1. Havemos de Voltar com o professor de História na pessoa do autor. No seu texto de apresentação, o Sérgio diz que gosta de ler história e também indica a experiência do jornalismo como razões dos textos deste livro. O Sérgio, mesmo não exercendo na sala de aulas, há anos que efectiva o magistério no ideal amplo da realização da educação. Ele compreendeu que a educação não se resume à escolarização. A educação, como processo de apropriação da cultura de uma civilização, é efectivada nas múltiplas estruturas materiais e imateriais constituintes de uma ordem social. A volta do professor de História no muntu do Sérgio é o natural manifesto da assunção do seu papel social de, Senhor Professor.
2. Convocamos, outro Havemos de Voltar, isto é, o recurso aos nossos métodos de ensino. Como na tradição dos griots, o contar de estórias e da história é um aliado útil à formação de consciência das pessoas sobre os princípios da realização do muntu. O Sérgio conta-nos uma história no texto escrito enriquecida com os textos de imagem. De modo resumido, ele educa-nos sobre os reais sentidos do aprendizado ao longo da vida. Na nossa tradição, é o valor qualitativo do aprendizado ao longo da vida que engrandece a sabedoria dos mais velhos. Ao não editar os textos dos seus anos da iniciação, aprendemos todos que o aprendizado contínuo e o trabalho árduo, a qualidade do nosso trabalho e da nossa contribuição são uma construção na linha do tempo, e não de uma conquista pontual. É uma pena que os autores do discurso oficial dos 50 anos da República não tomaram contacto com esta lição antes. Teriam poupado os cidadãos do habitual relatório estatístico que nega as sinalizações das realidades. Sérgio, cá entre nós, a tua pobreza criativa só não prejudicou a tua carreira porque também o nosso cenário era mesmo pobre. Foste salvo pelos que se foram em 1975, no 27 de Maio, e pela pobreza dos técnicos dos que "queriam assumir as instituições". Há mesmo mal que vem para bem!
3. Também temos o Havemos de Voltar do sistema de discursos na nossa ancestralidade. Aprendi com o meu mano Abreu, que estuda essas coisas de provérbios, ao contrário do sentido redutor que lhes foi emprestado pelo olhar colonial, os provérbios são os nossos sistemas de formulação teórico-conceitual. Isto é, a inscrição da nossa visão do mundo é pelo provérbio. Os provérbios actuam como base da circulação dos nossos saberes. Numa versão paralela ao Sona ou aos textos de panela, o Sérgio usa o Texto-Desenho (Imagem) que, ao usar elementos visuais (linhas, formas, cores), cria representações, perseguindo a função de descrever, ilustrar, emocionar, representar conceitos de forma imediata. A Interpretação, por sua vez, é feita via a percepção visual e da associação de significados. Por isso, o cartoon não é somente um artefacto para arrancar gargalhada em pessoas sofridas que riem das suas desgraças. É, acima de tudo, uma linguagem que nos ajuda a construir sentidos sobre as realidades; "nas calmas", apesar de ser um ""mambu rijo" que resulta num "trabalho grande".
4. Havemos de Voltar aos métodos de ensino da nossa história. Não sei a origem desta abordagem metodológica de se ensinar datas como os elementos explicativos da história, em oposição aos factos e suas associações. O centro para a reflexão reside nos factos históricos como objecto de estudo e não nas simples datas. Num golpe de génio, o Sérgio "zera o game" sobre o real valor do labor militar das guerrilhas no derrube do regime colonial de Portugal. Como ler textos longos custa cada vez mais nas sociedades dos fast, a sequência dos textos de imagem sobre os nossos reivindicados heróis da luta, falo em luta, e não das ideias de libertação; ilustra um lado a considerar na verdade sobre a qualidade dos tiros para a independência. Oh Sérgio! Mexer mesmo assim no sistema de heróis dos outros.
5. E, então, Havemos de Voltar no ideal sobre o que as meninas e os meninos devem aprender à volta da fogueira. O prefácio e o epílogo ditam com mestria a resposta do questionamento onde foi que falhamos, para os kotas; e também do questionamento dos ndengues sobre a espécie de libertadores que nos calharam! Qual é o PENSAR destes libertadores que turbina o seu AGIR ? A ilustração de novos colonos e de piratas para o poder como tesouro a conquistar nestes 50 anos é uma rica sugestão sobre o verdadeiro reflexo no espelho.

6. Então, QUE País reivindica o Sérgio? Os textos são claros. É um país que garanta a paz para os seus. Mas, atenção, o texto explora o ideal da paz no sentido positivo, isto é, o fim dos tiros não é a garantia da paz. A paz é a remoção das estruturas materiais e imateriais geradoras da violência. O que é então violência? Tudo que condiciona o gozo dos DIREITOS e das LIBERDADES do muntu Angolano. O inventário dos 50 anos de cada um de nós tem, agora, um aliado, esse catálogo de evidências em forma de provérbios.