Por mais louros que venham a amealhar com a tal "cruzada contra a corrupção" no fim das contas a serem prestadas no termo deste mandato, João Lourenço - ao não cortar, primeiro, nas gorduras do seu executivo, que tende a crescer e a igualar os marcos recordistas de anteriores governos; segundo, ao não compreender a triste sina de continuarmos a colocar as benesses do Poder Político à frente das prioridades sociais, que colocariam o país a superar, em curto espaço de tempo, uma série de insuficiências governativas que resultam sobretudo em perdas de vidas humanas - pode estar a fazer um investimento que servirá apenas os interesses de lobbies dos diferentes grupos de interesses ao seu redor.

E o "Bairro dos Ministérios" é um bom exemplo de uma engrenagem urdida para prosperar um grupo específico de cidadãos que actua muito próximo das iniciativas presidenciais. Pelo menos, é esta a impressão com que ficamos. Porque só assim se compreende que agora poderá dar o dito por não dito, quando foi feito todo um conjunto de investimentos gráficos e ilustrativos do que viria a ser o novo paraíso da administração política do país.

De tal sorte que é falso pensar-se que uma mudança de timoneiro na condução do país resulte no rompimento repentino de um modus operandi que tinha na cultura lobista um instrumento de afirmação de boa parte de uma ou das elites económicas e políticas no país. Foi precisamente esta cultura lobista associada a uma certa arrogância política que abriu caminho para as maiores atrocidades económicas que vieram a resultar numa delapidação desenfreada dos dinheiros públicos que hoje, ou quase sempre, faltaram para atender aos programas estruturantes de governação, sobretudo a nível social.

Tem hoje às mãos - a julgar por aquilo que afirma Rafael Marques no seu Maka Angola, citando o director de gabinete do Presidente da República, Edeltrudes Costa, sobre a desistência da ideia do "Bairro dos Ministérios" - mais do que o compromisso de levar adiante um combate cerrado à corrupção, o dever moral de inviabilizar uma série de negociatas das quais são protagonistas uma casta muito bem identificada. Alguns membros da qual estão ainda no activo e não deixaram de fazer valer a sua voz.

O anterior Governo foi exímio em deixar indicadores que hoje, se bem estudados e trazidos a público com debates sérios, nos ajudariam a compreender a dimensão do que foi (des)governar Angola ao arrepio de todas as normas de transparência e de boa governação. Se calhar, perceberíamos melhor o porquê de termos batido tão fundo em matérias fundamentais como o saneamento básico, educação, saúde, auto-suficiência alimentar, entre outras.

Estranhamente, numa altura em que fazia todo o sentido revisitar as palavras de ordem de um tempo em que se entendia "a agricultura como a base e a indústria o factor decisivo", o Executivo destoa e enfrenta uma onda de críticas que o obriga a corrigir(?) prontamente a decisão. Mas acreditamos que não o terá feito por entender só que não era prioridade, como vários especialistas apontaram. Não. Fê-lo certamente como consequência dos dividendos que poderiam advir do referido negócio de um "bairro" com muito má fama.

Só uma cultura lobista de vantagens veladas justificariam uma tomada de decisão tão infeliz como a do "Bairro dos Ministérios" e outras que são trazidas para a agenda do debate público quando já estão decididas.

E o mais grave é perceber que o Poder Legislativo, que teria um papel determinante na correcção destes descasos, não é nem o primeiro nem tão-pouco o último a usar da palavra para questionar o Poder Político.