Em inglês e em português, Isabel dos Santos disparou dezenas de tweets logo a seguir ao momento em que, pelos quatro cantos do mundo, cerca das 18:00 de Domingo, começaram a ser publicadas peças jornalísticas construídas a partir dos documentos agrupados no "Luanda Leaks", onde se defende de tudo e a todos ataca, acusando o ICIJ e a PPLAAF de estarem envolvidas numa tramóia global para a incriminarem.

E a ideia era, e é, que estes seus comentários na rede social Twitter, cheguem aos sites online, como o NJOnline, jornais, televisões e rádios, que encheram as suas páginas, ontem e hoje, segunda-feira, 20, com prosas, quase todas fortemente denunciadoras de esquemas complexos e, presume-se, ilegais, para desviar dinheiros das empresas públicas angolanas, nomeadamente a Sonangol e a Sodiam.

Desde logo, a página do ICIJ, que explica que os "Luanda Leaks" foram trabalhados por 36 media em todo o mundo para "expor duas décadas de inescrupulosos negócios que fizeram de Isabel dos Santos a mulher mais rica de África e deixaram Angola, país rico em petróleo e diamantes, um dos mais pobres do mundo".

O ICIJ explica ainda, numa longa introdução ao conjunto de peças publicadas no seu site, que as prevalecentes investigações partem de 715 mil documentos confidenciais da finança e dos negócios globais, oferecendo um "estudo de caso" de um "problema crescente em todo o mundo" que é o "roubo de países por dentro" por cleptocratas e a suas famílias e associados "com ajuda de offshores com jurisdições secretas" e "apoio de proeminentes empresas ocidentais" na aquisição de propriedades e participações empresariais num universo "movido por dinheiro sujo".

Jornais do mundo e os "Luanda Leks"

O inglês The Guardian escolheu como título para as extensas prosas sobre este assunto "Revelação: como a filha do Presidente usou o seu estatuto para erguer um império de 2 mil milhões USD", apontando para os passos seguintes onde promete descrever como os "Luanda Leaks" permitem explicar a forma como Isabel dos Santos se transformou na mulher mais rica de África, como é descrita pela revista Forbes.

Publicando fotografias de Isabel e do seu marido, Sindika Dokolo, o britânico The Guadian apelida o caminho de "complexos esquemas financeiros" por onde a empresária e filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos se moveu até chegar ao estatuto de bilionária "às custas do Estado angolano" que foram agora revelados pela primeira vez graças a uma "gigantesca fuga de informação confidencial sobre o seu império de negócios".

Sublinha ainda este jornal que a investigação que envolve os seus jornalistas e os do ICIJ realizada através de 20 países, sugere que Isabel dos Santos "beneficiou de extraordinárias oportunidades que lhe foram concedidas pelo Governo do seu pai antes de ter deixado o poder em Setembro de 2017".

No outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos da América, The New York Times titula a extensa peça jornalística que dedicou a este assunto com um enfoque nas ligações de empresas norte-americanas a Isabel dos Santos e a ajuda que lhe prestaram para o seu enriquecimento.

"Como empresas norte-americanas ajudaram a mulher mais rica do mundo a explorar a riqueza do seu país", é o titulo, que serve de introdução para uma longa e detalhada explicação, a partir dos milhares de documentos dos "Luanda Leaks", para a ascensão meteórica da "princesa" de Angola.

E diz o NYT que José Eduardo dos Santos, quando explode a crise financeira, em 2016, no rasto da queda abrupta do valor do crude em meados de 2014, demitiu toda a administração da Sonangol para colocar à frete da poderosa petrolífera nacional a sua filha.

Mas antes, aponta aquele que +e um dos mais influentes jornais norte-americanos, José Eduardo dos Santos (JES) assina um decreto que permitiu a contratação, por 9,3 milhões USD, de uma empresa sedeada em Malta, a Wise Intelligence Solutions, que é detida pelo casal Isabel e Sindika.

O jornal escreve, na sua extensão online, que esta empresa, a Wise, por sua vez, contratou algumas majors, como a McKinsey ou a BCG recebendo os valores directamente da Sonangol, repassando como pagamento pelos serviços apenas metade do que recebera da petrolífera.

E acrescenta que, depois de Isabel dos Santos assumir o cargo de PCA da Sonangol, estes valores foram multiplicados.

É ainda dado destaque à utilização de capital da Sonangol para os seus investimentos na portuguesa Galp.

De regresso à Europa, o Francês Le Monde escolhe para título "Luanda Leaks: O domínio total de Isabel dos Santos, a mulher mais rica de África, sobre as finanças de Angola".

E depois, no texto que se segue, o maior jornal francês faz jus ao título, revelando uma sucessão de "esquemas financeiros opacos utilizados pela filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, com o objectivo de ficar com dinheiro de empresas públicas do seu país".

Recordando que o seu império, como lhe chamou também o The Guardian, se estende pelas telecomunicações, pela energia, pelas grandes superfícies comerciais, pela banca, pelos diamantes ou pelos media e imobiliário, o que lhe permite "ostentar uma fortuna pessoal na ordem dos 3 mil milhões de dólares".

E, por detrás de um elogio, o Le Monde utilizou, provavelmente, a mais dura descrição da mulher que está no centro de mais este escândalo global forjado a partir de fugas de informação: "Ninguém nem nada resiste a esta elegante quadragenária que orquestrou um império económico e financeiro activo com especial preponderância em Angola e em Portugal".

E mais: "Empenhada em se livrar da imagem de herdeira, a filha do antigo Presidente angolano não perde uma oportunidade de estar em conferências internacionais onde mostra um afro-optimismo liberal, tendencialmente descomplexado".

E ainda: "E também tão à-vontade nos conselhos de administração de sociedades que integra como no jet set mundial, perante quem se exprime em nome de África".

E depois, o Le Monde volta a pegar nos temas mais comuns a todos os restantes media que trabalharam este tema, dedicando um capítulo longo a explicar como Isabel e o clã dos Santos tomou para si o negócios dos diamantes em Angola através da aquisição da joalheira de luxo suíça de Grisogono, em 2012, com dinheiros públicos, e de uma lei apropriada, como aquela que determinava - foi anulada pelo novo Governo de João Lourenço - a existência de clientes preferenciais.

Numa nova incursão pelas Américas, o Folha de São Paulo, que dedica igualmente um espaço importante a este tema, segue editorialmente a escolha que foi feita pelo NYT, sob a capa do título "Filha de ex-Presidente de Angola acusada de desviar milhões".

Um dos mais importantes jornais brasileiros, o Folha de São Paulo, escolhe para abordagem neste trabalho publicado na senda dos "Luanda Leaks" a explicação da origem dos documentos na Plataforma para Protecção de Denunciantes Anónimos em África, aproveitando o ensejo para dizer que esses documentos revelam que isabel e o marido beneficiaram de "uma série de transacções" envolvendo empresas públicas durante o governo do seu pai, usando paraísos fiscais como rede para um complexo esquema de empresas de fachada.

E aponta, como a generalidade dos media internacionais, para a Sonangol como estando por detrás da "complexa rede de contractos e empresas de fachada" usadas pelo casal para desviar fundos públicos a seu favor.

Em Portugal, a partir de onde os estilhaços desta "bomba" mais depressa chegaram a Angola, o Expresso, um dos jornais que integra o ICIJ, escolhe um título-chapéu "Como Isael dos Santos desviou mais de 100 milhões de dólares da Sonangol para o Dubai" para desembrulhar um punhado de artigos onde detalha todos os esquemas usados por Isabel dos Santos e pelo seu marido, bem como alguns dos seus mais directos colaboradores, incluindo alguns portugueses.

O enfoque principal deste jornal, que acabou por ser seguido pela generalidade dos media portugueses, é a saída de mais de 100 milhões de euros de uma conta em dólares da petrolífera angolana no EuroBIc, um banco onde detém uma participação maioritária, horas depois de ter sido demitida de PCA da Sonangol, a 15 de Novembro de 2017.

"Foi uma questão de apenas um dia, entre sair a notícia de que o conselho de administração da Sonangol tinha sido exonerado e a tomada de posse da nova equipa", escreve o Expresso, que acrescenta: "Em Lisboa, na conta da Sonangol no Eurobic, banco de que Isabel dos Santos é a maior accionista, havia 57,4 milhões de dólares a 15 de Novembro, quando foi demitida, e no dia seguinte tinha um saldo negativo de 451 mil euros".

Em Angola, o único jornal diário com edição impressa, escolhe para título na primeira página "Luanda Leaks - Jornalistas revelam `engenharias" de Isabel dos Santos", e, depois, no interior, o JA segue a linha da generalidade dos restantes media que trataram o assunto, sob um segundo título onde explica que "Consórcio de 120 jornalistas revela `engenharias" de Isabel dos Santos".

Mas o jornal vai, num capítulo, mais longe que os demais, ao escrever que "os resultados obtidos por esta investigação continuarão a ser divulgados nos próximos dias em todo o mundo, sendo de prever que venham a ser desencadeados vários processos-crime contra Isabel dos Santos consoante os negócios menos claros em que se tenha envolvido nos diferentes países".

Tal como outros media de língua portuguesa, sendo isso menos frequente nos restantes, o Jornal de Angola recorda. No fim da prosa, que Isabel dos Santos se tem defendido, acusando o actual Governo de estar por detrás de um "ataque orquestrado" e "movido politicamente".

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