O segredo sul-africano tem permitido a Pretória encarar melhor que muitos outros países quaisquer que sejam as flutuações do crude nos mercados internacionais e, ao que tudo indica, passa por seguir aqueles ditados populares que dizem que é em terra que os marinheiros se preparam para as tempestades no mar; ou que é no amealhar que está o ganho.
Agora, como lembraram nos últimos os dias, a Bloomberg ou o site Oil.Price, o segredo, que pode ter, porque, na verdade, ainda não se sabe se muito mais ou pouco mais, o tamanho de mais de 45 milhões de barris de petróleo, começa a ser desvendado.
E os olhos dos experts do sector petrolífero dirigem-se para uma área costeira a noroeste da Cidade do Cabo (Cape Town), a Baia de Saldanha (o nome é bem lusófono, curiosamente), onde aquilo que pareciam reservatórios de crude, aparentemente normais, redondos e largos, afinal são um truque a que o regime do apartheid recorreu para lidar com as sanções a que estava sujeito pela comunidade internacional, que pressionava Pretória para acabar com o racismo como política oficial e que, entre outras atrocidades, levou Nelson Mandela a passar 27 anos no cárcere na Ilha de Robben.
Esses tanques - com que o regime do apartheid iludiu tudo e todos de forma a que as sanções internacionais não privassem o país de petróleo, mantendo a então, e ainda hoje, bem oleada máquina industrial sul-africana ao garantir que um dos produtos com severas restrições de importação devido às sanções da ONU, não faltasse, mesmo quando se esperava que a sua falta obrigasse o regime a ceder - são, afinal, muito mais do que parecem à primeira vista.
A melhor imagem para descrever aquilo que só agora, décadas depois de terem sido construídos, começa a ser esclarecido, é a dos icebergues, nos quais se vê o vértice mas que, têm, por vezes, dezenas ou centenas de vezes o volume visível e à tona, submerso, invisível.
O mesmo se passa com estes depósitos, que, para além do que é visível à superfície, prolongam-se no subsolo, agigantando-se na sua capacidade de reserva de petróleo, que pode ir até, embora se admita ser bastante superior, aos 45/50 milhões de barris.
Para se ter uma comparação de grandeza, os maiores petroleiros, ou superpetroleiros, a atravessar os oceanos hoje, têm capacidade para 1 milhão de barris.
Como é que as autoridades sul-africanas, durante o apartheid, e após a vitória da democracia e as eleições que acabaram com o regime racista, conseguiram manter este segredo guardado a sete chaves, mesmo com as capacidades de obtenção de informação que existem através dos satélites?
A resposta reside no mesmo local onde esteve guardado o segredo: no subsolo da Baia de Saldanha, cuja composição rochosa dificulta a obtenção de informações através dessas mesmas imagens de satélite.
Grandes stocks, grandes lucros
Com tamanha capacidade de armazenamento, a África do Sul começou, para além de manter a capacidade de resposta às crises, como a de 2008, quando o barril chegou aos 147 USD, criando severos problemas às maiores economias consumidoras, a gerar dividendos graúdos a partir desta infra-estrutura.
Consegue fazê-lo enchendo as reservas quando o petróleo desce nos mercados internacionais - esteve, por exemplo, a 27 USD em Janeiro de 2016 - e vendendo quando a matéria-prima dispara nos mercados - está actualmente a bater nos 80 USD/barril - gerando, assim, gigantescos lucros.
Esses lucros não são apenas para a África do Sul, também os grandes "traders" internacionais começaram a ganhar dinheiro com a capacidade de stock de "Saldanha Bay", porque, mesmo não sabendo, provavelmente, onde as autoridades sul-africanas o guardavam, confiaram as suas reservas de crude à África do Sul, que cobrando pelo serviço, permitiam depois aos negociantes globais voltar a colocar o produto nos mercados gerando lucros colossais.
Lucros tão colossais como colossais são os reservatórios da Baia de Saldanha e colossal é o segredo que neles reside.
Mas, ainda assim, como se fosse pouco, a capacidade de Saldanha Bay está a ser aumentada, desta feita sem grandes segredos: são mais 12 tanques, construídos em associação pela maior empresa mundial do sector, os alemães da German Oiltanking, e a MOGS sul-africana, outro gigante da construção de reservatórios para crude.
Estes novos 12 tanques vão conter 13,2 milhões de barris, que se vão somar aos existentes, que podem ser 45 milhões ou...
Oportunidade geográfica
Devido à limitação do Canal do Suez para operar os super-petroleiros actuais, a passagem pelo Cabo da Boa Esperança, extremo sul de África é a mais razoável entre o Médio Oriente e o sudoeste asiático e a Europa e as Américas.
Face a essa realidade e ao aumento da capacidade, apesar de já ser gigantesca, de stocks na Saldanha Bay, a África do Sul passa a ter nesta estrutura estratégica uma nova oportunidade de negócios com a crescente procura por parte dos maiores traders globais por locais com grande capacidade de armazenamento em busca de cada vez maiores lucros e consequente passagem dos maiores petroleiros do mundo pelo Cabo.