Com certeza que, há 95 anos, quando o Professor de Educação Física do antigo Liceu Salvador Correia, Pina Cabral, introduziu a prática do basquetebol neste território que hoje é a nossa Angola estaria longe de imaginar que esta bola laranja se transformaria numa das suas imagens de referência.

Reza a história basquetebolista que, após a nossa participação e conquista da medalha de bronze nos jogos africanos de Nairobi de 1978, que o Professor Victorino Cunha, um dos maiores entusiastas da modalidade e "construtor" da sua filosofia, diante das enormes cabazadas de quase 50 anos que fomos brindados naquela ocasião pelos nossos contendores mais fortes, a Costa do Marfim e o Senegal, defendeu que era necessário fazer uma mudança radical na forma como o basquetebol era treinado, programado e jogado aqui internamente para que em alguma ocasião pudéssemos pelo menos sonhar superar os papões daquela altura.

A definição de nova visão, estratégia e liderança foi o segredo partilhado pelo Professor Victorino que nos permitiu, 10 anos depois das tais cabazadas nos jogos universitários, conquistar de modo tão brilhante e de forma inédita uma medalha em seniores nos jogos pana africanos de 1987 e, dois anos depois, erguemos o tão esperado troféu de campeões africanos.O tempo passou e no seu decurso fomos nos afirmando como uma verdadeira nação do basquetebol africano, protagonizando feitos absolutamente extraordinários e muito difíceis de serem igualados nas próximas duas décadas, pelo menos. No entanto, os últimos doze anos foram de uma verdadeira angústia para os amantes do basquetebol. Foi tempo demais para um país tão habituado a estar na ribalta do basquetebol africano a ver-se ultrapassado por países como a Tunísia que se tornou bi-campeã e a Nigéria, para além de termos ficado arredados do podium por 10 anos.

Depois de um oitavo e de um quinto lugar nos últimos dois campeonatos africanos, era realmente preciso fazer-se algumas coisas, alterar alguns velhos hábitos, por mais doloroso que fosse, definir uma estratégia acoplada a uma filosofia de jogo, acreditar e confiar nas pessoas. Esta vitória no Afrobasket 2025 tem fortemente vincadas as impressões digitais do Presidente da Federação, José Moniz Silva, e do Treinador Principal da equipa nacional, o catalão Josep "Pep" Clarós, pois foram eles que, muitas vezes sob fortes contestações populares e da imprensa, foram fieis a estratégia e a filosofia que definiram, acreditando de forma inabalável que seria este o caminho que nos levaria de volta às vitórias. E, felizmente, não se enganaram e cá estamos todos a celebrar o nosso décimo segundo título continental, conquistado de forma invicta aqui em casa, desanuviando um pouco os dias de imensa tensão social que, por acaso, antecedam a realização do Afrobasket.

Ficou mais uma vez comprovado o excepcional poder de união do desporto. Nos seis jogos disputados pela nossa seleção no Namibe e aqui em Luanda sempre fomos verdadeiramente "um só povo, uma só selecção".

*Jurista e Presidente do Clube Escola Desportiva Formigas do Cazenga