Depois de na semana passada o "plano de paz" com 28 pontos de Donald Trump ter surpreendido os media internacionais, sabendo-se agora que, afinal, era apenas uma proposta de trabalho, em Paris, Londres e Berlim a missão passou a ser destruí-lo.

Como já tinha sido destruir o acordo entre o americano e o Presidente russo, Vladimir Putin, quando estes se encontraram a 15 de Agosto no Alasca, o que foi feito, num e noutro caso, com sucesso.

Isto, porque num e noutro caso, os europeus, especialmente da União Europeia, foram ignorados e secundarizados por Putin e por Trump, como o foi também o próprio Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky.

E quando se pensava que desta era mesmo a sério, quando Trump ameaçou Zelensky de que até quinta-feira, 28, devia assinar o acordo de 28 pontos ou ficar sozinho na guerra com a Rússia, porque os países europeus não têm os meios dos EUA, afinal... não.

O que se passou foi que os aliados europeus de Kiev convenceram Zelensky a recusar a "oferta" americana, tendo, para o efeito, realizado em Luanda um Conselho Europeu de emergência, durante a Cimeira União Africana/União Europeia, na segunda-feira, 24.

E o resultado foi igual ao de 16 de Agosto, quando Zelensky disse que queria ir a Washington falar pessoalmente com Trump, levando consigo os líderes europeus, para acertar pormenores do acordo.

Enquanto isso, desta feita, o plano de 28 pontos, mais próximo do que Moscovo pretende, estava já a ser transformado num plano de 19 pontos que serve os interesses de Kiev e das capitais europeias, o que, no fim da linha, deixa tudo na mesma.

É que, como notam vários analistas, incluindo John Mearsheimer, professor da Universidade de Chicago e um dos mais conceituados especialistas em política internacional, "as duas partes nem sequer vão olhar para estas versões do plano" de Trump.

Em causa, embora existem actualmente tantas versões nos media, incluindo as redes sociais e canais alternativos, que é impossível saber o que contém o plano de 19 pontos, e nem sequer o de 28, conhecido há mais tempo, é claro no que ali estava, estão os temas mais melindrosos num e noutro lado.

Para os russos não é sequer negociável a questão dos territórios anexados em 2014 (Crimeia) e 2022 (Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhia), a entrada na NATO e a presença de forças militares ocidentais na Ucrânia.

Para os ucranianos, embora já tenha sido mostrada mais flexibilidade sobre a questão, os territórios anexados e conquistados militarmente pelos russos serão sempre ucranianos, é Kiev quem decido a que organizações internacionais adere ou não e os EUA devem garantir a segurança do país em caso de novo ataque russo às suas fronteiras.

Ora, isto é o mesmo que dizer que a situação está como estava antes de ser conhecida a proposta dos 28 pontos de Trump, que, entretanto, se soube que foi "desviada" para os jornais Axios e The New York Times para destruir a estratégia da Casa Branca.

Ficando-se também a saber que o maior suspeito do "vazamento" é Keith Kellog, que já anunciou que vai deixar de ser o enviado especial de Trump para a Ucrânia em Janeiro devido a conluios graves com Kiev motivados por interesses pessoais e de familiares seus.

Todavia, depois de Trump ter dito quer afinal já não há um "deadline", e depois de as equipas norte-americana, chefiada pelo Secretário de Estado, Marco Rubio, e ucranianas e europeias, em Abu Dabi, nos EAU, terem retirado nove dos 28 pontos do "plano", eis que novas revelações surgiram em catadupa na imprensa norte-americana.

Afinal, Zelensky vai à Casa Branca esta semana, mesmo depois de Trump dizer que só o receberia quando houver um acordo.

Steve Witkoff, o enviado especial do Presidente norte-americano para a Rússia vai a Moscovo falar com Vladimir Putin.

Até ver, a única novidade face ao que se passou em Agosto, após o encontro no Alasca, é que os europeus foram impedidos de ir com o Presidente ucraniano reunir na Sala Oval com Donald Trump.

A grande questão agora é saber como é que os norte-americanos, que se mantêm como parte no conflito ao fornecerem apoio militar, dinheiro e informações estratégicas a Kiev, podem ultrapassar as grandes questões dos dois lados, desde logo as territoriais, sem as quais resolvidas, os russos nem sequer aceitam olhar para quaisquer propostas.

Isso mesmo parece transparecer das palavras do porta-voz de Putin, Dmitri Peskov, que, mesmo sabendo que os conselheiros e enviados de Putin, Yury Ushakov, e Kirill Dmetriev, estão dentro das conversações, afirmou que o Kremlin "não sabe de nenhuma proposta, oficialmente".

Porque sem uma clara aceitação da realidade no terreno por parte dos ucranianos, Moscovo já avisou, pela voz do próprio Presidente Vladimir Putin, que está confortável com a perseguição dos seus objectivos no campo de batalha, onde os ganhos são crescentes e evidentes, embora sublinhe que a preferência vai para a mesa das negociações.

Isto, quase ao mesmo tempo que o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, que se tem resguardado mais nesta fase do processo negocial, veio acusar directamente os países europeus de terem apenas como interesse "obstruir as propostas válidas" dos EUA para abreviar o fim da guerra.

Do lado russo, oficiosamente, o entendimento é que os europeus não estão a pensar nos interesses ucranianos, apenas querem garantir que a Ucrânia continua a combater a Rússia por tempo indeterminado, porque, mesmo que isso leve à destruição do país, acabará sempre por deixar a Federação Russa mais fragilizada.

É que, como nota, por exemplo, Jacques Baud, um antigo oficial da secreta suíça e oficial deste país na NATO ao longo de anos, com vários livros publicados sobre este conflito, no ocidente está a ganhar tracção a ideia de que uma guerra aberta com a Rússia é inevitável nos próximos três anos e se Moscovo estiver menos apto, isso será uma vantagem quando esse momento chegar.

Recorde-se que nos últimos meses, os CEMGFA's francês e alemão e vários líderes políticos, como o ministro alemão dos Negócios Estrangeiros, Boris Pistorius, afirmaram ser inevitável um conflito aberto com a Rússia até 2029, ou mesmo em 2028.

Vladimir Putin já respondeu a estas curiosas declarações afirmando serem "irresponsáveis" porque em nenhum momento a Rússia disse ou mostrou sinais de querer um confronto com a NATO.