"O que é que Cabo Verde pode esperar de Angola? Pode esperar muito, tudo o que for possível. Nós estamos de boa-fé quando dizemos que queremos recuperar o tempo perdido. É precisamente isso, é preciso interpretar-se isso à letra. Queremos colocar o nível da cooperação entre os nossos países com a fasquia o mais alto possível", disse João Lourenço, após reunir-se, na segunda-feira, com o primeiro-ministro de Cabo Verde, Ulisses Correia e Silva, na visita de Estado que está a realizar ao arquipélago.
No palácio do Governo, o chefe de Estado angolano e o primeiro-ministro cabo-verdiano assistiram à assinatura de um acordo entre as administrações das companhias aéreas estatais dos dois países para cedência pela TAAG de um Boeing 737-700, em regime de "leasing", à Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV), aeronave que já chegou hoje à Praia para garantir as ligações de médio curso do arquipélago.
Na mesma cerimónia, que marcou as conclusões da reunião da VIII Comissão Mista dos dois países - a primeira em 14 anos - foi ainda assinado um Acordo Bilateral de Serviços Aéreos entre os dois governos, um Memorando de Entendimento sobre os Transportes Aéreos entre os ministérios dos Transportes dos dois países, e um Memorando de Cooperação Técnica entre a Agência de Aviação Civil de Cabo Verde (AAC) e a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) de Angola.
"É verdade que praticamente estamos a começar agora, mas estamos a começar bem, a nosso ver. Vamos dar passos firmes, passos seguros, no sentido de podermos balancear, ano a ano e sempre que a comissão mista se reunir corrigir aquilo que eventualmente vai acontecer mal, não vai dar certo, mas confiantes em que o objectivo é melhorar e aumentar cada vez mais o nível da nossa cooperação económica, o nível das trocas comerciais entre os nossos dois países", disse ainda o Presidente angolano.
Já o primeiro-ministro cabo-verdiano, Ulisses Correia e Silva, sublinhou o apoio de Cabo Verde à intenção demonstrada por Angola, de integrar, como observador, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO): "Gostaríamos de sustentar - porque sabemos que é esse o desejo de Angola -, de patrocinar, a apresentação de Angola como país observador da CEDEAO e podermos juntos também estar numa região de interesse".
Acrescentou que a Cabo Verde interessam investimentos angolanos "em todas as áreas", mas apontou o turismo, imobiliário, economia marítima e economia digital, que se juntam a sectores já representativos da aposta de Luanda no arquipélago actualmente, como a energia, transportes, banca e telecomunicações.
A internacionalização das empresas angolanas foi também defendida por João Lourenço: "A internacionalização não enfraquece, antes pelo contrário. A internacionalização das empresas só as fortalece. Nós somos da opinião que os empresários cabo-verdianos devem aproveitar este bom momento, de abertura, em que a nível político, nós, os chefes de Estado, os chefes do Governo, estamos a criar o ambiente necessário para que os angolanos invistam aqui, em Cabo Verde, e os cabo-verdianos em Angola".
A criação de um Banco de Desenvolvimento da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), proposta apresentada por Angola, que detém a presidência rotativa da instituição, merece igualmente o apoio do primeiro-ministro cabo-verdiano.
"Pode ser um bom instrumento impulsionador de financiamento em condições que respondem às necessidades dos países da CPLP, particularmente dos países africanos que fazem parte da CPLP", disse ainda Ulisses Correia e Silva.
PR de Angola pede "acção concertada" e "soluções" locais para conflitos em África
O Presidente angolano, João Lourenço, mostrou-se hoje, na Praia, preocupado com a situação de segurança em África nos últimos tempos e pediu uma "acção concertada" dos Estados africanos para a procura e implementação de "soluções" locais
"O continente não se deve iludir contando que as soluções virão da Europa, da Ásia ou da América, as soluções devem ser encontradas e implementadas por nós, os filhos de África", defendeu Lourenço, numa intervenção numa sessão especial na Assembleia Nacional de Cabo Verde, enquadrada no programa da visita que está a efectuar ao arquipélago.
O chefe de Estado disse estar preocupado com a situação de segurança em África ultimamente, com o alastrar de acções de terrorismo nos países da região do Sahel, desde a Líbia, no Corno de África, na República Democrática do Congo e, mais recentemente, em Moçambique.
"A remoção do poder pela força das armas, de Governos legitimados nas urnas e eleições democráticas, muitas vezes estimuladas e financiadas por interesses difusos, devem merecer também uma ação concertada dos Estados africanos a nível regional e continental", sugeriu.
O Presidente angolano enumerou iniciativas tomadas para inverter a tendência, nomeadamente uma iniciativa de Angola de promover uma cimeira sobre o terrorismo e as mudanças inconstitucionais em África, que terá lugar na Guiné Equatorial, em 28 e 29 de maio próximo.
Relativamente às relações com Cabo Verde, João Lourenço reafirmou a vontade de estabelecer uma "verdadeira parceria estratégica", com cooperação em domínios como a administração pública, educação, agricultura, transportes, turismo, serviços e a nível parlamentar.
"Os nossos dois países dispõem de recursos e de um enorme potencial humano para que se explore muito mais as áreas de cooperação em que somos mais fortes", traçou, prevendo uma aproximação entre os dois países com a iminente reabertura da rota aérea Luanda-Praia-Luanda.
O presidente da Assembleia Nacional de Cabo Verde, Austelino Correia, realçou as relações históricas entre os dois países, notando que têm dado "resultados palpáveis", mas manifestou igualmente o interesse de a elevar a um nível estratégico.
O chefe da casa parlamentar cabo-verdiana alertou para o "ambiente complexo, caótico contraditório" que o mundo vive actualmente e disse que é necessário pensar em alternativas para fazer face às necessidades energéticas e de segurança alimentar.
Neste sentido, notou a importância do continente africano, onde disse que alguns países podem tornar-se grandes "players" à escala mundial, entre os quais Angola.
"É nossa firme expectativa que Angola venha a destacar-se nessa nova conjuntura, desde logo no sector dos combustíveis, de que já é uma importante produtora e fornecedora, e no domínio da agricultura, podendo e devendo, pelas condições naturais de que dispõe, tornar-se numa grande plataforma de produção e fornecimento de alimentos, com particular incremento no contexto da CPLP [Comunidade de Países de Língua Portuguesa], especialmente nos PALOP [Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa]", sugeriu Austelino Correia.
O Presidente angolano chegou no domingo à Praia e iniciou segunda-feira o programa oficial da visita de Estado a Cabo Verde, retribuindo a que foi realizada em janeiro último pelo Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, a Luanda.
Durante a manhã, além do encontro com o seu homólogo cabo-verdiano, João Lourenço recebeu as chaves da cidade da Praia, visitou a Fundação Amílcar Cabral, depôs uma coroa de flores no Memorial Amílcar Cabral e visitou os laboratórios Inpharma.
O chefe de Estado foi ainda recebido pelo primeiro-ministro cabo-verdiano, Ulisses Correia e Silva, com quem participou na sessão da comissão mista entre os dois países, que voltou a reunir 14 anos depois para assinar vários acordos de cooperação.
Na terça-feira, João Lourenço viaja para o Mindelo, na ilha de São Vicente, onde vai visitar pontos de interesse económico, como a empresa de conservação de pescado Frescomar e a Estação de Produção de Água dessalinizada, além de receber as chaves da cidade.
João Lourenço deixa o arquipélago na quarta-feira com destino a Luanda.