Em vez de dizer que os países africanos, na perspectiva norte-americana, devem ser "realistas" quando fazem negócios com a China, a porta-voz do departamento de Estado norte-americano, Morgan Ortagus, em declarações à Lusa, a propósito da visita de Pompeo e das suas afirmações sobre a presença de Pequim em África, optou por referir o PCC, partido que sustenta o Governo de Pequim e é liderado pelo Presidente da China, Xi Jinping, sob um regime de partido único.

Recorde-se que Mike Pompeo, a 20 deste mês, foi a Adis Abeba alertar para as estratégias veladas da China face ao continente africano, sublinhando que as relações com os EUA são mais claras, sólidas e proporcionadoras de desenvolvimento.

Perante estas palavras, confrontada pela agência de notícias portuguesa sobre que tipo de relacionamento os EUA vão manter com Angola face à presença pesada da China no país, Morgan Ortagus disse que a cooperação com Angola vai perdurar, independentemente da China.

Destacou ainda que a inclusão de Angola no tour africano de Mike Pompeo serviu para apoiar o Presidente João Lourenço no combate à corrupção, apontando ainda que, em relação à presença chinesa em Angola, a posição de Washington é igual em relação à presença chinesa em todo o lado: Os Governos devem pensar "de forma realista" quando fazem negócios com o Partido Comunista Chinês.

Sobre a passagem por Angola, Ortagus notou que "era muito importante" porque "houve corrupção endémica em Angola durante muito tempo, por isso quisemos mostrar apoio pelas iniciativas que o Presidente tem vindo a levar a cabo para acabar com a corrupção e tornar o ambiente de negócios em Angola mais favorável às empresas norte-americanas".

E deixou claro que as relações entre os EUA e Angola "não dependem do que a China faz ou deixa de fazer" em resposta à pergunta sobre se Washington pretende conquistar terreno a Pequim em Angola.

"Dissemos a mesma coisa em Angola que dizemos noutros sítios: respeitamos a soberania do país, respeitamos a capacidade de os governos tomarem as suas próprias decisões e pedimos apenas que as pessoas pensem de forma realista sobre o que o partido comunista da China põe em cima da mesa quando propõe os seus negócios", disse ainda.

Morgan Ortagus salientou também que Angola "está a trabalhar na direcção certa".

"Quando vemos um Governo que luta pela democracia, luta para acabar com a corrupção e ser responsável perante o seu povo, é com esse tipo de Governos que queremos trabalhar", acrescentou.

Pompeo em África

O Secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, terminou, na quarta-feira da semana passada, em Adis Abeba, Etiópia, um périplo por três países em África, iniciado no Senegal e que incluiu também Angola, com um forte ataque à presença chinesa no continente, alertando de forma velada para as estratégias camufladas de Pequim.

Antes de iniciar esta sua primeira deslocação a África, o Secretário de Estado norte-americano avançou como objectivos maiores o incentivo à boa governação em África, o apoio à consolidação da democracia, o combate à corrupção, mas vários analistas desconfiaram que por detrás deste enunciado estaria um objectivo menos publicável: O esforço de Washington em travar a crescente influência económica - claramente o maior parceiro com o conjunto dos 54 países africanos - e militar da China no continente africano.

E, na última etapa deste "tour", em Adis Abeba, que começou no Senegal, na África Ocidental, passou por Angola, na África Austral, e terminou na Etiópia, na África Oriental, Mike Pompeo fez, finalmente declarações que permitem perceber que existia, de facto, mais um objectivo a juntar aos previamente enunciados.

"Os países (africanos) devem estar muito atentos aos regimes autoritários e às suas promessas vazias, porque eles alimentam a corrupção e a dependência", disse Pompeo, numa clara, embora velada, referência à China, durante um encontro na capital etíope com dirigentes e empresários.

E aproveitou para sublinhar a habilidade dos Estados Unidos para impulsionarem de forma sustentável o crescimento económico dos países africanos com quem têm relações.

Citado pelas agências, Pompeo acrescentou, sempre sem referir a China, que os países africanos correm o risco, se mantiverem a actual aproximação estratégica à China, de verem que "o crescimento de que tanto carecem, a prosperidade que tanto ambicionam e a soberania e o progresso que desejam simplesmente não acontece".

Os ataques de Pompeo à China têm como pano de fundo a crescente influência de Pequim no continente, construída com maior ênfase nos últimos 20 anos - em Angola coincidiu com o final da guerra, em 2002 - que surge em sentido contrário à cada vez menos influente presença dos EUA nesta geografia, onde o investimento e o crédito concedido têm, por norma, como contrapeso um mais facilitado acesso aos recursos naturais abundantes em África, desde o petróleo aos cada vez mais estratégicos metais raros, como o cobalto ou o coltão, essenciais para a indústria das telecomunicações e tecnologia digital.

Estes dois metais raros - coltão e cobalto, sem os quais não haveria smartphones, computadores portáteis, ou a indústria aeronáutica e as turbinas usadas em múltiplas funções seriam muito menos resistentes - são bons exemplos para a atenção que os EUA começam a dar a África, visto que é neste continente onde estão as maiores reservas mundiais e é cada vez mais evidente a sua raridade noutros locais do mundo.

Pequim, recorde-se, é hoje, e de longe, o maior parceiro de África, com os organismos internacionais a apontarem para mais de 200 mil milhões de dólares em trocas comerciais por ano, para além do financiamento directo, como foi com Angola, para a construção de linhas férreas, barragens, pontes, estradas... fazendo com que seja igualmente este continente aquele com mais dívida acumulada, contribuindo Luanda com mais de 23 mil milhões USD, como o Governo já reconheceu.