Segundo a Direcção de Trânsito e Segurança Rodoviária, os dados de 2023, comparativamente aos de 2022, mostram um aumento de 122 mortes e 2.209 feridos. A Polícia Nacional indica que a maioria dos acidentes foi causada por atropelamento (4.852) e colisão entre automóveis e motociclos (3.024).
Os acidentes rodoviários, em Angola, são a segunda maior causa de morte, depois da malária. As autoridades receiam que os números da sinistralidade ultrapassem os das doenças. Num passado relativamente recente, Angola apresentava a terceira mais elevada taxa de sinistralidade rodoviária, tendo atrás de si apenas a Serra Leoa e o Irão.
Há relatos de que pelo menos 50 vítimas de acidentes de viação chegam diariamente ao Centro Ortopédico de Reabilitação Polivalente Dr. António Agostinho Neto, em Luanda. Todos os anos morrem milhares de pessoas nas estradas angolanas e outras ficam com mobilidade reduzida para toda a vida. As causas são relatadas pelas autoridades, geralmente, como "violação sistemática das normas e regras do Código de Estrada, motivados pela condução em estado de embriaguez e o excesso de velocidade".
Um caso recente, sobre o autocarro desgovernado que causou várias vítimas mortais e feridos, em Viana, que teve a consideração do porta-voz do Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional, Nestor Goubel, admitindo que "o excesso de velocidade seja a causa do acidente de viação, podendo estar também entre as causas o mau estado técnico do miniautocarro".
A posição oficial de atribuir a culpa dos acidentes de viação principalmente aos condutores, mencionando factores como excesso de velocidade e estado técnico das viaturas, ignora uma série de problemas estruturais que contribuem, significativamente, para a sinistralidade rodoviária em Angola. Desvia a atenção das verdadeiras causas, como a falta de manutenção dos semáforos, a ausência de iluminação adequada nas vias públicas e a condição precária das estradas. Esses factores criam um ambiente de condução extremamente perigoso, em que mesmo os condutores mais cuidadosos estão em risco.
Para além disso, a falta de sinalização quase sistemática nas estradas angolanas é um problema crítico que não pode ser ignorado. Sem sinais claros, os condutores não têm informações essenciais para tomar decisões seguras, aumentando a probabilidade de acidentes. A responsabilidade por esses problemas recai sobre as autoridades competentes, que devem garantir que a infra-estrutura rodoviária esteja em condições adequadas para suportar o tráfego. Não podemos ignorar esses aspectos e colocar a culpa exclusivamente nos condutores.
A ocorrência de acidentes rodoviários depende da contribuição de múltiplos factores que podem actuar de forma isolada ou em associação (condutor, estrada, ambiente viário e veículo). Estes factores podem ser manifestos, como o tráfego, as condições climáticas e as características das infra-estruturas e do veículo, ou latentes, como a percepção humana, a tomada de decisão, e o estado psicológico e cognitivo.
A Organização Mundial de Saúde define a sinistralidade rodoviária como um problema de saúde pública, resultante em parte da acção humana, com consequências políticas, económicas e sociais nas sociedades desenvolvidas ou em desenvolvimento. A sinistralidade rodoviária representa uma grande parte das preocupações de saúde pública, sendo, por vezes, negligenciada e requerendo um enorme esforço para uma prevenção mais sustentável e efectiva.
Estima-se que 1,2 milhão de pessoas morrem anualmente em acidentes rodoviários e que pelo menos 50 milhões ficam feridas, em todo o mundo. Este tipo de sinistralidade não recebe tanta atenção por parte dos media como outros tipos de sinistralidade menos frequentes.
O Governo angolano pretende reduzir a sinistralidade rodoviária em 50% até 2027, colocar Angola no ranking dos 10 países de África com a menor taxa de sinistralidade rodoviária e entre os cinco países com baixa taxa de mortalidade ao nível da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC).
Melhorar a segurança nas estradas angolanas requer investimentos significativos em infra-estrutura, incluindo a reparação de semáforos, a instalação de iluminação pública adequada e a manutenção das estradas. Sem essas melhorias, continuar a culpar os condutores é injusto e ineficaz e não resultará na redução das taxas de acidentes de viação. É hora de enfrentar as verdadeiras causas da sinistralidade rodoviária e trabalhar para criar um ambiente de condução mais seguro para todos.n
*Mestre em Linguística pela Universidade Agostinho Neto