O trigo e o joio integram o seu caminho, e as causas e consequências desse percurso devem considerar os períodos em que ocorreram, sem que umas e outras sejam tidas como ungidas do Senhor e menos justificáveis as que são condenáveis.
Tenho presente que a actual matriz dos Direitos Humanos da Europa resultam da influência greco-romana e judaico-cristã.
A resiliência milenar da Igreja Católica subjaz, aliás, em respostas a políticas mobilizadoras a crises endogenias ou exogenias.
O Papa Francisco é proponente e intérprete das respostas à crise actual que preocupam os cidadãos.
Daí que, nas intervenções que teve nas Jornadas Mundiais da Juventude, colocasse o ser humano no centro delas, convocando-nos pelo diálogo à inclusão de todos face a uma "economia que mata", alicerçada numa conflitualidade hedonista de interesses.
A incerteza no futuro, favorecida pelo pragmatismo do poder, enquadrada na complexa teia de relações internacionais, conduz ao descrédito da política e à guerra.
O Papa responde a este quadro com retorno aos princípios e valores da doutrina de Jesus Cristo, líder indiscutível dela.
Acompanhando há muito as relações de Portugal com os países de língua portuguesa, registei a presença de milhares de peregrinos provenientes desses países, em particular de África.
Muitos eram simpatizantes ou militantes de partidos com ideais diferentes, e isso conduziu-me a ter pressente os Governos iniciais, constituídos pelos pais fundadores dessas independências.
Em Angola, por exemplo, integraram-nos Lúcio Lara, Pepetela, António Jacinto e Paulo Jorge, e em Moçambique, Jacinto Veloso e Aquino de Bragança, e como os demais anticolonialistas, desde a primeira hora, assumidos sem discriminação.
A propósito da luta anticolonial e do papel da Igreja, é de realçar a abertura do Concílio Vaticano II, impulsionado por João XXIII, que abriu um novo ciclo, dando lugar a posições de católicos contra a guerra colonial, de que foi exemplo a vigília na capela do Rato, em Lisboa, e a audiência concedida por Paulo VI, em plena guerra, a Agostinho Neto, Amílcar Cabral e Marcelino dos Santos, perante a perplexidade do regime ditatorial português.
Convém ter presente que não foi por acaso que o padre angolano Joaquim Pinto de Andrade, durante 12 anos consecutivos, foi presidente honorário do MPLA.
Estas invocações são tão mais necessárias quanto ao arrepio do que sucedeu nesses Governos, constituídos pelos pais fundadores das independências dos países africanos lusófonos, os Governos dos demais países de África subsariana não foram tão inclusivos como os referidos Governos iniciais da África lusófona, excepto com Mandela.
Numa altura e num período em que vários países de África se debatem com as consequências do radicalismo islâmico e outros procuram conservar ou conquistar o poder, através de grupos de mercenários provenientes de Estados autocráticos que negam ter neles influência, a palavra do Papa de apelo ao diálogo e à não-discriminação faz todo o sentido ser ouvida em África.
Não é por acaso que as Jornadas de 13 de Agosto, que ocorreram em Fátima, evocativa dos Refugiados e Emigrantes, foi presidida pelo presidente da Conferência Episcopal de Angola e S. Tomé e Príncipe, D. Manuel António Mendes dos Santos.
Esta via humanista, reiteradamente invocada pelo Papa Francisco, não deverá ser considerada nas políticas públicas a conceber em África?
*Secretário-geral da UCCLA