Angola esteve apenas representada nas provas de velocidade (100, 200 e 400 metros) e com uma equipa composta de quatros atletas: além de José Sayovo, estiveram também Octávio dos Santos, Esperança Gicasso e Maria da Silva. Graças às duas medalhas de Sayovo, Angola ocupou a 51ª posição do quadro geral de medalhas dos Jogos Paralímpicos de Londres. Numa competição em que participaram 4.200 atletas em representação de 165 países.

A vida é feita de imprevistos, novidades e contratempos. Grande parte das pessoas não gosta daquilo que não conhece, daquilo que não controla. Quem acredita no destino sabe que ele nos prega partidas quando menos esperamos. E a estória do nosso amigo José Sayovo ou "Sayouro", como passou a ser carinhosamente chamado pelo povo angolano depois das três medalhas de ouro em Atenas, 2004. O homem que em 1998 tinha 25 anos de idade e era sargento das Forças Armadas Angolanas (FAA) quando foi vítima de um acidente: uma mina anti-tanque cegou-o. O Comité Paralímpico angolano convidou-o para se treinar quando já nem se acreditava que ele poderia voltar a andar, quanto mais competir. E não é que o " Sayouro" deu as voltas ao destino, superou expectativas e tornou-se o orgulho dos angolanos! Um verdadeiro campeão, o nosso " Pai da Liberdade". E foram oito medalhas paralímpicas desde Atenas 2004: três de ouro em Atenas, três de prata em Pequim 2008 e duas medalhas (uma de ouro e outra de bronze) em Londres 2012. E no total da carreira, entre mundiais, campeonatos africanos e meetings, " Sayouro" subiu por quarenta e duas vezes ao pódio.

Por tudo quanto passou, por aquilo que conquistou para Angola e para os angolanos, José Sayovo é um exemplo, uma referência para todos nós. O sofrimento pode naturalmente tornar amargo aquele que sofre, mas em muitas outras situações pode enobrecer quem sofre. É acima de tudo pela sua coragem, pela sua determinação e sobretudo pela força interior que " Sayouro" é um ícone do desporto angolano. O acidente tirou-lhe a visão, mas não lhe retirou a ambição, não lhe roubou os sonhos, enfim não abalou a sua essência. Ele não deixou que o acidente de 1998 mudasse a sua forma de ser e de estar na vida, que lhe tirasse um dos dos maiores activos do ser humano: a força interior!

José Sayovo anunciou o fim da carreira em jogos Paralímpicos, mas confirmou a sua participação ainda em 2013 nos mundiais de atletismo adaptado. De uma coisa estou certo: que no desporto adaptado em Angola passaremos a ter duas épocas. Antes de Sayovo (AS) e depois de Sayovo (DS). Em Umbundu (uma das línguas nacionais angolanas) Sayovo significa: Pai da Liberdade ou Pai da Independência. Na realidade com as suas vitórias, com as suas medalhas, com os seus feitos passamos a apreciar, passamos a desfrutar melhor a liberdade. Passamos a respeitar, a valorizar ainda mais a nossa independência, enchemo-nos de orgulho ao ver a nossa bandeira hasteada e o nosso hino entoado nos grandes eventos desportivos mundiais em que ele participou.

Recordo-me que lá para Outubro de 2005, por altura da 3ª edição do Desfile Académico da Universidade Católica de Angola, como membro da organização, coube-me a honra de acompanhar o campeão paralímpico dos 100, 200 e 400 metros de Atenas 2004, e durante a caminhada que nos levou do largo do Cine Atlântico ao estádio da Cidadela em Luanda, tive a espinhosa, delicada mas grata missão de ser " os olhos" e tentar fazer um retrato fiel daquilo que se passava à sua volta. Acabei por ser um guia andante de Sayovo, pois porque se fosse nas pistas de competição eu não seria uma boa opção como guia, pois jamais aguentaria a sua pedalada, apesar de na altura contar com 29 anos de idade.

A minha Faculdade de Direito não venceu naquele ano o desfile académico, mas os meus companheiros e eu sentíamo-nos como verdadeiros vencedores, uns verdadeiros campeões. Aquele não fora mais um dia nas nossas vidas, mas foi com certeza um dos melhores dias das nossas vidas. Porque sempre que estamos ao lado de José Sayovo sentimo-nos um pouco maiores, sentimos vontade de o abraçar, de o saudar, sentimo-nos orgulhosos porque gostaríamos de ter um dia a sua coragem e determinação. Um homem de inclusão, e que mesmo privado da visão mudou a forma como se passou a olhar o desporto adaptado em Angola, mudou a visão da sociedade angolana sobre o papel dos deficientes, sobre a sua inclusão e inserção social. Hoje aos 50 anos, " Sayouro" é sem dúvidas um dos desportistas angolanos mais admirados e respeitados de sempre. E o exemplo de Sayovo reforçou os investimentos no desporto adaptado em Angola, um exemplo prático é a selecção nacional de futebol adaptado que venceu o mundial da Argentina em 2018 e o campeonato africano realizado na cidade de Benguela no ano de 2019. Sayovo mais do que um exemplo é uma lição de vida e ensinou os angolanos a verem Angola, o mundo e o desporto adaptado com outros olhos: OS SEUS OLHOS!