Apesar desta incerteza, dentro da OPEP+, o grupo criado em 2017, em torno da Organização de Países Exportadores (OPEP) e um grupo de 10 desalinhados "liderados" pela Rússia para controlar os mercados, parece vingar a ideia de que a produção deve manter-se sob apertado controlo de forma a evitar novos desequilíbrios, sendo de esperar poucas mexidas na reunião marcada para quinta-feira desta semana.

Actualmente, a OPEP+, que é responsável por mais de 60% do crude extraído em todo o mundo, e que integra os dois gigantes planetários das exportações, a Arábia Saudita e a Rússia, está forçada pelas circunstâncias a voltar a olhar para a sua política de cortes que vigora desde Junho último e que, até 31 de Dezembro, vai manter um aumento de 400 mil barris por dia mensalmente, valor estimado como o mais indicado de forma a responder à crescente procura mas com suficiente margem para evitar um arrefecimento dos mercados.

Este grupo estrategicamente organizado para defender os interesses dos seus membros terá de voltar a olhar para este plano nas duas reuniões que tem agendadas até ao final do ano, esta quinta-feira, 04, ou no início de Dezembro, estando muito pressionado pelas maiores economias do mundo, com os EUA à cabeça, para aumentar de forma mais robusta a produção para permitir não deixar esfriar a recuperação da economia planetária no contexto pós-pandemia Covid-19.

Entre os membros do "cartel", actualmente liderado por Angola enquanto presidente rotativo da OPEP, as opiniões conhecidas vão no sentido de manter tudo como está, sendo os mais férreos defensores dessa estratégia a Arábia Saudita.

Mas Angola, numa rara tomada de posição clara, assumida pelo ministro Diamantino Azevedo, já veio dizer, numa declaração emitida via comunicado de imprensa, que não encontra razões para alterar os planos, considerando que "o plano actual", mais 400 mil barris por dia, "é adequado e não há necessidade de alterações".

O ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás (MIREMPET) angolano, enquanto líder rotativo do "cartel" assumiu esta posição num momento em que aumenta a pressão internacional sobre os produtores exigindo mais crude disponível nos mercados face a um crescente preço por barril, actualmente perto dos 84 USD, superior largamente aos valores imediatamente pré-pandémicos.

Foi uma das primeiras ocasiões em que o ministro angolano dos Petróleos assumiu uma posição clara e inequívoca sobre a política de cortes da OPEP+, defendendo que os actuais 400 mil barris diários acrescidos mensalmente até final do ano, bastam.

Isto, pesar da forte pressão internacional para que o "cartel" vá além disso rapidamente devido à crise energética em que o mundo se encontra, e face a uma galopante escassez energética, especialmente de gás natural, que gerou uma das mais graves crises em décadas na Europa, na China e mesmo nos EUA, os maiores blocos económicos do mundo.

O argumento de Diamantino Azevedo é que a ceise energética que varre o mundo desde há algumas semanas é resultado da escassez de gás natural e carvão e não de petróleo.

Com este cenário em pano de fundo, depois de os EUA já o terem feito de forma limitada, agora a China veio anunciar que está a libertar parte das suas gigantescas reservas de combustíveis para alimentar os mercados sedentos no rescaldo de sérios problemas no fornecimento de energia eléctrica em várias das províncias mais industrializadas, que obrigou a encerrar unidades fabris em diversos sectores, especialmente no automóvel e metalo-mecânica.

Mas esta informação teve um efeito imediato nos mercados, com o barril de Brent a estabilizar na fasquia dos 84 dólares, estado a valer, perto das 10:30, hora de Luanda, 84,31, +0,7% que no fecho de sexta-feira, enquanto no WTI, o barril estava nos 83,81 +0,29%, porque deixou claro a intenção do gigante asiático em manter os preços estáveis.

Com as atenções colocadas agora na reunião de quinta-feira, e quando se sabe que dificilmente, depois do que disse Diamantino Azevedo à Bloomberg, que reflecte a posição da maioria dos membros da OPEP+, até fnal do ano não são esperadas alterações e os mercados deverão reflectir essa acalmia, mas tudo pode mudar se deste encontro sair alguma indicações sobre o que os membros querem para depois de 01 de Janeiro de 2022.

Isto, porque, por exemplo, em cima da mesa estão algumas ameaças a este equilíbrio, como seja a possível chegada de mais de 2 milhões de barris por dia (mbpd) de crude iraniano se as conversações com os EUA sobre o acordo nuclear de 2015, boicotado pelo anterior Presidente Donald Trump, voltar agora aos carris, como augura o Presidente Joe Biden.

Mas, em sentido contrário, empurra o resultado de anos de desinvestimento no sector que levou a que alguns países, como é o caso de Angola e da Nigéria, tenham perdido grande parte da capacidade que tinham de extrair crude, sendo disso bom exemplo a produção angolana que caiu mais de 6 mbpd em pouco mais de 10 anos, estando agora muito perto dos 1,1 mbpd contra os 1,8 mbpd de 2008.

No entanto, esta posição choca de frente com o que ficou claro na recente reunião do G20, que agrega os 20 países mais industrializados do mundo, onde estão alguns dos membros da OPEP+, como os sauditas e os russos, que veio pedir de forma robusta, pela voz do Presidente dos EUA, Joe Biden, que o "cartel" avance de forma decidida para mais produção de forma a não tolher a retoma da economia mundial neste momento em que começa a sair da crise gerada pela COvid-19.

Para já, desde Angola à Arábia Saudita, passando pelo Iraque e pelo Kuwait, entre outros, a opção vai para manter o actual programa.

O que fica por saber é se os membros vão deixar perceber o que pode acontecer a partir dos primeiros dias de 2022.

Conclusão: a crise pandémica está a passar

Apesar de algum impasse e défices de acesso à energia, é já evidente a ideia de que a economia global está na sua fase final de recuperação da crise pandémica e que os valores registados reflectem não só esse dado como também os efeitos provocados por esse período negro da história económica mundial sobre todo o negócio da energia, como é o caso, por exemplo, da deterioração da infra-estrutura produtiva na generalidade dos países exportadores, com Angola a emergir como bom exemplo disso com a sua produção em continuado declínio devido à falta de investimento na área da pesquisa e da manutenção.

E esta recuperação da economia global só não está a ter maior impacto na valorização do petróleo porque a China, que é o maior importador mundial, mesmo tendo sido o primeiro gigante económico a libertar-se das garras da crise covidiana, tem registado um menor crescimento, que resulta em grande medida, como têm apontado os media especializados, da recorrente falha no abastecimento energético, défice na cadeia de fornecimento das diversas matérias-primas e ainda de esporádicos surtos de Covid-19, sem esquecer que o gigante asiático está, efectivamente, a fazer a sua parte no processo global de transição energética devido à "guerra" que o mundo terá de travar quanto antes contra o aquecimento global.

Com a" rolha" na produção da OPEP+ e as perspectivas optimistas (na visão dos exportadores), da Agência Internacional de Energia (AIE), da OPEP ou do Instituto Americano dos Petróleos, que apontam para que em 2022 os valores de consumo pré-pandémicos, na casa dos 100 milhões de barris por dia (mbpd), sejam retomados e mesmo ultrapassados, tudo se congrega para a manutenção dos preços em crescendo, com, por exemplo, a Goldman Sachs a admitir os 90 USD por barril nos próximos meses, ou o Presidente russo, Vladimir Putin, a ver já a nota de 100 USD colada no exterior dos barris comercializados.

No entanto, independentemente das previsões mais ou menos optimistas, há dois factores determinantes para admitir que o barril, pelo menos no imediato, vai manter a valorização.

Um deles é a deterioração da infra-estrutura produtiva na maior parte dos países produtores, como é disso exemplo Angola, cuja produção está em declínio desde 2014 devido ao desinvestimento, e que piorou com a Covid-19.

O outro é a pressão global para retrair a produção de energias fósseis devido ao seu contributo para a produção de gases com efeito de estufa e consequente aquecimento global, privilegiando as energias menos agressivas para o ambiente, o que se maximiza se os preços do crude e do gás natural se mantiverem altos.

Angola é um bom exemplo para se perceber o que se passa. Mesmo perante a alta evidente do valor da matéria-prima, tarda a verificar-se o interesse das grandes multinacionais do sector em investir, salvo raros exemplo, no offshore nacional, o que tem levado ao prolongado declínio da produção que já está abaixo dos 1,2 mbpd, quando ainda há cerca de uma década, estava acima dos 1,7 mbpd.

Esse desinvestimento tem levado a perspectivas pouco ou nada optimistas para a economia angolana, havendo mesmo quem antecipe uma queda ainda mais acentuada, como é o caso da consultora Fitch Solutions, que reviu em baixa a previsão para produção de petróleo em Angola para um milhão de barris por dia no final da década devido à falta de investimento e exploração

Outro aspecto que está a limitar o potencial deste sector no País é a pressão global em defesa do ambiente, especialmente num momento em que os sinais de alerta são cada vez mais evidentes, como o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, tem repetido à exaustão, o que, não sendo o único factor, é um dos que está a reduzir o apetite das "majors" pelo potencial petrolífero angolano.

E o que se passar no próximo mês, em Glasgow, na Escócia, na COP26, uma das mais aguardadas cimeiras mundiais do clima, poderá ser fundamental para antever o futuro neste sector que, como se sabe, ainda é fundamental para a economia angolana.

E, apesar de tudo, como pode Angola aproveitar este momento?

Para países como Angola, cujas economias são extremamente dependentes das exportações de crude, este momento é, seguramente, gerador de derradeiras oportunidades para investir na diversificação das suas economias com os excedentes gerados pelos elevados preços da matéria-prima, escolhendo bem onde apostar.

Com o barril nos 84 USD, o Executivo angolano, que elaborou o OGE 2021 com 39 USD como valor de referência para o barril, conta com um bónus de 45 dólares, o que permite, mesmo que sejam gigantescos os compromissos com a dívida externa, colocar uma boa parte deste superavit na diversificação da sua asfixiada economia.

No entanto, para já, de forma a corresponder a urgências imediatas, como é o caso da redução dos gastos com a subsidiação dos combustíveis, gasolina e gasóleo, que leva dos cofres públicos quase 2 mil milhões USD/ano, o Governo tem colocado uma boa parte das fichas na aposta da construção de refinarias, contando com o abastecimento local e com a exportação de refinados para outros países do continente onde a transição energética, espera-se, venha a demorar mais a chegar.

Porém, como alguns especialistas têm vindo a chamar à atenção para isso, o calendário destes processos não obedece às leis a que estávamos habituados no passado e podem, de um momento para o outro - a COP26, em Glasgow, no próximo mês é um bom exemplo e uma possibilidade de algo inesperado suceder - conduzir a mudanças radicais de paradigma que deitem por terra tudo isso, face à já hoje evidente urgência de mudança, como lembrou na última Assembleia-Geral da ONU, o seu Secretário Geral, António Guterres, afirmando que o mundo vive o seu último curto intervalo temporal para levar a sério o "alerta vermelho" climático.

Ou seja, se não for nos próximos 2 a 3 anos, Angola terá, exponencialmente, mais e mais dificuldades em ter como investir na modernização da sua agricultura, na diversificação das fontes de rendimento, no aproveitamento do seu potencial mineiro...

Cenário de fundo

No entanto, este é o momento para aproveitar o que houver para aproveitar. Mas mesmo isso não está a ser fácil.

Se Angola, Nigéria, Líbia ou Argélia, os grandes produtores africanos, sofreram com a baixa do consumo, a recuperação não está a ser igualmente rápida, muito devido à fraca capacidade de resposta, de forma mais acentuada em Angola e na Nigéria, por causa da deterioração da sua infra-estrutura, do desinvestimento em pesquisa, em manutenção e já, também, resultado de uma desistência global do petróleo devido à poluição e o esforço mundial para uma transição energética que afaste a ameaça das alterações climáticas sobre a humanidade.

Mas o mesmo não se pode dizer dos países do Golfo, que tiveram melhor visão estratégica ao longo dos anos, investindo mais na diversificação e na manutenção dos seus campos, que, agora, estão a dar uma resposta adequada ao aumento da procura e a gerar optimismo entre os diversos sectores económicos, como é o caso da Arábia Saudita, cujo mercado bolsista cresceu mais de 42 por cento nos últimos 12 meses.

Este exemplo é ainda mais interessante porque o crescimento mais volumoso reflecte-se, segundo os media internacionais especializados, no sector não petrolífero, como as telecomunicações, o turismo, o comércio e a indústria química..., sendo que a petrolífera nacional, a ARAMCO, acaba de anunciar que obteve um lucro líquido de 30 mil milhões USD no 3º trimestre de 2021.

A ficar para trás

Entre os restantes exportadores de crude, a recuperação está a ser substancialmente mais lenta, como é o caso de Angola, onde a economia se debate com a pressão da inflação, que pode chegar, segundo o INE e o BNA, aos 27% nos próximos meses, uma crise social sem precedentes desde o fim da guerra, em 2002, e uma assinalável incapacidade para que os esforços da diversificação económica mostrem sinais de estar a produzir efeito.

Como pano de fundo para este cenário difícil, o País tem o acentuado declínio da sua produção de petróleo, que está actualmente abaixo dos 1,1 milhões de barris por dia e com tendência para diminuir ainda mais.

Tudo devido aos sobejamente conhecidos problemas do abandono de algumas das majors com investimentos no offshore nacional, face a uma "infecciosa" dependência do petróleo que, ao longo dos anos, criou uma inércia geral face à urgência de diversificar a economia apesar de ser bem conhecida essa urgência.

E o resultado é o que se sabia estar ao virar da esquina perante uma realidade em que o petróleo ainda é rei e senhor na economia nacional.

Sendo Angola um dos países na linha da frente das repercussões do sobe e desce dos mercados petrolíferos, devido à sua dependência das exportações de crude para o equilíbrio das suas contas - o petróleo ainda é responsável por mais de 94% das exportações e mais de 60 por cento dos gastos do Executivo e acima de 30% do PIB, este cenário de recuperação permite, ainda assim, algum optimismo nas contas nacionais mas ainda longe de um regresso ao patamar alcançado a partir de 2008, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano, permitindo um boom económico como nunca visto até ali.

A produção actual, em constante declínio, está abaixo dos 1,1 mbpd devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016, bem como devido ao esgotamento/envelhecimento dos campos mais activos.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção tem vindo a perder viço especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.

E com a transição energética a impor cada vez mais a sua vontade, com o crude e os restantes hidrocarbonetos a ser olhado como uma infecção perigosa e contagiosa, o País tem agora de fazer o que não fez nos últimos 20 anos: diversificar a sua economia o mais rápido possível, porque o petróleo tem os dias contados. E são cada vez menos.