre o que andam a fazer. Porque, convenhamos, não é normal um indivíduo de 42 anos ultrapassar (e não é pela direita!) garotos com idade de serem filhos dele. Decididamente não é normal, até porque as leis da natureza funcionam para todos.

A convocatória de Eduardo Mingas, segundo o treinador, é um sinal de "respeito e consideração" pelo trabalho do jogador. Por outras palavras, Josep Clarós entende que o atleta ainda é útil à Selecção Nacional, independentemente da idade. O espanhol julga que, para os princípios e o modelo de jogo que pretende implementar, Mingas cabe perfeitamente no esquema táctico, além de ser elemento fundamental no balneário. Pep, toda a gente sabe, é um técnico bastante qualificado, procedente de um país que é o maior do mundo, à excepção dos EUA, em matéria de basquetebol. O seleccionador nacional é "só" alguém que treinou o "histórico" Juventut Badalona, da principal divisão espanhola, além de ter passado pelo basquetebol universitário americano. Logo, é um catedrático em basquetebol ao lado de qualquer "treinador de bancada".

Experiente e com uma folha de serviços recheada, Pep seguramente ter-se-á apoiado nas estatísticas dos jogadores para convocar a equipa, além, obviamente, de haver observado inúmeros vídeos. De resto, nos tempos modernos, para qualquer convocatória, os técnicos raramente precisam de partir a cabeça. Baseiam-se nas estatísticas e têm o problema resolvido. Assim, à luz da análise feita aos números e aos vídeos, além de jogos vistos in situ, achou que não havia jovens em condições de substituí-lo.

Ao que se diz, Eduardo Mingas será eventualmente o jogador mais forte no que a ciência do desporto convencionou chamar "treino invisível". Exigente consigo mesmo, cumpre rigorosamente os pressupostos que podem fazer de alguém atleta de alto rendimento. Extremamente cuidadoso com a alimentação, recorre a especialistas sempre que a situação obriga, cumpre as horas de sono para a completa recuperação e bebidas alcoólicas... nem pensar. Provavelmente será isto o que está a tornar o atleta quase inoxidável, ao contrário de jovens cujo estilo de vida é exactamente o oposto. Essa pode ser uma das razões por que o quase-ancião continua rijo da silva e a pedir meças a gente bem mais nova de idade.

O problema não tem apenas que ver com a qualidade do "treino invisível" de Eduardo Mingas. O buraco é bem mais fundo. Tão profundo, que não será resolvido só com a presença de nomes sonantes como os dos técnicos José Neto ou Pep Clarós. A convocatória que gerou controvérsia é, no fundo, o reflexo da qualidade do trabalho que está a ser feito nos clubes. Hoje não se labuta globalmente com a competência das décadas de 1980 e 1990. À época, de um trabalho de profundidade, baseado no biótipo do jogador angolano, emanou a filosofia do basquetebol angolano. A mesma que levou o País à carrada de títulos conquistados, tanto a nível de Selecções como de clube. E Eduardo Mingas é fruto desse trabalho. Os 19 pontos de diferença na derrota do Petro face ao Zamalek na BAL dizem muita coisa.

É óbvio que, em pleno século XXI, o jogo evoluiu imenso e quase tudo feito há 15/20 anos está desactualizado. Hoje é obrigatório trabalhar de outra forma, ajustando-se às cambiantes do jogo, sempre se adaptando à morfologia do atleta angolano. Se não houver essa capacidade na maioria dos clubes - desafortunadamente continuam a trabalhar como em 1995 ou 2000 -, o buraco vai cavar-se cada vez mais e daqui a uns anos os títulos conquistados no passado serão apenas lembranças remotas. Por alguma razão, aliás, depois de Carlos Morais, Angola não produziu mais nenhuma verdadeira "estrela" - nestas contas não entram por razões óbvias os que evoluem nos EUA. E note-se que o "eterno n.º 6" da Selecção Nacional já está próximo dos 36 anos de idade!

Portanto, não nos parece que o problema seja do técnico. O problema está mais abaixo. No fundo no buraco.