No documento divulgado pela Angop, o Governo afirma que "esta suspensão ocorreu, de facto, há mais de um ano e teve reflexos na actividade das empresas brasileiras que operam em Angola e se encontram vinculadas por importantes contratos de empreitada ao Governo, que tiveram de interromper os seus trabalhos e de despedir pessoal angolano".

No mesmo comunicado, o Executivo explica que os cortes do financiamento brasileiro, através de uma linha de crédito do BNDES, alegadamente interrompida por causa do escândalo do processo Lava Jato, em que várias instituições e personalidade são acusados de corrupção, obrigaram "a mobilizar outros recursos e encontrar soluções financeiras alternativas para não interromper os trabalhos em curso, nomeadamente a construção da barragem de Laúca, o alteamento da barragem de Cambambe e outros".

Perante este cenário e as severas implicações que estes cortes tiveram em alguns projectos estruturantes, Angola, segundo o comunicado citado, "solicitou no passado mês de Junho esclarecimentos às autoridades brasileiras sobre as razões da suspensão dessas linhas de crédito e pretende enviar em tempo oportuno uma delegação governamental para com elas debater esta questão, a fim de se chegar a um entendimento que convenha a ambas as partes".

Recorde-se que os acordos no âmbito da cooperação entre os dois países tem por base um acordo geral assinado em 1980, que regula o funcionamento das linhas de crédito, que estão ligadas por garantias reais alicerçadas no petróleo.

Suspensão anunciada em Outubro pelo BNDES

Recorde-se que no dia 10 de Outubro último, o Novo Jornal Online noticiava que alguns projectos importantes em curso em Angola e financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social (BNDES) do Brasil foram suspensos por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção Lava Jato, que envolve algumas das mais proeminentes figuras da política e dos negócios brasileiros.

Directamente em causa estão, entre outros, segundo um comunicado do BNDES, as obras no Polo Agro-industrial de Capanda, o aproveitamento hidroeléctrico de Laúca (AH Laúca), o alteamento de Cambambe, e a segunda central da barragem de Cambambe, num total de 808,8 milhões de dólares.

Mas a abrangência geográfica desta medida do BNDES não se circunscreve a Angola. Em Moçambique, por exemplo, foi suspenso o financiamento para a barragem de Moamba Major, à qual foram destinados 320 milhões de dólares.

Foram ainda cancelados financiamentos para dois projectos na Argentina, um em Cuba, um no Gana, um na Guatemala, um nas Honduras, sete na República Dominicana e sete na Venezuela.

No comunicado do BNDES lê-se que "são financiamentos contratados a exportações de serviços de engenharia das empresas Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez".

As cinco empreiteiras são investigadas no esquema de corrupção da petrolífera estatal Petrobras, conhecido como Lava Jato.

O banco de desenvolvimento anunciou a "reavaliação da actual carteira de financiamentos, composta de 47 projectos em diversos estágios de tramitação (contratadas, aprovadas, em análise e em consulta)", entre os quais os 25 suspensos.

O financiamento do BNDES a projectos de infra-estrutura no estrangeiro tem estado envolvido em polémica, devido a suspeitas de superfaturamento e de favorecimento de companhias, escreveu a Lusa na altura.

A avaliação dos projectos terá em atenção o avanço da obra, o nível de aporte de recursos de demais financiadores (além do BNDES) e o impacto de novos financiamentos no aumento da exposição e do risco de crédito do BNDES em cada país, segundo o BNDES.

O banco destacou que "não há registo de inadimplência dos financiamentos concedidos pelo BNDES".

Foram ainda anunciados novos procedimentos para financiamento a exportações de serviços de engenharia e construção.

"Os novos critérios foram definidos levando em consideração consultas feitas pelo BNDES à Advocacia Geral da União (AGU) e aos demais órgãos do sistema de apoio oficial às exportações, bem como as recomendações feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no âmbito de suas auditorias", informou o banco.

O BNDES é apresentado na sua página na Internet como um dos maiores bancos de desenvolvimento do mundo.

A gigante Odebrecht

A empresa envolvida na investigação da justiça brasileira Lava Jacto recebeu a maior fatia dos fundos disponibilizados para Angola pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social (BNDES) do Brasil que, entretanto, suspendeu o desbloqueamento de verbas de financiamento a exportações de engenharia de 25 operações no exterior.

A construtora brasileira Odebrecht recebeu 79 por cento das verbas do BNDES para o financiamento de projectos em Angola, o equivalente a 3.145 mil milhões USD, ao longo de 16 anos.

De acordo com dados do BNDES, a que o Expansão teve acesso, o financiamento a obras em Angola por parte desta entidade bancária teve início em 2000. Desde essa altura que a empresa Odebrecht foi a que obteve a maior parte das verbas destinadas a desenvolvimento de projectos em Angola, o equivalente a 3.145 mil milhões de USD de um total de 3.990 mil milhões USD.

O restante das verbas para obras em Angola foram para as construtoras Queiroz Galvão SA (317 milhões USD), Andrade Gutierrez SA (276 milhões) e Construções E Comércio Camargo Correa SA (213 milhões) e por outras empresas (39 milhões). Ao todo, e desde 2000, já foram desembolsados 3.397 mil milhões USD para projectos em Angola.

O financiamento do BNDES a projectos de infra-estruturas no estrangeiro tem estado envolvido em polémica, devido a suspeitas de superfacturamento e de favorecimento de empresas.

O Ministério Público brasileiro acusou o ex-presidente Lula da Silva e o empresário Marcelo Odebrecht por crimes de corrupção activa e passiva, lavagem de dinheiro, tráfico de influência e organização criminosa. Segundo a Procuradoria da República no Distrito Federal, estes alegados crimes terão ocorrido "entre 2008 e 2015" e terão, alegadamente, envolvido a "actuação de Lula da Silva junto do BNDES com o propósito de garantir a libertação de financiamentos para a realização de obras de engenharia em Angola".

De acordo com os procuradores da investigação da justiça brasileira, dos vários países de África e da América Latina que beneficiaram dos fundos do BNDES, Angola foi o país que celebrou o maior número de contractos, recebeu o maior volume de dinheiro, teve o menor percentual de juros e onde foi verificado um dos menores prazos médios de concessão dos empréstimos.

Em Outubro, o BNDES informou a suspensão do financiamento a exportações de serviços de engenharia de 25 operações contratadas para o exterior, onde estão incluídas obras em Angola como o Polo Agro-industrial de Capanda, o aproveitamento hidroeléctrico de Laúca (AH Laúca), o alteamento de Cambambe, e a segunda central da barragem de Cambambe, num total de 808,8 milhões USD ainda por desembolsar.

Em resposta a questões colocadas pelo Expansão, o BNDES informou que "foram suspensos os desembolsos de financiamento" para uma "reavaliação das operações, com base em novos procedimentos adoptados" pelo banco de investimento.

"Não significa que os desembolsos ficarão definitivamente suspensos. Significa que eles estão sendo reavaliados caso a caso, para uma decisão final, quando, então, poderão ou não ser retomados. O processo de reavaliação está em curso e não sabemos até o momento, quais desembolsos de quais projectos serão retomados", refere a nota enviada ao Expansão.