O agricultor Pedro Liberal, que explora 17 hectares, foi um dos primeiros a lamentar-se ao Novo Jornal, que esteve nesta comuna, que, com uma extensão territorial de 2.177,2 quilómetros quadrados, tem uma população estimada em 41.434 habitantes distribuídos por sete povoações, 13 bairros e 12 aldeias, sendo que a maioria se dedica à agricultura e à pecuária.
"Já estávamos a respirar de alívio com o surgimento das chuvas e a diminuição da praga de lagarta. Agora recebemos um novo visitante que se chama praga de gafanhotos", disse o agricultor ao Novo Jornal.
"Temos de rezar a Deus que os técnicos da agricultura consigam controlar esta praga que ameaça não só a nossa comuna, como também outras regiões da província", acrescentou Pedro Liberal, frisando que a população tem vindo a perceber que "a deslocação de gafanhotos é influenciada pela direcção dos ventos e a ocorrência de altas temperaturas".
Segundo as autoridades locais, o fenómeno foi identificado no Cuio e em Dombe Grande (município da Baía Farta) e no vale do Cavaco, cintura verde da cidade de Benguela.
Segundo apurou o Novo Jornal, neste momento, foram já distribuídos meios, cedidos pelo governo da província, nomeadamente insecticidas, pulverizadores e atomizadores, aos agricultores.
Para este oficial reformado das Forças Armadas Angolanas (FAA) e antigo funcionário da Televisão Popular de Angola (TPA), o surgimento desta praga ameaça a segurança alimentar na província.
"O êxito das acções de combate à pobreza passa pela baixa do preço dos equipamentos e meios agrícolas, com realce para os fertilizantes, no sentido de se reforçar a capacidade produtiva dos camponeses. Agora, com a praga a devastar as plantações na comuna, e o saco de adubo a custar 25 mil Kwanzas, evidentemente vamos ter sérios problemas alimentares", disse, defendendo que a redução do preço dos fertilizantes, além de aumentar a produção, ajudaria a elevar a segurança alimentar das famílias.
A comuna de Dombe Grande é uma das principais regiões produtoras de tomate na província de Benguela, mas Pedro Liberal lembrou que os camponeses precisam de apoios financeiros para poderem passar da subsistência à produção de excedentes.
"As autoridades competentes devem trabalhar com as cooperativas para que estas consigam obter financiamento agrícola junto dos bancos. Se assim acontecer, teremos os problemas alimentares resolvidos aqui na nossa comuna", disse.
Angola, Namíbia, RDC e Zâmbia estão a unir esforços para combater estes insectos com insecticidas pulverizados a partir do ar
As pragas de gafanhotos têm vindo a alastrar no País. Esta ameaça, vinda de países vizinhos, como o norte da Namíbia, e, pelo leste, da Zâmbia, composta por enxames de gafanhotos com centenas de milhares de insectos, tem destruído hectares de culturas de massango, massambala e milho no Cunene e no Kuando Kubango.
Recorde-se que, para fazer face a este problema, como o Novo Jornal noticiou a 09 de Março, Angola, Namíbia, RDC e Zâmbia estão a unir esforços para combater estes insectos que têm um poder gigantesco de destruição de culturas essenciais para a sobrevivência das comunidades por onde passam, como é disso exemplo o que ocorreu na África Oriental, nos últimos três anos.
Face a esta situação, os quatro países, de forma a evitar uma grave crise alimentar, que se vem juntar aos estragos gerados pela prolongada seca, em conjunto com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), estão a criar condições para uma pulverização com insecticidas a partir do ar para controlar o avanço desta praga.
É sabido, pela experiência adquirida noutras regiões de África e da Ásia, onde este problema ocorre com mais frequência, que sem meios aéreos para espalhar insecticidas directamente sobre os insectos, este problema não pode ser combatido eficazmente.
E a ameaça tende, vaga após vaga, a crescer, porque os insectos, tendo alimentos disponíveis, que é quase tudo que seja verdura, se multiplicam a uma velocidade impossível de controlar sem o devido controlo químico, podendo os enxames atingir milhões de indivíduos, que, à medida que avançam, deixam larvas pelo caminho, que são futuras pragas e em cada vez maior número e capacidade devastadora.
Foi o que sucedeu a partir de 2018, na África Oriental, quando alguns milhares de gafanhotos do deserto foram arrastados pelos ventos do deserto arábico, e começaram a reproduzir-se com fúria no continente africano, ameaçando de fome mais de 20 milhões de pessoas, onde o problema anda não está totalmente debelado.
Os países mais afectados foram o Quénia, a Somália, a Etiópia, tendo mesmo chegado à região dos Grandes Lagos, como o Uganda e o Burundi, descendo depois pela Tanzânia, no caminho destes enxames, nalguns casos atingindo os 150 milhões de gafanhotos.
E este tipo de ameaça existe agora nesta região da África Austral, abrangendo o sul de Angola, o norte das Namíbia e, para leste e nordeste, a Zâmbia e a RDC, onde o problema poderá ganhar outra dimensão se nada for feito para conter a expansão dos enxames.