Nesta edição, o NJ preparou um dossier para assinalar estes dois anos de conflito. Bom seria que, no próximo ano, não tivéssemos necessidades de abordar este ou outro qualquer conflito. A entrevista do embaixador da Rússia em Angola, Vladimir Tararov, aborda não só a questão do conflito com a Ucrânia, mas também a situação da visão, cooperação e alinhamento estratégico de Angola com os novos parceiros. É importante perceber como Moscovo procura adaptar-se ao novo cenário em Angola e como olha para a "paixão americana" de João Lourenço. Deu para perceber que os russos olham com muita atenção para esta penetração em força dos americanos no nosso território. Em quatro meses, tivemos dois secretários de Estado dos EUA a visitar o País e João Lourenço na Casa Branca.

Angola passou a ser um "campo de batalha" entre os americanos, russos e chineses. Para além da luta de influência política, militar e estratégica, parece que a guerra, a nível da inteligência, começou também. William Joseph Burns, director da CIA, esteve em Angola em Janeiro e efectuou contactos com directores de instituições homólogas e com membros do corpo diplomático de países ocidentais. Uma fonte avançou-nos que também terá estado na Cidade Alta. Os chineses seguem pacientes e há seis meses que andam sem um embaixador no território angolano. A conhecida paciência do chinês e o "kilapi" que Angola tem com eles fazem esses asiáticos estarem seguros de que Angola irá lá ter.

Angola será um palco não só de movimentação de negócios e investimentos, mas também de diferentes serviços de inteligência, de uma maior exposição de Angola e de vulnerabilidade. William Burns e a sua equipa estiveram no terreno e perceberam que ainda há aqui muito trabalho de casa por fazer. Os americanos vão dar e também vão exigir. Já vão exigindo maior abertura política, mais transparência e justiça no combate à corrupção, mais liberdade de imprensa, vão escrutinar mais. Também têm uma particularidade: eles gostam de dominar e só se permitem estar em posição de vantagem e onde podem impor. João Lourenço tem de fazer compreender os seus camaradas e os círculos castrenses deste novo alinhamento com os EUA. Existe ainda certa resistência em meios políticos, diplomáticos e castrenses em relação à "paixão americana" que João Lourenço arranjou. Parece que só ele sabe bem os contornos desse novo alinhamento.

Os EUA escolheram Kinshasa num movimento que tem Luanda por detrás. Estamos na fase boa do "namoro", mas pode chegar o dia em que se vai exigir alternâncias ou os americanos decidem-se a trocar de parceiro como já fizeram com Mobutu, Savimbi e até agora com Paul Kagame. Esse pode ser o chamado lado mau da coisa boa. Vamos ver no que vai dar.