SIM, um Povo ESPECIAL, Heróico e Generoso senão não teria aguentado todos estes anos de tortura psicológica e física, fome, abandono, indiferença institucional, arrogância e desprezo com que a maioria das pessoas é tratada. Olho para a quitandeira que leva o futuro no ventre, pela mão carrega o presente analfabeto e descalço e na cabeça a renda da família que apenas chega para enganar a fome do jantar.

Olho para os velhos abandonados por este País, cuja memória carregada de verticalidade e honra vamos perdendo, dando lugar à memória, muitas vezes "construída" que acomoda o poder. Olho para os órfãos sem nenhum programa eficaz que os retire dessa qualidade indecente pela violência que enfrentam todos os dias. Olho para as mães que enterram filhos vítimas de indiferença institucional e, que, quais leoas, continuam a proteger os que sobram com a mesma coragem e determinação. Olho para os chefes de família que, por mais que trabalhem, não garantem duas refeições quentes por dia, todos os dias, à sua família. Olho para os jovens que vivem sem chão, sem referências e sem um Estado que seja exemplar, que se constitua como uma referência, que os proteja, garantindo-lhes uma Educação Universal e com Qualidade, para poderem olhar com segurança para o futuro, acreditando que são parte integrante da construção deste futuro.

Olho para todos com imenso respeito pela coragem com que se erguem, todos os dias, para enfrentarem a vida e por se terem tornado muito mais produtivos e eficientes que a maioria dos programas que foram inventados nas correrias eleitorais, para nos embaciarem os olhos, que comeram milhões de dólares, mas foram e são tão inúteis como uma pandeireta num enterro. Olho para todos com orgulho pela resiliência e pela coragem. E é por isto que não podemos deixar que nos impinjam a ideia de que somos fracos e não merecemos mais. Que somos apenas o intervalo do voto. Que estamos proibidos de pensar num outro modelo de governação justo e eficaz. Não podemos continuar a aceitar que nos digam que não temos poder, que somos pessoas menores, que somos invisíveis e sem capacidade para contornar a fatalidade de sermos governados por pessoas que perderam a essência, o respeito. Não podemos continuar a considerar normal que a maioria dos nossos políticos apenas pense no poder e sua manutenção e que nenhum nos apresente um projecto de País onde o Povo tenha sido ouvido com o coração e nos provem que este será atendido, de forma prioritária, a cada vitória eleitoral.

Olho para o País a quem, por bondade, Deus e o Universo beneficiaram com tanta prosperidade, com tanta beleza, com tanta água e vejo apenas reflectida a gula duma mão cheia de políticos indiferentes que prosperam em cima da desgraça do povo a quem não incluem na sua governação.
Um POVO ESPECIAL, SIM, que sempre foi generoso, que deixou de ter tempo para odiar, mergulhou na salvaguarda da sua perene integridade e ainda assim consegue sorrir com verdade. O POVO ESPECIAL que é, de facto, bom (pois duvido que algum dos nossos defensores do indefensável conseguisse sobreviver dois meses no inferno em que a maioria dos angolanos, sem qualquer viabilidade económica, vive) divide o pão com o seu irmão, vizinho ou o colega segurança ou da zunga com quem passa o dia, porque nunca aprendeu a ser egoísta. Os que têm menos são, normalmente, mais solidários, mais gentis, mais eficazes e criativos, na salvaguarda da sobrevivência da comunidade.

Aprendi com os meus pais, que a força dos países reside nos seus povos, que voltam à terra depois da morte, fortalecendo os laços com os vivos em cada árvore, em cada montanha. Pó do mesmo pó num eterno ciclo que nos perpetua. Em cada punhado de areia estão os nossos antepassados, estão as nossas memórias históricas e os laços de irmandade. É disto que se fortalece o sentimento de pertença.

Não são as ideologias que nos unem e nos dignificam. O que nos une e nos fortalece é a terra por causa desta partilha comum das convicções, das conquistas e da sabedoria que atravessa a História, de boca em boca, mesmo quando alguns a pretendem amordaçar.

O POVO ESPECIAL tem sido tolerante, humilde, pacífico. Tem sido amordaçado, violado e desrespeitado. Mas ninguém conseguiu partir a sua força. A força com que enfrenta a pobreza, a tristeza e a certeza da morte prematura. Um povo que perdeu o medo e que apenas acredita em si e na sua fé. Será este POVO ESPECIAL, jovem, sem dívidas morais, sem compromissos com o passado sombrio, que irá parir o PAÍS para TODOS, porque, tal como Jorge Amado, também acredita que "não possuímos direito maior e mais inalienável que o direito ao sonho. O único que nenhum ditador pode reduzir ou exterminar".