A estabilidade do país é ameaçada pela presença de comandos da Bélgica que intervieram depois de motins do exército congolês contra os oficiais brancos que se tinham mantido depois da independência. Instabilidade no exército congolês, rivalidades internas agravadas pela secessão da rica província do Katanga que consegue a assistência militar da antiga potência colonial. Lumumba protesta veementemente e pede a intervenção da ONU.

O presidente do Ghana, o pan-africanista Kwame Nkrumah, com que Lumumba tem tido relações calorosas desde a conferência de 1958, de Accra, sobre a libertação do continente, garante a imediata disponibilidade de unidades do seu exército e convence o secretário-geral da ONU, Dag Hammarskjold, do carácter urgente duma missão internacional no Congo. A resolução do Conselho de Segurança, que aprova a intervenção da ONU e pede a retirada das tropas da Bélgica, é aprovada quando o avião de Accra já estava no ar com os primeiros voluntários do exército do Ghana, que iam ser coadjuvados por algumas unidades da Tunísia.

A operação é dirigida pelo general ghanês Ankrah. A missão orgulhava os seus participantes que viam em Lumumba um verdadeiro e corajoso anticolonialista à cabeça dum país crucial para o futuro do continente. Entre os militares do Ghana, havia um capitão ghanês formado na escola militar de Sandhurst, na Inglaterra: Kojo Tsikata. Se a ONUC conseguiu obter a retirada dos militares da Bélgica da capital, a situação não cessou de piorar no país, com a secessão de outra província, o Kasai, e a indisciplina no exército.

As forças da ONUC, cujo número chegou a registar 2500 homens, protegeram Lumumba quando, no início de Setembro, o presidente Kasavubu o demitiu sem pré-aviso e o coronel Mobutu o tem posto em prisão domiciliar. Mas, o líder congolês acabou por ser capturado por forças leais ao futuro general Mobutu, quando tentava juntar-se às forças de Antoine Gizenga, que tinham tomado a região de Kisangani. A captura ocorreu no dia 1 de Dezembro, não longe das forças da ONUC que esperavam o sinal verde de Nova Iorque para se interpor. Contudo, a ordem não chegou e o general Ankrah não interveio. Levados ao Katanga, Lumumba e os seus companheiros foram atrozmente torturados e mortos com a participação (confessa) de militares da Bélgica.

A decepção foi enorme em Accra, como entre as forças da ONUC. Foi assim que Kojo Tsikata decide dar outro rumo à sua vida, contribuindo pessoalmente para uma causa sem ambiguidade: a luta anticolonial do MPLA. Em 1964, Tsikata volta a Accra, sai do exército e contacta Hugo de Menezes, o representante do MPLA no país. Esse introdu-lo a Agostinho Neto que acaba por aceitar a sua proposta de participar na luta armada e na formação dos combatentes. Em Maio 1965, Tsikata voa para Brazzaville.

Hospedado no início na casa de Chipenda, o "retired" capitão ghanês encontra-se com os dirigentes do MPLA presentes, nomeadamente Lúcio Lara. Passa por Dolisie, no Sul do país, num centro de treinos do MPLA e se aproxima à fronteira de Cabinda com um grupo de guerrilheiros comandados por Hoji-ya-Henda. O objectivo era reforçar a frente de Cabinda, onde as condições da guerrilha são particularmente difíceis, numa zona de floresta equatorial muito densa e uma população extremamente dispersa e pouco mobilizada, lembra Kojo Tsikata numa entrevista.

O comandante Henda apresenta Kojo aos outros membros do grupo como sendo Carlos Silva, um angolano emigrado na Zâmbia. Na mesma altura, tinha-se juntado um punhado de combatentes cubanos veteranos da Sierra Maestra, que, por sua vez, Henda apresentou como sendo angolanos que residiam em Fernando Po (Guiné Equatorial), o que explica que falassem somente espanhol...! Kojo conta que, no início, os cubanos desconfiavam dele, uma pessoa que sabia de arte militar e falava inglês, ou seja, um perfeito agente da CIA! A convivência no inóspito interior de Cabinda, os sacrifícios e a fome fizeram que cada um acabasse por revelar a sua verdadeira identidade - para uma amizade duradoura, nomeadamente com o general Moracen.

Em fins de Dezembro de 1965, uma acção de maior envergadura estava em preparação: a operação "Macaco", para a qual os cubanos tinham recebido material mais moderno e o grupo tinha treinado. Porém, a unidade portuguesa visada deu-se conta de uma possível emboscada pelo ladrar de um cão. Todos os guerrilheiros conseguiram fugir e, nos dias seguintes, recuperar o material militar enterrado na área prevista para a acção, lembra Tsikata. Voltaram a Dolisie e analisaram a situação. Tsikata volta em Cabinda mais tarde e, nas suas memórias, descreve com emoção a coragem de alguns jovens sempre prontos em obedecer às ordens, enfrentando todos os perigos, tais como o Gato, que tinha, na altura, 19 anos.

Depois do derrube de Kwame Nkrumah, deposto em Fevereiro 1966 por um golpe de estado militar, Tsikata regressa à região da Africa Ocidental, para onde se refugiaram algumas das figuras ligadas ao líder ghanês, e a França, onde é tratado uma infecção pulmonar.

Após o estabelecimento dum regime parlamentar no Ghana, em 1969, que leva ao poder o partido dos líderes anti-Nkrumaistas, dirigido por Kofi Busia, Tsikata volta ao Ghana. Mas, os militares que derrubaram Busia em 1972 desconfiam desta figura conhecida pela sua temeridade e fidelidade a Nkrumah. Ele é preso em Novembro de 1975 e condenado à morte no ano seguinte, acusado de ter atentado contra o poder do general Ignatius Acheampong.

Agostinho Neto decide entreter-se com o Presidente do Ghana durante uma cimeira da OUA, com o fim de obter uma medida de clemência para Tsikata ou a sua libertação. O pedido é reiterado pelo primeiro-ministro angolano Lopo do Nascimento, que é recebido pelo general ghanês nos primeiros meses de 1978. Afinal, será um outro general que o libertará, Fred Akuffo, que, por sua vez, derruba Acheampong em Junho 1978.

Quando um jovem capitão de aviação, Jerry John Rawlings, toma o poder em Junho 1979, num contexto de gravíssima crise económica e de corrupção desmedida, Kojo Tsikata encontra-se em Luanda, para onde tinha ido agradecer Agostinho Neto. Quando o Presidente angolano sabe dos acontecimentos em Accra, disse logo ao amigo Tsikata que devia ficar de vez em Angola! Mas Tsikata conhecia a génese desse acto e sabia que não se tratava dum golpe da mesma natureza dos anteriores.

(Segue-se na próxima semana)