São mais de 20 mil os clientes que diariamente frequentam a Cidade da China, um conglomerado de estabelecimentos comercias, no município de Viana, província de Luanda, e não há registo de que a epidemia que surgiu na cidade chinesa de Wuhan em Dezembro de 2019, com mais de mil mortos e mais de 40 mil infecções em todo o mundo, esteja a afectar o dia-a-dia deste gigantesco centro comercial chinês, mas também libanês, guineense...

"O medo de coronavírus não fez com que a população deixe de entrar na Cidade da China. Todos os clientes que frequentam este espaço comercial estão informados sobre o perigo que representa o coronavírus", disse ao NJOnline Helena Xiang, gerente do recinto, com mais de 300 lojas, armazéns, onde se encontram desde materiais de construção ao mobiliário, viaturas, roupa, bens alimentares... e ainda uma zona residencial com 29 prédios.

Segundo a gerente da "Chinatown" angolana, as medidas tomadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelas autoridades do Ministério da Saúde de Angola a respeito do coronavírus, são acatadas com rigor em todo o espaço.

De acordo com Helena Xiang, desde que o Governo anunciou ter imposto a obrigatoriedade de quarentena para todos os passageiros provenientes da China, os chineses que têm estabelecimentos na Cidade da China e que ainda não regressaram a Angola foram já informados sobre as medidas tomadas.

A gerente lembrou que o seu País está a multiplicar as medidas para conter a epidemia de coronavírus, mas, como o NJOnline percebeu, neste vasto espaço comercial nem todos os comerciantes chineses, libaneses, guineenses ou mauritanos, entre outras nacionalidades, usam máscaras para a prevenção do coronavírus, porque essa medida ainda não é, como é na China, obrigatória em Angola, e não há casos conhecidos.

"As máscaras é para prevenir a contaminação contra o coronavírus, mas aqui nem todos usam. Conforme já informei, não há informações da existência de casos e não há um problema local sobre a epidemia. Tudo corre bem", tranquilizou, frisando que a epidemia não está a causar quebras nas vendas na Cidade da China.

Helena Xiang recorda que o único caso suspeito de Coronavírus em Angola de um cidadão de nacionalidade chinesa acabou por não se confirmar e, desde então, não foi noticiado qualquer caso.

"Pelas informações das autoridades sanitárias, este cidadão não tem coronavírus, de acordo com o resultado da análise efectuada na África do Sul, e não surgiu mais nenhum caso suspeito", recordou.

Ganhar dinheiro a informar quais os sintomas da doença

Matamba Sebastião é um jovem recém-formado em medicina que está sem emprego e com mais dois amigos ficam à frente do portão da Cidade da China informando os interessados sobre os sintomas da doença.

"Para não ficar parado em casa, venho a este centro comercial diariamente para tentar conseguir alguma coisa", disse o jovem, lamentando a herança maldita que o desemprego é para os jovens.

"Eu e os meus amigos cobramos 50 Kwanzas para uma informação sobre os sintomas de coronavírus", disse Matamba Sebastião frisando que há dias em que podem ganhar três mil Kwanzas.

"As mais interessadas são as senhoras. E fazemos isso para ajudar as pessoas. Na entrada principal da Cidade da China há um aviso sobre as doença e as pessoas querem saber mais informações e a gente informa", acrescentou.

A normalidade é visível

Armando Neto é empregado numa das lojas na Cidade de China e contou que, apesar das notícias sobre esta epidemia de coronavírus, o seu estabelecimento recebe diariamente muitos clientes.

"Estamos a vender bem mais do que no ano passado. Esperamos que o movimento de pessoas aumente cada dia que passa", informou, acrescentando, todavia, que, quando deixa o local de trabalho e chega a casa, primeiro toma banho antes de saudar os filhos.

"É melhor prevenir do que remediar. Não podemos ignorar o perigo do coronavírus. Atendemos muita gente entre angolanos e estrangeiros e é preciso muita cautela", observou.

A Cidade da China é um dos centros comerciais mais movimentadas de Luanda, onde os preços dos produtos são considerados muito competitivos e, por isso, mais de 20 mil pessoas em média atravessa os enormes portões da "Chinatown" luandense.

"Materiais de construção e decoração, artigos para o lar, acessórios de viaturas, roupa (...) calçado e brindes são aqui adquiridos a preços baixos em relação a outros mercados no centro da cidade de Luanda", disse ao NJonline Fausto Pedro, funcionário público que frequenta a Cidade da China sempre que precisa de comprar qualquer coisa a bom preço.

O negócio de roupas usadas de origem chinesa tem muita procura devido aos preços mais competitivos.

"Esta é a cidade para nós os pobres", avaliou Antónia dos Santos que veio da província do Bié para fazer compras especificamente neste local.

"O segredo para adquirir um bom fardo de roupa é dar uma gasosa aos trabalhadores que conhecem bem os sacos", acrescenta, frisando que a roupa usada vinda do ocidente é mais cara, havendo fardos que podem custar 200 mil Kwanzas.

Mas as preocupações não são escondidas

A notícia sobre a epidemia de coronavírus preocupou o desempregado Raul Kima, que tem a Cidade da China como seu local para ganhar pão através dos múltiplos biscates que ali faz.

"Ficámos muito preocupados quando fomos informados sobre a doença. Pensávamos que como aqui trabalham muitos chineses, a Cidade da China podia encerrar as portas ", disse.

Raul Kima está mais tranquilo quando vê diariamente milhares de pessoas frequentarem a Cidade da China.

"Quando é um bom dia, nos trabalhos que faço ganho entre 10 e 15 mil Kwanzas. Fechando este centro comercial seria um desastre para nós, num País onde não existem empregos", notou.

Entretanto, notícias oriundas da China, apontam para um crescimento vertiginoso do número de mortos e infecções confirmadas em laboratório, com 242 falecimentos em apenas 24 horas, na quarta-feira,o que leva o total para os 1.350, ao que acresce um recorde de mais de 14 mil contágios registados, no mesmo perídio, o que contrasta com os cerca de 2.000 no dia anterior, terça-feira, fazendo com que esta lista tenha aumenta de cerca de 45 mil para os 60 mil.

Estes números, como reflectem todos os analistas ouvidos pelos media internacionais, denotam um claro aumento da crise, e da sua perigosidade, gerada pelo coronavírus, oficialmente denominado Covid-19 pela Organização Mundial de Saúde, para a China e para o resto do mundo, onde o número de casos não tem parado de aumentar também.

Esta epidemia foi detectada pela primeira vez na cidade chinesa de Wuhan em Dezembro e, desde então, a sua progressão tem sido significativa.

Uma vacina ou outro tipo de tratamento eficaz é esperado pela OMS apenas para finais de 2021, sendo, por isso, a sua detecção precoce a melhor arma para combater a doença.

O Covid-19 no mundo

Em todo o mundo, nos cerca de 30 países já inseridos neste mapa trágico, estão confirmados quase 400 casos e foram registadas pelo menos duas mortes, sendo que o continente africano é ainda o único onde não estão confirmados casos de infecção, embora em vários países, como Angola, já foram despistados casos suspeitos.

Como recomendado pela OMS, o Ministério da Saúde angolano adaptou um hospital da Barra do Kwanza para acolher as pessoas oriundas da China, especialmente das regiões mais afectadas, para um período de quarentena de 14 dias, no mínimo, como forma de manter sob controlo um eventual caso e evitar que este se transforme em vários devido à enorme contagiosidade do Covid-19.

Para evitar que esta epidemia chegue ao continente africano, a OMS declarou 13 países como de intervenção prioritária, sendo Angola um deles, para onde foram enviados já kits que permitem a detecção precoce de quaisquer casos, sendo que essa detecção célere é a melhor forma de impedir o alastramento do vírus, especialmente porque são países com fortes comunidades chinesas, com débeis sistemas nacionais de saúde e com áreas urbanas com milhões de pessoas a viverem em fracas condições sanitárias.

Enquanto isso, em Genebra, os especialistas convocados pela OMS defenderam a produção de uma vacina o mais rapidamente possível ou procurar oura metodologia apropriada para a procura de um medicamento eficaz, embora isso só vá ser possível dentro de 18 meses.

E, como têm alertado alguns especialistas, em cima da mesa das principais preocupações está o facto deste coronavírus se distinguir dos demais já conhecidos, como o que provocou o SARS em 2002/2003, cujo número de mortos e vítimas totais já foi largamente ultrapassado por esta epidemia, por possuir a capacidade de transmissão na fase assintomática do paciente - sem sintomas visíveis - e por permitir que muitas das suas vítimas se mantenham sem sintomas durante toda a fase da infecção, mantendo, todavia, a capacidade de contágio activa.

O vírus em Angola

A par das medidas em curso aplicadas pelo Ministério da Saúde, como o controlo à chegada nas várias fronteiras do país, é a comunidade chinesa em Angola que está a aplicar as medidas mais dramáticas, como explicou o seu embaixador, Gong Tao, em Luanda.

Evitar as viagens de e para a China e a redução da mobilidade interna são algumas das medidas auto-impostas pela comunidade chinesa em Angola de forma a contribuir para o combate global em curso contra o coronavírus.

Segundo o embaixador chinês em Angola, Gong Tao, em conferência de imprensa na passada semana, estas medidas que estão a ser seguidas pelos membros da comunidade chinesa em Angola, que ultrapassa os 250 mil, são voluntárias, porque, apesar de ter lançado um alerta internacional de saúde pública, a Organização Mundial de Saúde (OMS) não proibiu a movimentação de pessoas e bens.

Isso está a ser realidade também junto daqueles que se deslocaram por estes dias à China para comemorar junto das suas famílias o Ano Novo Lunar, a maior festa chinesa, e estão a retardar o regresso no âmbito das medidas preventivas consideradas adequadas.

Os que regressaram há poucos dias, para evitar quaisquer riscos, estão a proceder ao auto-isolamento.

O diplomata chinês, em conferência de imprensa realizada na sexta-feira em Luanda, admitiu que o vírus de Wuhan vai ter um impacto negativo nas relações económicas entre os dois países, mas notou que o mais importante é estancar esta pandemia porque os negócios podem esperar, "têm tempo".

Tao disse que a embaixada tem estado em permanente contacto com as autoridades angolanas, partilhando informações e cooperando no que diz respeito à assistência sanitária.

A embaixada está "muito atenta" no que diz respeito à comunidade chinesa, monitorizando a situação, sublinhando que para a representação diplomática de Pequim em Luanda, a saúde do povo angolano é tão importante como a do povo chinês.

Mas o Governo angolano procedeu nas últimas horas a algumas medidas mais intensas, como a quarentena obrigatória para todos aqueles que cheguem ao país oriundos de regiões chinesas mais expostas à doença, como a província de Hubei e a sua capital, Wuhan.

Para isso, foi criado uma unidade hospitalar de urgência na Barra do Kwanza, onde estão, actualmente, pelo menos 40 pessoas, como foi anunciado pelo Ministério das Relações Exteriores.

O vírus, o que é e o que fazer, sintomas

Estes vírus pertencem a uma família viral específica, a Coronaviridae, conhecida desde os anos de 1960, e afecta tanto humanos como animais, tendo sido responsável por duas pandemias de elevada gravidade, como a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS), transmitida de dromedários para humanos, e a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), transmitida de felinos para humanos, com início na China.

Inicialmente, esta doença era apenas transmitida de animais para humanos mas, com os vários surtos, alguns de pequena escala, este quadro evoluiu para um em que a transmissão ocorre de humano para humano, o que faz deste vírus muito mais perigoso, sendo um espirro, gotas de saliva, por mais minúsculas que sejam, ou tosse de indivíduos infectados o suficiente para uma contaminação.

Os sintomas associados a esta doença passam por febres altas, dificuldades em respirar, tosse, dores de garganta, o que faz deste quadro muito similar ao de uma gripe comum, podendo, no entanto, evoluir para formas graves de pneumonia e, nalguns casos, letais, especialmente em idosos, pessoas com o sistema imunitário fragilizado, doentes crónicos, etc.

O período de incubação médio é de 14 dias e durante o qual o vírus, ao contrário do que sucedeu com os outros surtos, tem a capacidade de transmissão durante a incubação, quando os indivíduos não apresentam sintomas, logo de mais complexo controlo.

A melhor forma de evitar este vírus, segundo os especialistas é não frequentar áreas de risco com muitas pessoas, não ir para espaços fechados e sem ventilação, usar máscara sanitária, lavar com frequência as mãos com desinfectante adequado, cobrir a boca e o nariz quando espirrar ou tossir, evitar o contacto com pessoas suspeitas de estarem doentes.