... Se se olhar para o que dizem alguns dos mais importantes analistas dos mercados da energia, aos países mais dependentes das exportações de crude para o equilíbrio da sua balança de pagamentos não resta outra coisa que não seja esperar que, como tantas vezes acontece, o que os aguarda ao virar da esquina do futuro não seja tão mau como parece que vai ser.

Isto, porque os dados que chegam da economia global estão longe de ser agradáveis, com a China a estancar o passo depois de um auspicioso período pós-pandemia, enquanto nos EUA, a já chamada crise da dívida, que opõe democratas e republicanos na forma de lidar com a falta de dinheiro nos cofres e o risco de "default" está sempre perto... e como se fosse pouco, o motor económico da Europa, a Alemanha acaba de ver confirmada oficialmente a entrada no clube dos países em recessão.

Não é por acaso que o barril de Brent, que rege a saúde da economia angolana como mais nada, servindo de referência às exportações nacionais, só no mês de Maio deu um trambolhão dos 79,5 do dia 01 para os 71,4 desta manhã de 31, são cerca de oito dólares a menos no "encaixe" global diário das vendas angolanas, e a uma média de 1,1 milhões de barris por dia (mbpd)... é fazer as contas!

Só que, como sempre acontece quando os alertas vermelhos emergem do fundo dos ecrãs dos traders, surgem os analistas ligados ao negócio para procurar inverter o sentimento pessimista, e é isso que está a acontecer por estes dias nos sites da especialidade e nas opiniões colhidas pelas agências económicas, como a Reuters ou a Bloomberg.

Por exemplo, Simon Watkins, um antigo jornalista económico e trader experiente, veio já dizer, em artigo de opinião no oilprice.com, que este pessimismo que se está a apossar dos mercados é chuva passageira e tudo vai voltar a brilhar, do lado dos produtores/exportadores - para quem compra a história é sempre outra, e menos simpática - quando decorrer, na próxima semana o meeting mensal de Junho da OPEP+.

Diz atkins que é de esperar uma nova surpresa, ou seja, uma resposta normal do "cartel" à situação de perda de valor do crude nos mercados, que é mais um anúncio de corte na produção, como o indiciam as declarações dos responsáveis pela tutela do sector nos dois gigantes da OPEP+, a Arábia Saudita e a Rússia.

Com o príncipe e ministro saudita da Energia Abdulaziz bin Salman a dizer que os "short sellers" devem ter muito cuidado com o que andam a fazer, porque podem ter uma surpresa cataclísmica, e o vice-primeiro-ministro e tutela oficial das negociações no sector da energia russa, Alexander Novak, a reiterar que o gigante euroasiático vai reduzir a sua produção como está definido, apesar das críticas no sei da organização para a procrastinação de Moscovo em dar esse passo.

Ou seja, na próxima semana vamos assistir a mais um corte na produção da OPEP+, organização que controla cerca de 50% da produção mundial de crude, que está actualmente próxima dos 102 mbpd, prevendo alguns analistas que podem ser "acrescentados" entre 200 mil e 400 mil barris a menos aos cortes ocorridos já este ano 1,16 mbpd e aos 2 mbp enxugados em 2022.

E não é por nada, é apenas porque a Rússia e a Arábia Saudita precisam do barril a valer muito mais que os actuais 73 USD, sendo que o equilíbrio face às necessidades, entre sauditas e russos, estes últimos apertados como estão com as despesas em fluxo continuado de subida com a guerra na Ucrânia que já dura há 15 meses, anda, segundo Simon Atkins, em torno dos 78 USD.

Mas não é menos importante para Angola, que, com o declínio rugoso da sua produção nos últimos anos, agora pouco mais de 1 mbpd, estará, como tem estado, a salvo de lhe ver atribuída uma quota significativa no esforço de redução da produção do "cartel", o que significa que um corte inter pares é uma boa solução para, pelo menos, ver o barril a subir para lá dos 75 USD, o valor de referência usado na elaboração do OGE 2023...

No que é factual, sem margem para elucubrações, aparecem os números sobre a economia chinesa, como sublinha Vivek Dhar, director sectorial do Commonwealth Bank of Austrália, citado pela Reuters: Com os dados da produção industrial chinesa a indicarem uma subida mais lenta que o esperado no último mês, os mercados estão inquietos que a procura pela matéria-prima no gigante asiático enfraqueça de forma amais acelerada que o que era antecipado".

Um dado a reter é que este decréscimo da procura por crude na China contrasta fortemente com o que se observava no início deste ano, o que levou mesmo a Goldman Sachs a antecipar nessa fase que o barril chegaria facilmente aos 100 USD e a própria Agência Internacional de Energia (AIE) antecipava uma aceleração no consumo para cima dos 103 mbpd...

Ou, como quem diz, se os dois chefes da OPEP+, bin Salman e Novak não se entenderem e derem um sinal de desligamento da parceria sólida que têm mostrado ser até aqui, está o caldo entornado e podemos vir a assistir a um colapso nos mercados.

O que pode muito bem acontecer depois de o russo ter deixado entender que poderá defender a manutenção dos níveis actuais da produção por causa das necessidades impostas pela guerra, mas também porque o 3º maior produtor planetário extrai o barril a um breakeven muito baixo, só comparável ao saudita e pouco mais entre os parceiros.

Contas nacionais

Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, este momento dos mercados é melindroso.

Com o barril a valer pouco mais de 73 USD, o Governo angolano está a perder a folga no que diz respeito às suas contas porque o OGE 2023 foi elaborado com o barril nos 75 USD.

O país ainda depende em grande medida do seu sector energético, considerando que o crude representa mais de 90% das suas exportações, perto de 30% do PIB (tem vindo a descer nos últimos anos o peso do sector) e mais de 50% das receitas fiscais do Estado, sendo certo que o sector do gás natural já é uma importante fonte de receitas, superando mesmo o diamantífero.

Aliás, o Governo de João Lourenço, que elaborou o seu OGE para 2023 com um preço de referência para o barril nos 75 USD, tem ainda como motivo de preocupação uma continuada redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.