Enquanto do outro lado, o Ministério da Defesa da Federação Russa, corroborado por relatos dos media ocidentais, como a CNN e The New York Times, diz que não só estão a resistir ao muito aguardado avanço das brigadas "inimigas" como divulgaram uma extensa lista material destruído.

Entre a lista extensa de alvos abatidos, os russos incluem pelo menos sete carros de combate pesados alemães Leopard, , peças de artilharia móvel francesa, Caeser, veículos blindados de transporte de infantaria norte-americanos Bradley e um número elevado de equipamentos do stock "soviético" ucraniano, como os carros de combate pesados T-72, lança-roquetes, veículos de transporte de tropas...

Nesta segunda-feira, segundo relatos reproduzidos pelos media ocidentais a partir de Kiev, algumas das 10 brigadas mecanizadas ucranianas formadas pela NATO estão envolvidas em combates violentos com as linhas de defesa russa, admitindo-se pesadas baixas de um e do outro lado.

Este anúncio de combates ferozes coincide, o que pode ser entendido como um cenário de expectativa sobre o desfecho das batalhas em curso, com um período de menor informação relativa à linha da frente por parte dos media russos, que, desde que a contra-ofensiva começou, a 04 de Junho, têm sido prolíficos em divulgar os insucessos das investidas ucranianas e o, por oposição, sucesso das defesas russas a rechaçar o "inimigo".

Segundo o comando militar ucraniano, na extensão sul/sudeste, da linha da frente, que coincide com as regiões de Kherson, Zaporizhia e parte de Donetsk, decorrem pelo menos 25 batalhas, uma das quais a merecer mais destaque, a de Bakhmut, onde, ao que tudo indica, Kiev aposta forte em reconquistar parte ou a totalidade da cidade martirizada durante largos meses e que foi dada como tomada pelo Grupo Wagner em Maio, além de Avdiivka e Maryiinka.

Para já, no que é possível confirmar com relativa certeza é que os ucranianos empurraram os russos para fora das aldeias de Blahodatne e Neskuchne, na região de Donetsk, o que os russos desvalorizam através dos seus "bloggers" de guerra, referindo-se a estas localidades como insignificantes no contexto do conflito em curso.

Com pouco informação e a que existe a ser merecedora de desconfiança devido à intensidade da desinformação e contra-informação tanto do lado russo como do lado ucraniano, o que pode ser, para já, dado como certo, segundo o analista da RTP3 e da CNN Portugal, major general Agostinho Costa, é que as linhas de defesa russas estão a aguentar e os ucranianos podem não conseguir manter o esforço de combate em alta com o volume de perdas que está a registar nesta semana de contra-ofensiva.

Ainda com um curso indefinido, porque uma contra-ofensiva desta dimensão no século XXI não pode ser entendida como algo de curto prazo, como, por exemplo, lembra anda Agostinho Costa, acontecia na 1ª e 2ª Guerra Mundial, com milhares de homens a avançar contra as trincheiras inimigas, mas sim como um combate entre estratégia e táctica apuradas.

Mas é já claro que dela vai depender muito mais do que aconteceu até agora nestes quase 16 meses de guerra, porque se a Ucrânia for derrotada de forma clara, dificilmente o regime de Kiev personificado em Volodymyr Zelensky poderá manter-se, enquanto se obtiver uma vitória clara e conseguir, como é claramente o objectivo, cortar o acesso dos russos entre o Donbass e a Crimeia, é Vladimir Putin que tem um problema escaldante entre mãos no Kremlin.

Essa a razão pela qual a esmagadora maioria dos analistas entendem que esta contra-ofensiva poderá estar ainda no seu início, porque ambos os lados vão dar tudo para sair por cima face ao que está verdadeiramente em causa...

Outro elemento fundamental para Kiev é conseguir chegar em posição fortalecida à Cimeira da Nato de Vilnius, Lituânia, em Julho, quando o destino de Kiev no seio desta organização militar ocidental poderá ficar definido em termos gerais para o pós-conflito, porque nenhum país pode ser agregado ao grupo estando em guerra.

Alguns analistas admitem ainda que essa data é o limite temporal máximo para Kiev conseguir mostrar o que vale no uso dos volumosos pacotes de ajuda em equipamento militar ocidental, além do financeiro, podendo, em caso de insucesso substantivo, vir a observar uma "retirada" do empenho ocidental no apoio que é, ainda, "até onde for preciso".

A barragem ainda...

... é o elemento desta contra-ofensiva mais claro, tanto no que sucedeu como nas consequências, porque, uma semana depois da destruição parcial da hidroeléctrica de Kakohvka, na região de Kherson, e da inundação de quase 700 kms2, com vários mortos e milhares de hectares de culturas de cereais destruídos, alguns dados começam a sobressair no que diz respeito ao apuramento de responsabilidades.

Com Kiev a insistir que foram os russos, e Moscovo a acusar os ucranianos de terem feito implodir a represa, com ambos os lados a terem vantagens e desvantagens militares com a destruição da barragem, um elemento está a começar a impor-se: o Governo de Kiev recusou uma proposta do Presidente turco Recep ERdogan para criar uma equipa de investigação com elementos turcos, ucranianos e russos, liderada pelas Nações Unidas.

Face à desconfiança que começou a ganhar terreno, depois desta posição ucraniana verbalizada pelo seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Dmitri Kuleba, a que se juntaram dados, embora ainda por confirmar de forma independente, que indiciam que os ucranianos abriram as comportas das barragens a montante da de Kakohvka para forçar a albufeira que acabou por colapsar, em Kiev impunha-se encontrar uma resposta.

E esta veio pelo próprio Presidente Zelensky, que veio de forma acelerada dizer que o Tribunal Penal Internacional (TPI), o mesmo que emitiu um mandato internacional de captura contra o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, liderado por um juiz polaco e sob responsabilidade de um procurador britânico - coincidentemente os dois países mais empenhados na continuidade da guerra contra a Rússia -, está a investigar a explosão da barragem.

Kiev recusa uma investigação liderada pela ONU e aceita uma sob responsabilidade do TPI, um tribunal que não está inserido no sistema das Nações Unidas, o que, para alguns analistas, pode reverter contra os ucranianos por levantar suspeitas de receio de uma investigação independente.

Troca de prisioneiros, os africanos estão a chegar

Entretanto, com ligações evidentes ao conflito mas fora da grelha principal, os dois lados trocaram este Domingo cerca de 200 prisioneiros de guerra, metade para cada lado.

A Ucrânia e a Rússia acordaram a devolução de 94 soldados russos capturados pela Ucrânia e 95 cranianos que se encontravam em prisões russas, naquilo que foi mais um processo de troca de prisioneiros.

Estas trocas de prisioneiros são a demonstração de que, quando os interesses são comuns, os dois lados das trincheiras facilmente chagam a acordo, o que demonstra que se a paz um dia destes for do interesse dos dois lados, facilmente trocam o campo de batalha pela mesa das negociações.

E é isso que a missão africana de paz, criada pelo Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, com mais cinco Chefes de Estado do continente, pretende demonstrar quando no final desta semana chegar a Moscovo e a Kiev, sem que se saiba ainda onde aterrará primeiro.

E o gabinete de Cyril Ramaphosa já informou que os Presidentes ucraniano e russo mostram boa receptividade a esta iniciativa africana, com o objectivo de ajudar a encontrar uma solução pacífica para o conflito no leste europeu.

Depois de muitas visitas de líderes internacionais, incluindo as últimas protagonizadas pelo enviado especial da China, Li Hui, que esteve na semana passada nas duas capitais com o mesmo objectivo, e o enviado do Papa Francisco, o cardeal e presidente da conferência episcopal italiana, Matteo Zuppi, é chagada a vez de os lideres africanos fazerem a sua magia diplomática para levar ao calar das armas.

Os seis Presidentes, todos eles, segundo explicou Ramaphosa, se voluntariaram para integrar esta "task force", deverão chegar a Kiev e a Moscovo a meio do corrente mês de Junho.

São eles o próprio líder da União Africana, Azali Assoumani, o sul-africano Ramaphosa, o ugandês Yoweri Musevini, o egípcio al-Sissi, o senegalês Macky Fall, e o zambiano Hakainde Hichilema.

Já denominada "Iniciativa africana para a paz", a missão destes Chefes de Estado não é fácil, não só porque é pouca ou escassa a vontade demonstrada pelos contendores para negociar, pelo menos enquanto não virem alcançados os seus objectivos, como tamanha façanha já foi tentada por outros, igualmente pesos-pesados, como o brasileiro Lula da Silva, que procurou criar um grupo em tudo semelhante ao que os africanos lograram conseguir.

Azali Assoumani e os seus colegas de "grupo de assalto diplomático" levam na bagagem para Kiev e Moscovo a experiência de décadas de conflitos no continente que acabaram por ser resolvidos através da diplomacia e da intervenção de equipas criadas no âmbito da organização pan-africana ou das organizações sub-regionais.

Levam ainda consigo a razão de quem vive de mais perto os efeitos nefastos da guerra, como é o caso dos elevados preços dos cereais nos mercados internacionais, que sofreram um severo impulso com o deflagrar da guerra entre dois dos mais importantes exportadores de grãos, ou as altas taxas de juro para se financiarem no rasto dos aumentos aplicados pelos bancos centrais ocidentais, União Europeia e EUA, nomeadamente.

Sem identificar para já as peças estruturais do plano de paz africano para a guerra na Ucrânia, embora isso tenha sido discutido no encontro destes lideres em Pretória, esta segunda-feira, 05, sabe-se já que Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky serão confrontados com os efeitos devastadores em todo o mundo deste conflito que já perdura há mais de 15 meses.