O primeiro aspecto a reter é que o OGE, enquanto instrumento de gestão governativa, deve compatibilizar as prioridades de cada ciclo anual com a estabilidade das Finanças Públicas a longo prazo. É por isso que importa garantir o equilíbrio entre as receitas e as despesas, gerando, se possível, como se prevê para 2024, saldo positivo primário (antes do serviço da dívida) e saldo positivo final. Portanto, a sustentabilidade do próprio OGE é um dos valores a preservar, como acontece com a proposta aprovada pela Assembleia Nacional e que se encontra na fase final de ajustamentos técnicos, tendo em vista a sua publicação nos próximos dias e entrada em vigor a 2 de Janeiro de 2024.

De facto, o OGE - desde a sua preparação e elaboração, envolvendo e auscultando de todas as Unidades Orçamentais e as forças vivas da economia e da sociedade, passando pela sua submissão à Assembleia Nacional, para discussão e acolhimento de propostas de melhoria, e até à sua execução - assegura a transparência e a responsabilidade na gestão dos recursos públicos. Está permanentemente, em todas as fases, da elaboração à execução, sob escrutínio, fiscalização e controlo democrático.

Esse escrutínio, fiscalização e controlo democrático vai dos diferentes organismos da Administração Pública, do Ministério das Finanças às Unidades Orçamentais e órgãos dependentes, ao papel da Assembleia Nacional e da Sociedade Civil, que é auscultada no Orçamento Participativo, passando pelos órgãos judiciais, em particular o Tribunal do Contas, que acompanha a sua execução mediante instrumentos como a fiscalização preventiva e sucessiva ou ainda o seu Parecer à Conta Geral do Estado, este último, um report emanado do OGE executado.

E a sua sustentabilidade - no sentido de ser exequível sem comprometer, antes contribuindo, para a robustez a longo prazo das Finanças Públicas, a coesão social e territorial e o desenvolvimento económico - é um dos seus eixos principais, a par, em 2024, de outros duas prioridades essenciais: fortalecer o rendimento e dinamizar o acesso de todos os angolanos à riqueza criada; investir mais na economia e nas empresas, que são o principal motor da competitividade e do desenvolvimento.

Importa, por isso, sublinhar as medidas concretas subjacentes a cada um destes três eixos estratégicos do OGE 2024, alinhados, nunca é demais lembrá-lo, com o PDN 2023-2027.

Relativamente ao fortalecimento do rendimento e das condições para que este seja acessível pelas pessoas, das medidas a serem executadas destaco as seguintes quatro:

i. ajuste de 5% do salário da Função Pública, tendo como base a real capacidade financeira do Estado em assegurar o cumprimento dessa medida,

ii. aumento da massa salarial da Administração Pública para novas admissões, promoções e progressão na carreira, destacando-se de modo particular os sectores da educação e saúde;

iii. operacionalização do Fundo Nacional do Emprego, com uma dotação orçamental de 10 mil milhões de Kwanzas, e

iv. ampliação de 70 mil para 100 mil Kwanzas do limiar de isenção do Imposto sobre Rendimento do Trabalho.

A prioridade de investir mais na economia e nas empresas tem três medidas de longo alcance, nomeadamente: previsão de 238 mil milhões de kwanzas previstos para pagar dívida interna atrasada, de modo a libertar liquidez para os fornecedores do Estado; reforço da capacidade financeira dos veículos públicos de financiamento à economia em 147,26 mil milhões de kwanzas; e reserva de 330,00 mil milhões para a emissão de garantia soberana, com o objectivo de estimular o crescimento económico por via do fomento de iniciativas empresariais privadas, conducentes à diversificação económica nacional e ao reforço da segurança alimentar do País.

Há, neste domínio, uma medida que considero emblemática, que milita a favor dos pequenos passos concretos necessários para a consolidação do tecido empresarial, do desenvolvimento local e da produção nacional. Trata-se da faculdade que passa a ser dada aos empresários agrícolas de declararem, como custos fiscais, as despesas incorridas na construção e melhoria das vias rodoviárias, na captação e distribuição de água e na rede eléctrica, de que também sejam beneficiárias as populações circundantes.

Através desta medida, o Estado, que não tem condições para acudir a todas as necessidades, enaltece a importância dos projectos empresariais, nomeadamente do sector da agricultura, para reforçar a segurança alimentar, gerar rendimento e emprego e melhorar as condições de vida das comunidades. É ali onde se encontra hoje o grosso da produção agrícola e é para ali onde serão direccionados os apoios mediante a recapitalização de instrumentos como o FADA e o BDA, permitindo desse modo dar escala e amplitude aos produtores nacionais.

As medidas de estímulo abrangem, igualmente, os médios e grandes empresários. Nesse sentido, é oportuno sublinhar o carácter virtuoso das garantias soberanas, assegurada que estará a boa aplicação desta medida, posto que é dada aos privados a oportunidade de materializarem projectos de carácter estratégico, para a produção de alimentos, em particular. É preferível ter, todos os anos, uma centena de projectos - de pequena, média e até mesmo grande dimensão - e quase todos singrarem, do que ter o Estado directamente comprometido com megaprojectos, aí concentrando todo o risco, numa lógica provadamente ineficiente.

Quanto à prioridade de tornar o OGE mais sustentável, e a ela regresso, porque sobre esse assunto se tem manifestado algum cepticismo, opiniões que escutamos e respeitamos, importa, além de outras medidas estruturais, reafirmar o seguinte: a racionalização da generalidade dos subsídios por via da reforma do sector empresarial público, em que se inclui o programa de privatizações, e a remoção dos subsídios aos combustíveis são para prosseguir, em moldes que atenuem os seus impactos sociais e económicos e que os cidadãos, efectivamente, compreendam.

Os principais indicadores do OGE 2024 já foram amplamente divulgados e discutidos, mas a eles me refiro, para depois terminar, reafirmando que a boa execução de todas as medidas previstas irá proporcionar:

i. O crescimento da economia (medido pelo Produto Interno Bruto) estimado em 2,8%, impulsionado pelo sector não petrolífero, a crescer 4,6%, que compensará o decréscimo de 2,5% da economia petrolífera;

ii. O crescimento da economia não petrolífera estará ancorado nos sectores da Energia (10,6%), Agricultura (6,5%), Pescas e Derivados (6,0%), Extracção de Diamantes, de Minerais Metálicos e de Outros Minerais (5,5%) e Indústria Transformadora (5,2%), sendo o Sector da Construção (3,2%) e o Sector Público Administrativo (3%) os que menos contribuem para esse crescimento;

iii. A aceleração da economia não petrolífera permite antever uma melhoria significativa da respectiva receita fiscal (de 5,19 biliões de kwanzas face a 4,31 biliões da previsão de fecho de 2023);

iv. A receita fiscal petrolífera, mau grado a desaceleração do sector, virá a ser de 7,86 biliões de kwanzas, com base numa previsão de 65 dólares norte-americanos para o preço do barril de Brent (face a USD 75 para o fecho de 2023) e de uma produção diária de 1,060 milhões de barris (face à previsão de 1,088 para o fecho de 2023).

v. O saldo final será positivo (0,2% do PIB), face ao défice marginal que se prevê para o fecho deste ano (-0,08% do PIB);

vi. O saldo primário, antes do serviço da dívida, melhora marcadamente face a 2023 (passa de um superávite de 5,11% para 6,25%);

vii. O saldo estrutural (que não considera as receitas petrolíferas) também evolui favoravelmente, embora mantendo-se negativo, de 6,46% em 2023 para 4,14 em 2024:

viii. Em face destas melhorias, as necessidades brutas de financiamento, relativas às despesas com o reembolso da dívida e capitalizações, estão avaliadas em 10 biliões de kwanzas (13,7% do PIB), uma redução de 1,1 pontos percentuais do PIB quando comparadas com a estimativa de fecho para 2023.

Num ambiente internacional ainda inflacionista, a que os bancos centrais tentam responder com taxa de juro de referência historicamente altas, e ainda marcado por conflitos em diferentes regiões do globo, compaginar os objectivos centrais do OGE 2024 com as exigências do serviço da dívida comporta desafios. E a esses desafios daremos, em cada momento, as respostas mais adequadas, governando. Governar. É isso mesmo que faremos, com base no OGE 2024.