Nos tempos de estudantes de Direito no Huambo tínhamos como amigos comuns o Aurélio Simba, Domingos Mesquita, Norberto Sodré, Adão Tchiova, entre outros de feliz memória, Cadavez Vieira e Afonso Gonçalves.
Em 2018, fui eleito bastonário da OAA e o Dr. Joel Leonardo viria a ser nomeado anos depois juiz Presidente do Tribunal Supremo (TS).
Estivemos várias vezes juntos nos trabalhos da Comissão da Reforma do Direito e da Justiça, bem como nas aberturas dos anos judiciais. Mas, havia situações pontuais de trabalho que impunham um encontro de concertação entre mim, bastonário, e ele, presidente do TS.
Apesar de ter feito diligências para que os encontros tivessem lugar, o ex-Venerando Juiz Presidente do Tribunal Supremo, não sei por que razão , nunca se dignou em receber-me. Durante 4 anos, ele manifestou sempre indisponibilidade de tempo.
Esta semana, enquanto falava com antigos colegas de carteira sobre o pedido de renúncia do Dr. Joel Leonardo, um deles disse: "Os novos tempos vão trazer um rosário de explicações."Aguardemos!
Dentre os vários assuntos abordados nessa conversa, alguém falou da questão da atracção do investimento estrangeiro no país e do engajamento do Presidente da República nessa árdua tarefa.
Apesar de o Executivo alardear aos 4 ventos do programa Simplifica, acontece que a maioria dos cartórios notariais, com destaque para 4.• Cartório Notarial, à Vila Alice - Rua José Anchieta - o procedimento interno praticado, em vez de facilitar e tornar célere os processos, tem dificultado a vida dos utentes dos referidos serviços.
Não é concebível que para se reconhecer uma simples assinatura numa procuração o cidadão tenha que se deslocar das instalações do 4.ºCartório Notarial para as imediações, à procura de um ATM, "Automated Teller Machine", em português, traduzido como caixa electrónico, entre nós, vulgarmente máquina multicaixa (fora das instalações) a fim de fazer o pagamento dos emolumentos ao Estado.
Por que o cidadão é tratado com a imposição deste obstáculo (pagar a taxa de serviço numa máquina multicaixa fora das instalações) para beneficiar de um serviço do Estado? Por que não aproximar esse serviço aos cidadãos, colocando terminais de ATM nas próprias instalações do cartório?
É urgente a reformulação do modo de actuação dos cartórios notariais e conservatórias adstritos ao Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos (MinjustDH), o que passa por uma mudança profunda na mentalidade dos seus funcionários e na colocação de pessoas certas e com autoridade profissional.
Convém lembrar que os contratos resultantes dos acordos da 17.ª Cimeira de Negócios Estados Unidos da América/África, que Luanda acolheu de 22 a 25 de Junho, vão que passar pelos nossos Cartórios Notariais.
Na mesma senda, os erros da última Comissão de Reforma da Justiça e do Direito (CRJD) que obviamente passaram no diagnóstico, produziram mais uma armadilha: As taxas de justiça de Angola nos processos cíveis são as mais altas da SADC e CPLP. Novamente a pergunta: É desta forma que querem atrair o investimento?
Por exemplo, quem quiser intentar um processo indemnizatório ou defender-se dele terá de pagar uma taxa de justiça (inicial e única) de cerca de 7% do valor da acção de uma só vez nos preparos iniciais.
Além de sistema bastante oneroso, este empecilho concorre para afastar os cidadãos do acesso aos tribunais.
O pagamento da uma "taxa de justiça", conjuntamente com o "preparo inicial", que cada parte na lide pagará no início do processo a pretexto de impulso processual, desemboca num contra-senso chamado "denegação de justiça aos cidadãos" por falta de equilíbrio entre o princípio da onerosidade da administração da justiça e o princípio de acesso ao direito e aos tribunais.
Esta taxa exorbitante afasta a intenção de qualquer investidor, pois afigura-se contra a diplomacia económica do Executivo.
O expediente para obtenção dos vistos de trabalho e o repatriamento de capitais também estão em contra mão.
É caso para dizer que existem "cascas de banana no chão" para que os programas do Executivo escorreguem. E depois, nem água vai, nem água vem.
A conversa sobre os paradoxos da semana prosseguiu e trouxe à liça o caso caricato da polêmica destituição da presidente do PHA.
Como é de domínio público, alguns membros da comissão política do partido encabeçado por Bela Malaquias deliberaram a destituição da sua presidente por alegada gestão danosa, violação dos estatutos e apropriação de bens do partido.
De forma algo surpreendente, a única mulher à frente de um partido político em Angola foi reeleita sábado, 31 de Agosto, em Luanda, na primeira Convenção Nacional Ordinária, com 90,2% dos votos, o que reforça a sua posição.
Entretanto, o Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) divulgou durante a semana finda o nome dos candidatos aprovados para as vagas de juízes conselheiros do Tribunal Supremo , dentre os quais avultou o do actual presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE)
Manuel Pereira da Silva, vulgo "Manico", foi reeleito presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) em Março último, pelo que resta saber se ele vai suspender o seu lugar no TS até cessar as suas funções no órgão eleitoral em 2027?
Recordo que Caetano de Sousa e Silva Neto quando exerceram a funções de Presidentes da CNE suspenderam as funções de juízes Conselheiros por incompatibilidade .
Sobre os quatro comissários da UNITA que deverão prover esse órgão paira a expectativa. Será que eles vão ou não tomar assento na Comissão Nacional Eleitoral (CNE), depois de esgotados todos os argumentos junto do Tribunal Constitucional?
Até lá, boa leitura!
*Jurista e ex-bastonário da Ordem dos Advogados de Angola