Neste contexto, há muito para debater sobre Nagrelha do ponto de vista antropológico e, parafraseando Lévi-Strauss, que "adere a uma concepção de natureza como domínio do universal, daquilo que nos é dado, isto é, presente na nossa concepção como ser humano, enquanto cultura é vista como aquilo que é particular e construído através das inúmeras acções humanas e, por isso, variável entre indivíduos e grupos humanos".
A ascendência, idolatria e morte de Gelson Caio Mendes, nascido no Sambizanga, que tinha tudo para não dar certo, uma vez que poderia ter sido mais uma vítima das milícias policiais angolanas ou do seu próprio destino, aborreceu a plebe e a pseudoclasse intelectual que representa uma Angola que não existe em estatísticas se tivéssemos que enveredar por um estudo probabilístico mais aprofundado.
Para não me alongar em conceitos monolíticos de quem desprezou este fenómeno antes mesmo de a sua alma descansar, é importante repetir que Nagrelha teve a coragem de, em vida, desafiar todas as estruturas que esmagam os jovens dos subúrbios.
Basta pesquisar por Franz Boas, um antropólogo alemão que viveu nos Estados Unidos e ficou conhecido como "pai da antropologia americana", para entender a teoria do relativismo cultural que acredita na autonomia da cultura, na sua singularidade e valoriza os costumes e identidade de uma determinada camada, uma vez que os costumes, segundo Boas, "são manifestações da cultura".
Esse é o Nagrelha dos Lambas.
Assumiu as suas dependências e as suas carências e também o seu ecossistema. Mas, como não era branco de olhos claros como o Kurt Cobain dos Nirvana - esta mensagem muito clara dirigida aos angolanos do privilégio que cresceram na antiga cidade de Luanda antes de Luanda Sul - a sua passagem por este nosso mundo onde ninguém fica foi selvagem, sim. Ironicamente.
E ele fez, por isso, de uma forma inata que se fosse no universo patricinho íamos lhe chamar de "radical". Olhar para a manifestação de dor, revolta e pesar de quase 30 milhões de angolanos, 2 meses depois de um período eleitoral, é estar num muro com aquele olhar do projecto imperial sobre o outro, quando, ainda no século XVIII, vinham para a nossa terra nos estudar para dar informações aos "descobridores" de como nos domar. Muitos de nós somos mais que quadrinetos deles e temos de pensar nas baboseiras que escrevemos no delírio da ilusão dos nossos pseudo seguidores ou leitores.
É que o Gelson, com G ou J, é das poucas pessoas que, ao longo dos seus 36 anos, tiveRAM seguidores reais, vivos, pobres, ricos, envergonhados, com chupa-cocó, Laboutin, famosos, anónimos e até na partida desmontou o Ego. Aquele que fingimos que não temos.
Grata pelas contribuições para esta crónica! Vocês sabem quem são.